quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Sam Rivers morre na Flórida aos 88


Considerado um dos grandes nomes da vanguarda do jazz por sua capacidade de improvisação, o saxofonista Sam Rivers morreu de pneumonia aos 88 anos de pneumonia em Orlando, estado da Flórida, EUA.
Nascido em uma família de músicos, Rivers integrou a banda da diva Billie Holiday nos anos 50 e tocou com Miles Davis nos 60.
Adepto do Be Bop, o saxofonista de Oklahoma gravou uma série de álbuns inovadores de sua própria autoria para o selo Blue Note, entre eles Fuchsia Swing Song. Também tocou junto com o baixista Dave Holland e o baterista Tony Williams.
Em 1970, Rivers e sua esposa Bea compraram um apartamento no coração de Nova York, vindo a se tornar um local de encontro para músicos e aficionados por jazz. O nome do lugar era Studio Rivbea.
Em pouco tempo, este lugar se converteu na pedra angular do movimento "Loft jazz scene", que se popularizou nos anos 70 em Nova York e que consiste em fazer shows em grandes apartamentos, que são de fato reciclagens de fábricas e armazéns em desuso.
Nos anos 80, Rivers tocou durante quatro anos com a banda United Nations de Dizzy" Gillespie, para logo se estabelecer em Orlando e formar sua própria banda.
"Para mim, meu pai esteve de férias a vida toda", disse sua filha e empresária Monique Rivers Williams na segunda-feira, ao jornal The Orlando Sentinal, ao informar sobre o falecimento.
"Ele costumava me dizer: 'Estou trabalhando, mas aproveito cada momento dele'", explicou. "Aposentaria não fazia parte de seu vocabulário. Ele costumava me perguntar: Para que temos essa palavra?", acrescentou.

domingo, 25 de dezembro de 2011

A história do blues brasileiro passa por Flávio Guimarães


Texto: Eugênio Martins Júniors
Fotos: Divulgação

Flávio Guimarães é o gaitista mais respeitado da cena blueseira brasileira. Tanto aqui como lá fora. Integrante do pioneiro grupo Blues Etílicos, está por aí há 25 anos, tocando, gravando e escrevendo a história do gênero no Brasil.
Participou de um dos primeiros e mais importantes festivais de blues realizados no país, o Festival Internacional de Blues de Ribeirão Preto, em 1989, onde eu mesmo tive o prazer de assistir a lenda viva, o guitarrista e cantor Albert Collins.
O show teve a participação da guitarrista, na época principiante, Debbie Davis, e foi a primeira vez que vi um músico usar um cabo de trinta metros para descer e tocar no meio da multidão. Mr Collins incendiou a já quente e abafada noite de Ribeirão Preto. Pois é, não falei que o cara participou da história. Flávio conta um pouco desse grande evento na entrevista abaixo.
Considerado um dos músicos mais técnicos em seu instrumento, em seus trabalhos mais recentes, Flávio Guimarães e Prado Blues Band, The Blues Follow Me e Flávio Guimarães and Friends, o gaitista carioca mergulhou profundamente no estilo tradicional de tocar a harmônica blues.
Ele também é responsável por um dos eventos ligados ao blues mais legais realizados em São Paulo, o Encontro Internacional de Harmônica, no Sesc Pompéia, que reúne nomes do Brasil, América do Sul e Estados Unidos e que em 2011 chegou à décima edição.
Joe Filisko, Mitch Kashmar, Gonzalo Araya, Adrian Jimenez, Rick Estrin, Andy Just, Ivan Márcio, Big Chico, Harmônicos e muitos outros já participaram.



