sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Izzy Gordon: sinônimo de bossa, samba e soul à brasileira



Texto: Eugênio Martins Jr
Foto: Lucas Santos


São raras as cantoras que acertam a mão logo no primeiro disco. Ainda mais quando a fórmula é dar nova roupagem para antigos clássicos. Algumas usam o “jeitinho” pra fazer sucesso de primeira e, geralmente, quebram a cara. Acontece.
Não é o caso de Izzy Gordon como o seu Aos Mestres com Carinho – Homenagem a Dolores Duran, lançado em 2006. Além de acertar na escolha do repertório, Gordon acertou na escolha dos músicos e dos arranjadores: Samuel Fraga e Eric Escobar. Ser filha de Dave Gordon, irmã de Tony e sobrinha de Dolores Duran, tem lá suas vantagens.
Atualmente, a cantora está de volta ao estúdio para gravar seu novo CD com 13 faixas, que espera lançar ainda esse ano.
Em passagem por Santos, no dia 13 de março de 2009, segundo show da série Mulheres Ao Vivo, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, Izzy Gordon concedeu essa entrevista exclusiva falando sobre sua carreira, suas interpretações e suas preferências musicais. A realização do evento foi do Projeto Jazz, Bossa & Blues, Revista Ao Vivo e Sesc Santos.

Eugênio Martins: Você vem de uma família musical, fale um pouco sobre esse ambiente, seu pai, mãe, irmão e sobre a sua tia ilustre, Dolores Duran.
Izzy Gordon: Bom, em casa, meu pai Dave Gordon, e minha mãe Denise Duran, irmã da Dolores, me proporcionaram um eterno aprendizado, porque a gente estava ali na cozinha, havia acabado de almoçar e sempre cantávamos uma música. Isso acontecia todos os dias, de segunda a sexta e não uma coisa de final de semana, somente nas reuniões da família. Então, ouvíamos muita música em casa. Meu pai trazia os amigos artistas pra casa. Era interessantíssimo ver o Jair Rodrigues, Simonal, Rita Lee, Tim Maia, entre tantos grandes. O meu pai e minha mãe são realmente meus professores. Eu não podia nem cantar no chuveiro, porque se desafinasse alguma coisa passava alguém dizia: “Ei acerta essa nota”. (risos).

EM: Dolores Duram morreu em 1959, você não chegou a conviver com ela, mas o que sua mãe contava pra você? Qual das duas era a mais nova?
IG: A minha mãe era mais nova do que a Dolores. Minha mãe sempre dizia que ela era uma pessoa extremamente alegre e divertida, fazia piada o tempo todo. Mas tinha seus momentos. Naquela época era uma tendência falar de dor de cotovelo e todo aquele romantismo rasgado. Minha mãe me contou que uma vez a Dolores estava em frente ao Hotel Glória com uma carteira em baixo do braço, passou um “trombadinha” e levou a carteira. Ela voltou pra encontrar a minha mãe, que perguntou por que ela estava rindo. Ela contou pra minha mãe que havia acabado de ser roubada e estava achando graça naquilo. Quer dizer, ela não levava nem isso a sério.

EM: É verdade que a gravação de Ribbon in the Sky, do Stevie Wonder, acelerou o processo para você se tornar cantora? Como ele te influenciou? A minha teoria é de que todas as pessoas teriam de ter direito à saúde educação e uma coleção de CDs do Stevie Wonder.
IG: (Risos). Ele é um grande talento. A gente fica sem palavras depois de ouvir o Stevie. Ouvir uma linha que ele escreve é uma coisa que transporta a gente. E eu vi isso nele, uma coisa espiritual, realmente.

EM: E qual o disco dele que você mais curte? Gosto muito do Talking Book e do Innervisions, mas tem um que não é muito conhecido que eu adoro, é o Hotter Than July.
IG: Eu gosto muito do Talking Book, mas adoro Happy Birthday, do Hotter Than July (cantarola).

EM: E do Curtis Mayfield, você gosta?
IG: Não ouço muito, mas também gosto. Eu ouço muito cantoras. Gosto muito da Jill Scott. Há uns quatro anos que eu ouço várias cantoras, mas acabo voltando. Compro quase tudo dela, apesar de não ser fácil achar as coisas dela nas lojas. Me identifico muito com o disco dela ao vivo porque gosto muito do palco e porque é uma coisa completamente diferente do trabalho em estúdio. Ela no palco é uma coisa que contagia.