Eugênio Martins Júnior – Como foi que você chegou à harmônica?
Flávio Guimarães –
Desde a infância, na minha casa, havia bons discos. Desde música brasileira até de jazz. Meu pai ouvia jazz, me lembro de ter ido com ele aos, sei lá, dez anos de idade, ver uma banda de Dixieland americana, de New Orleans, no Teatro Municipal do Rio. Ele deu um jeito de eu entrar, era um cara que curtia jazz, então eu já tinha essa sonoridade do jazz na minha cabeça. E o tipo de jazz que meu pai ouvia, um jazz mais antigo, tinha blues no meio. No caso da harmônica eu já tinha vários amigos músicos e eu atacava de roadie de vez em quando. Um dia assisti a um show do Rildo Hora no Parque da Catacumba e achei incrível o som que saia do instrumento. Um instrumento que ficava quase invisível na mão. Ali me despertou o interesse. Menos de um mês depois assisti o Maurício Einhorn e o procurei para ter aulas. Tive muitas aulas com o Maurício ao longo de vários anos, ia e voltava, mas fiz um aprendizado formal de (harmônica) cromática com ele. Naquela época, em 1983, por aí, a gente não tinha muita importação no Brasil, os discos de blues eram raros. Que eu me lembre, o que saiu no Brasil com gaita, eram os discos do Muddy Waters e do Johnny Winter, acho que o White, Hot and Blues, um disco muito bom com o Pat Ramsey na gaita. Esses discos foram lançados no Brasil e tocaram na Rádio Fluminense, a Maldita. Não sabia se era gaita ou se era guitarra. Um dia um amigo me deu uma fita do Sugar Blues e eu mostrei ao Maurício e perguntei se era gaita diatônica. Ele disse não de jeito nenhum, isso é uma gaita (Hohner) Koch. É uma diatônica de chave. Fiquei louco atrás dessa gaita e naturalmente descobri que não era Koch coisa nenhuma. O Maurício nunca havia visto ninguém tocar de fato uma diatônica bem e não acreditou que era. Ela chamava a gaita diatônica de “porrinhola”. Dizia que era um brinquedo. Aí eu comprei umas duas gaitas diatônicas e comecei a aprender de ouvido com Bob Dylan, Neil Young. O Primeiro LP dos Rolling Stones tinha o Brian Jones tocando gaita. Aí cheguei em Muddy Waters. Através da loja do Carlitos Patroni, a Chess Carlitos, no Rio, conheci Charlie Musselwhite, Big Walter Horton, Sonny Boy Willianson, Little Walter e fui aprendendo de ouvido. Quando eu já tinha tomado gosto pela coisa, para tristeza do Maurício, comecei a tocar a cromática. Continuo tocando cromática, voltei para ela, mas a sonoridade da diatônica me apaixonou.

EM – Então na diatônica você começou como autodidata?
FG –
Comecei como autodidata em 85 e tive a idéia de montar uma banda de blues sem pretensões profissionais, só para me divertir. Já conhecia o baixista Cláudio Bedran e nós conhecemos o Otávio Rocha que tinha um estúdio em sua casa. Começamos a ensaiar e aquilo foi o embrião do Blues Etílicos. Um ano depois a banda estava formada. Dois anos depois o Blues Etílicos estava lançando o disco. Três anos depois estávamos sendo contratados por uma gravadora de São Paulo, a Eldorado. Ou seja, a brincadeira e o profissionalismo foram dois ou três anos. Começamos a tocar em São Paulo, fazer programas especiais na TV Manchete, TV Cultura, depois MTV e aconteceu o boom no Brasil, nessa época.

EM – Então o Blues Etílicos foi a banda seminal do blues no Rio e em São Paulo foi o André Christovam?
FG –
Sim, o único cara que a gente ouviu falar que estava ligado ao blues e que havia acabado de chegar dos Estados Unidos era o André. Conheci-o em 88. O segundo disco do Blues Etílicos foi por uma grande gravadora, na época a Eldorado era grande, saiu praticamente junto com o nosso. O André participou do nosso e eu participei do dele.

EM - Hoje as bandas de blues brasileiras têm em quem se inspirar ou até mesmo quem pode dar uma força no começo da carreira. Na época em que o Blues Etílicos começou não havia isso. Conta como foi esse momento. A criação do Blues Etílicos?
FG –
Existia uma ascendência do rock brasileiro dos anos 80 que era muito forte. Mas como não era o nosso universo, nós não tínhamos a pretensão de virar um artista de rock, com aquela coisa do rock da época com um cantor dançando na frente, com pose e atitude rock and roll. A gente não se identificava com aquilo, mas éramos apaixonados pelos discos de blues do Muddy Waters, Johnny Winter, Little Walter. A gente montou uma banda de blues cuja intenção era tocar nos finais de semana em um bar ou outro no Rio de Janeiro. Naquele momento que montamos a banda não imaginávamos que aquilo ia virar a nossa profissão. Todos com vinte e poucos anos de idade. Aconteceu que a gente começou a tocar, o bar começou a encher, começou a entrar dinheiro. Uma loja de discos do Rio, a Satisfaction, resolveu bancar um LP independente e esse LP atraiu a atenção de uma gravadora. Aí quem estava com vinte e poucos anos, sendo impelido a trabalhar de segunda à sexta, oito horas por dia ou mais, para poder ganhar algum dinheiro, estava ganhando mais tocando do que trabalhando. Pensamos: “Pô, isso é muito melhor do que trabalhar!”. Sem conta que sempre ficamos em bons hotéis, comemos bem, tem cerveja de graça, conhecemos mulheres interessantes, fomos bem tratados. Isso aqui é vida, trabalhar, tô fora.

EM – O André Christovam me disse que os álbuns dele Mandinga e A Touch of Glass e Água Mineral e San-Ho-Zay do Blues Etílicos venderam mais de 40 mil cópias. Juntos, os quatro venderam mais do que todos os discos de blues nacionais e internacionais lançados no Brasil até então. Vinte anos depois, como você lembra dessa época?
FG –
Saiu uma matéria na Folha de S. Paulo, acho que em 92, e tinha os discos de blues mais vendidos no Brasil. Em primeiro lugar estava um disco do B.B. King que vendeu 50 mil cópias. Depois vinha o Blues Etílicos San-Ho-Zay com 35 mil cópias. A contagem era feita em cima de LPs e fitas cassetes. Lembro que o Água Mineral vendeu 25 mil cópias. Imagino que o Mandinga, do André, tenha vendido em torno de 20 mil. O André teve mais espaço na mídia do que o Blues Etílicos, mas acho que, não só naquela época, o fato de sermos uma banda era uma coisa inédita. O artista isolado faz o seu trabalho e tem seu fã clube, mas uma banda tem um potencial maior e, claro, tem a galera que gosta do Greg Wilson, um cantor americano que toca guitarra pra caramba, uns gostavam da slide do Otávio, outros gostavam da gaita. Nessa soma toda a gente acabava ganhando. A importância do André na cena do blues paulista é até maior do que a nossa e fizemos vários eventos bem sucedidos, inclusive juntos. Os shows das duas bandas, um dia o André abria e no outro era a gente. Levamos o André pra tocar no Rio e ele trouxe a gente pra tocar em São Paulo, foi um período muito legal.