EM: E essa baixista e cantora nova, a Esperanza Spalding? Eu não conhecia, quem me indicou ela foi a Rosa Passos.
IG: Também gosto muito. Quando você me perguntou antes o que eu ouvia lembrei na hora. A primeira vez que eu ouvi foi em um rádio, não lembro onde, pensei: “Meu deu que voz maravilhosa, que interpretação maravilhosa”. E eu também tenho a mania de prestar a atenção nos músicos e pensei: “Nossa que baixo”. Só depois fui saber que era ela que cantava e tocava baixo acústico (risos). É uma coisa mágica.

EM: Você curte blues?
IG: Muito pouco, curto mais o jazz.

EM: E das cantoras brasileiras atuais, quem chama a tua atenção?
IG: Não ouço direto uma cantora, gosto mais das compositoras. Mas as novas eu gosto da Vanessa Da Mata, ela é muito feliz interpretando as próprias músicas.

EM: E jazzista brasileira?
IG: Gosto muito da Badi Assad e da Rosa Passos. Também gosto da Mônica Salmaso, apesar de ela não ser jazzista. Vi um show dela e fiquei encantada. Tem muita cantora boa no Brasil.

EM: Com todas essas influências, como foi se escolher determinadas músicas no teu CD. No final das contas você decidiu que ia cantar as músicas da Dolores Duran.
IG: Misturei um pouquinho de jazz, R&B. Tentei fazer uma releitura ma maioria das músicas pra tentar atingir o público mais jovem, tanto que toca em uma rádio de rap lá em Jundiaí a minha versão para Estrada do Sol. Algumas baladas em São Paulo também tocam a minha música. O intuito foi o de mais pessoas conhecessem Dolores Duran. Na verdade essa homenagem à Dolores ia ser o meu segundo disco, mas como eu recebi essa proposta e seria mais fácil pra eu gravar resolvi fazer. Uma coisa foi de encontro à outra; divulgar a Dolores e trabalhar o meu nome artístico.

EM: Foi um ótimo disco de estréia. De treze músicas, só My Funny Valentine teve a participação de seu irmão, Tony Gordon, porque?
IG: My Funny entrou porque é uma música que a Dolores interpretou e foi muito elogiada pela Ella Fitzgerald. Disse que foi a melhor interpretação de My Funny que ela havia escutado. Aí eu tive a idéia de chamar o meu irmão porque ele gosta muito de cantar em inglês e foi uma maneira de unir a família, eu meu irmão e a Dolores.

EM: Você já está gravando seu segundo disco, o que vem por aí?
IG: Músicas inéditas, compositores amigos com quem eu trabalhei, já dividi palco, como o Lupa Mabuze e João Suplicy. Estou arriscando, tem uma composição minha. Estou esquecendo alguém? Espera aí. Tem uma cantora nova que eu acho muito boa, a Giana Viscardi, uma música dela que se chama Gata Lúcida.

EM: Eu escolhi algumas músicas do seu disco e queria que você comentasse, a primeira é O Negócio é Amar.
IG: Essa é interessantíssima, porque a Dolores pegou o começo da bossa nova. Parecia que ela já tinha essa idéia do que viria, esse estouro. Digo até em todos os níveis sociais e ela deixou essa letra que foi musicada pelo Carlos Lira. Eu tenho orgulho de cantar porque é uma música tão boa, tão interessante, com tudo a ver com o que ela vivia que era a época da dor de cotovelo.

EM: O Que é Que eu Faço?
IG: Como eu não tive contato com a Dolores Duran, eu imaginei uma história de amor na vida dela, então eu fiz uma ordem de músicas como se ela estivesse vivendo uma história de amor do começo ao fim. Na primeira música, O Negócio é Amar, ela fala que amar é legal, é muito bom, mas não a imaginei ligada à alguém. Em O Que é Que Eu Faço ela já está apaixonada. Com aquele amor que já estava ali tocando a alma, tocando o coração dela. Eu me sinto muito próxima a ela e assim vai.

EM: Estrada do Sol.
IG: Na ordem do que eu fiz no disco, ela já está curtindo o amor dela. Quando a noite terminava, porque ela cantava até de manhã, ela gostava de ir ao Mosteiro de São Bento, no Rio, ouvir o canto gregoriano dos padres. Então eu a imagino não de manhã, mas vendo a noite: “É de manhã vem o sol, mas os pingos da chuva que ontem caiu”.

EM: A Noite do Meu Bem.
IG: “Paz de criança dormindo”, não tem coisa mais divina. Foi perfeito, letra e música de Dolores Duran. É um momento sagrado, divinal, que vem a inspiração e ela escreve uma coisa tão maravilhosa. É quase sem comentários.

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