EM – Gostaria que você lembrasse aquela viagem à Ribeirão Preto. Com todos aqueles cobras viajando juntos e aqueles shows.
FG –
O Festival de Blues de Ribeirão Preto, produzido pelo César Castanho, em 1989, foi o grande divisor de águas para o blues no Brasil. Além de ter tido o melhor cast de todos os tempos, com Buddy Guy, Albert Collins, Etta James, Magic Slim com uma banda maravilhosa, o Teardrops em sua formação original com o John Primer na guitarra, a guitarrista Debbie Davis. O clima do festival foi muito bom, teve interação entre os músicos, jam sessions e tal. O Blues Etílicos abre o festival na primeira noite para o Buddy Guy e ele me convida ao palco pra tocar com ele. Entrei com as mão e pernas tremendo e quando saí o Junior Wells me deu um tapinha no ombro e entrou no palco. Foi emocionante, o festival colocou o Brasil no mapa do blues aqui no Brasil. Por que? Passou duas vezes no Fantástico, quatro vezes no Jornal Nacional, no Jornal da Cultura, na Folha de S. Paulo. Um mês antes do festival foi fretado um avião para Ribeirão Preto pra uma coletiva de imprensa. A imprensa cobriu 100% do festival.  O Blues estourou no Brasil, naquele momento a gente pegou a crista da onda. O César castanho manteve bons festivais até meados dos anos 90. Teve também um festival muito bom que foi o Top Cats, que trouxe o Willian Clarke, Little Charlie and The Nightcats, Robert Cray e muita gente boa. O Bourbon Street entrou na jogada e foram anos muito bacanas e o blues seguiu crescendo aproximadamente até 2002. Aí acontece uma mudança dentro do cenário do blues, houve um excesso de bandas novas surgindo e essas bandas ocuparam o espaço das bandas anteriores, porque as bandas que vinham antes, nós o André o Nuno Mindelis, tinham um cachê um pouco menor do que as bandas de rock. Entrou uma geração nova de músicos de blues que se dispõe a tocar de graça nos bares ou por pequenas percentagens de bilheteria ou de graça mesmo. Então o dono de bar começa a pensar porque ele vai pagar alguém se eu tenho esses caras que tocam de graça. Essas bandas, muitas vezes, eram formadas por médicos, dentistas, jornalistas, bancários que curtiam blues e montavam suas próprias bandas para divertimento. E eram tantas bandas ruins tocando em São Paulo que o público de blues se evadiu, os bares fecharam ou mudaram sua programação, colocando bandas de cover de rock.

EM – Que também é ruim.
FG –
Sim e houve uma ressaca. Os grandes meios de comunicação começaram a considerar o blues uma coisa que não era mias relevante no cenário cultural brasileiro. Claro que com o tempo, o joio se separa do trigo e quem curte tocar e toca com qualidade se manteve. Também surgiu uma nova geração de músicos que levam o blues à sério, Igor Prado, Ivan Márcio, Flávio Naves. Uma galera que ta aí pra viver de música e o blues volta a ter qualidade no Brasil. As bandas mais amadoras foram desistindo. Isso foi um ciclo que aconteceu no blues do Brasil.     

EM – E com relação às letras em português, você acha que atrapalhou ou ajudou? O André me disse que se vocês continuassem a fazer letras em português o sucesso continuaria.
FG –
Eu concordo com ele. O André é um grande letrista em português, aquele disco Mandinga. Acho que as letras dele era superior às nossas, mas o nosso lance do humor despretensioso. Acho que nós desistimos de fazer letras em português por dois motivos: um público mais radical que queria ouvir blues em inglês e a outra é que a música popular brasileira tem uma exigência muito alta no quesito letra. Quer dizer, não há essa exigência quando é o sertanejo, o pagode, nada disso. Como a gente estava em um seguimento, digamos, de música com qualidade, porque era considerado dessa forma pelas gravadoras, rádios e jornais, então queriam que a gente fizesse letras com  a profundidade e a riqueza métrica e poética do Caetano Veloso ou do Chico Buarque e a gente não tinha isso. Até porque o blues original não é profundo, são letras muito simples, muito populares, com duplo sentido e com bom humor. Não só concordo com o André, como acho curioso que 90% dos trabalhos de blues no Brasil não são autorais. Trabalhos de blues em português são raríssimos. É um entrave pra você expandir o público. No caso do blues, quando você entende a letra, o humor, o duplo sentido, a malícia. Às vezes o cara entende ao pé da letra e aí a letra fica tosca. Mas é como o nosso forró, tem uma sacanagem, tudo com conotação sexual. Quando você entende, você se diverte. O blues nada mais é do que uma boa história contada e com uma instrumentação rica, um bate bola legal. Realmente, o blues brasileiro acabou sendo uma coisa de solistas de guitarra, solistas de gaita, tendo mais destaque que a letra ou o cantor.  Perdeu um pouco o sentido, mas faz parte. 

EM - Em que momento você sentiu que era a hora de sair em carreira solo?
FG –
Em 94 gravei o Little Blues que saiu em 95. Depois tive um hiato de cinco anos e em 2000 lancei o On The Loose. Quando rolou essa ressaca de blues, tanto eu quanto o Blues Etílicos, tentamos fazer uma coisa mais dentro do universo da música popular brasileira, sem muita definição, mas não era blues, os discos Cor do Universo e o Navegaita. Foram tentativas positivas porque geraram boas músicas, coisas interessantes como O Repente, Balada de Robert Johnson, misturas originais e criativas que achei que foram válidas. Deu certo até certo ponto, mas a gente retornou ao segmento blues. Era isso que gerava o nosso sustento e nossa alegria. O Blues Etílicos é uma das raras bandas no Brasil que tem material próprio, temos um DVD que tem um monte de músicas nossas e parcerias. Existe uma mistura com a música brasileira sem forçar a barra, onde o blues se integra naturalmente. Uma mistura que deu certo.

EM – Nesse tempo em que você está em carreira solo, se distanciou um pouco do teu estilo inicial. Quer dizer, antes você era muito mais técnico, com solos mais fortes, cheios de notas e tal. Mas agora está com um estilo mais tradicional. Você concorda?
FG -
No início tocava rock e blues rock com embocadura de bico, muitas vezes focado em velocidade e técnica. Timbre e melodia vêm substituindo essa fase que considero como uma espécie de adolescência na gaita.

EM – Tua parceria com a Prado Blues Band vem de encontro ao que eu perguntei antes. Entre as tuas parcerias, essa é, sem dúvida, a mais prolífica, já rendeu participações de ambos os lados. Gostaria que falasse sobre isso.
FG -
O Blues é um tipo de música que se toca em time. Pra blues tradicional, Igor e Cia. preencheram uma lacuna que faltava no Brasil. Sabem acompanhar um gaitista tradicional como poucos.

EM – O CD Flávio Guimarães and Friends acaba de sair do forno. Como nasceu a idéia de gravar todas essas parcerias. Ou elas já estavam no baú só esperando a oportunidade de serem publicadas?
FG -
Tive a sorte e felicidade de trabalhar e aprender com alguns dos melhores mestres da gaita blues e esse CD registra nossa parceria.

EM – Nesse CD tem Rick Estrin, Peter Madcat Charlie Musselwhite, Joe Filisko, Steve Guyger, Gary Smith e sei que cada momento deve ter sido especial. Mas qual foi o mais emocionante?
FG -
Todos foram momentos especiais e inspirados. Mesmo achando que o CD tem um certo excesso de gaita, acho que vale muito a pena pelo contraste de estilos e pelo valor histórico de reunir tantos ícones da gaita blues num mesmo CD.




EM – O Brasil tem uma cena blues hoje?
FG -
Sem dúvida o Brasil se tornou um dos 10 maiores mercados de blues no mundo. Ainda existe muito amadorismo, mas cada vez mais estamos nos profissionalizando.

EM – Você é o principal nome da harmônica blues no Brasil. Já pensou em gravar ou até mesmo fazer uma temporada nos Estados Unidos? Conhecimento é o que não lhe falta?
FG -
Já toquei nos EUA, oficialmente em festivais e bares de blues com remuneração além de muitas canjas em bares. Tocar blues na Europa e EUA é pura curtição, bom pra quem não tem filhos ou outros compromissos financeiros. Vale pela experiência e intercambio, mas, em geral, se computarmos as despesas e os presentes que trazemos pra família, o músico brasileiro volta com menos dólares do que levou.

EM – Qual é o equipamento que você usa no palco?
FG -
Amplificador Serrano e mic Astatic JT 30 é minha configuração ideal.

EM – Qual é a tua orientação para desenvolver aquele timbre super?
FG -
100% tongue blocking pra se tocar blues é a resposta. Tem uns 10 caras no Brasil apenas que conseguem tocar dessa forma. Em CDs e gravações podemos maquiar o timbre com alguns recursos de gravação e mixagem, mas ao vivo o buraco é  mais embaixo.


segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Morre Hubert Sumlin, a guitarra de Howlin' Wolf


Hubert Sumlin, um dos últimos ícones da guitarra blues, morreu ontem aos 80 anos em Nova Jersey (EUA).
Parceiro de Howlin 'Wolf, participou das lendárias sessões na Ches Records que registraram clássicas canções como o Wang Dang Doodle, Spoonful e Backdoor Man
Seu jeito de tocar foi referência para gerações de guitarristas, entre eles, Budy Guy e Jimi Hendrix. Além deles, Keith Richards, dos Rolling Stones, Jimi Hendrix e Frank Zappa já disseram ser influenciados pelo músico, que ficou no 43º lugar na mais recente lista dos 100 maiores guitarristas da revista "Rolling Stone.
Sumlin foi um dos principais nomes da cena blues de Chicago, tendo conseguido um espaço no Hall da fama do blues em 2008. 
Nasceu no Mississippi, foi criado em Arkansas e se mudou para Chicago para tocar com Howlin 'Wolf. Após a morte de Wolf, em 1976, continuou a tocar com o resto da banda, quando adotaram o nome The Gang Wolf.
Ele foi diagnosticado com câncer nos pulmões em 2002 e teve um pulmão retirado, mas continuou tocando.


terça-feira, 22 de novembro de 2011

VIDA DE LOJISTA: A ordem dos fatores não altera o produto

Abro aqui uma exceção e publico uma matéria escrita para outro veículo. O motivo é que a Harmonica Master, uma loja especializada em gaitas, cresce graças ao esforço de dois amantes do instrumento: Rodrigo Morenno e Fabíula.


Por Juliana Cruz 
Para Música e Mercado

Empresário há 12 anos, Rodrigo Morenno fez o caminho inverso da maioria dos lojistas brasileiros do setor de instrumentos musicais. Em 2006, o comerciante, habituado a vender cartuchos e prover assistência técnica para impressoras, começou a comprar e vender gaitas pela internet, abrindo, em março do ano seguinte, uma loja virtual especializada no instrumento.
A escolha da gaita se deu pelo fato de Morenno tocar harmônica. Ele começou a estudar em 2000 e, em 2001, fundou o Gaita-BS (Gaitistas da Baixada Santista), grupo regional que reunia entusiastas do instrumento. “Notando a imensa dificuldade dos gaitistas em conseguir o produto desejado nas lojas e pela internet, encontrei a oportunidade de vendê-los. O sucesso foi imediato”, conta.
Para abrir a loja virtual foi necessária muita dedicação do empresário, que não sabia utilizar ferramentas como Corel Draw, Photoshop ou qualquer software de programação. “Escolhi um sistema de loja virtual de software livre (Virtua Store), fiz alguns ajustes e contratei um programador para corrigir os erros. Aprendi tudo sozinho consultando a internet”, orgulha-se.
A expectativa inicial do lojista era ser referência no comércio de harmônicas e, segundo ele, o objetivo foi alcançado rapidamente. O comerciante atribui o êxito à sua vivência de 12 anos como empresário. Além disso, ele sabia que precisava prover um serviço satisfatório para manter os clientes sempre voltando ao seu site.
Após um ano na web, a então Harmônica Master optou por locar um sistema mais robusto, seguro e com mais recursos. Foi quando Morenno se profissionalizou e contratou uma agência de publicidade para criar o logotipo da empresa. O site foi lançado oficialmente em 1º de março de 2007 e, embora ainda hoje dependa de sistema alugado, a empresa já conta com webdesigner e SEO próprio (veja quadro na pág. XX).

Primeiros passos - Como em qualquer novo negócio, o comerciante também enfrentou problemas para abastecer seu site de compras com produtos. “Tínhamos dificuldade em negociar com os fornecedores, pois muitos não vendem para comércios virtuais que não tenham uma loja física”, explica. Porém, superando as dificuldades com empenho, dois anos depois de entrar no mercado de gaitas, em abril de 2009, a empresa inaugurou sua loja física, dentro do Embaré Shopping, uma galeria com 50 lojas localizada na cidade de Santos, SP. “Inauguramos a primeira loja física especializada em gaitas do Brasil e do mundo”, afirma o empresário.
Com a abertura da Harmônica Master, Morenno, que divide as responsabilidades da loja apenas com sua esposa, Fabíula Morenno, teve de enfrentar novos desafios em termos de organização.  “Não foi como montar uma loja virtual. Não se tratava mais de editar uma imagem para colocar no site e embalar um produto para envio. Tudo se tornou mais complexo e minha esposa e eu precisamos aprender sozinhos, sem auxílio ou referências”, explica o comerciante sobre a expansão inversa de seu negócio.
Com a expansão, Morenno descobriu um dos pontos importantes em ter um negócio onde se atende o consumidor face a face. Quando vendia somente pela internet, não sabia quem eram seus clientes, por isso se surpreendeu quando descobriu que não se tratava necessariamente de músicos profissionais. “Na realidade, a maioria das vendas é para os iniciantes”, comenta. Assim, começou a mudar a abordagem do negócio a fim de alcançar de forma mais efetiva também os músicos profissionais. Inclusive, um nicho especial de clientes da loja, tanto virtual quanto física, é formado até hoje por músicos de blues, e, para garantir sua satisfação, a Harmônica Master já compra produtos nas cores e modelos que os bluesmen mais gostam.

Tamanho não é documento - Com estrutura enxuta, a loja é completamente informatizada, com apenas dois vendedores atuando sob a supervisão de Morenno e de sua esposa. “Damos preferência a funcionários músicos. O conhecimento específico do assunto é essencial”, complementa.
Em relação aos produtos que vende, orgulha-se por ter sido um dos primeiros clientes da Bends, empresa que encerrou suas atividades no ano passado. “Sempre apoiamos a iniciativa deles, disponibilizávamos toda a linha de produtos em estoque e indicávamos aos consumidores”, afirma.
Para Morenno, a Bends teve papel importante na divulgação da gaita no Brasil e agitou a concorrência. Os produtos da marca estavam entre os mais vendidos da loja, mas o fechamento da fábrica não impactou muito nos negócios da Harmônica Master. “Após a notícia de que a Bends ia parar de fabricar, os clientes compraram mais, o que afastou o receio de os produtos encalharem”, relembra. “Os músicos que utilizavam Bends hoje optam por outras marcas tradicionais, sempre disponíveis na loja, então não houve impacto negativo no faturamento”, conclui.
Ainda assim, o produto mais vendido na loja sempre foi a gaita Hering Free Blues afinada em C (Dó), muito indicada na internet pelos próprios usuários, conta Morenno. Como o segmento ia ‘muito bem, obrigado’, somente em 2010 o casal decidiu diversificar o mix, com acessórios e instrumentos de corda, sempre acrescentando, pouco a pouco, um novo item, como microfones, amplificadores, percussão etc.
Apostando em áudio, o empresário revela que o aumento da oferta de produtos garantiu excelentes resultados em vendas, com mais de 300% de crescimento no faturamento. “Áudio tem ótima saída no comércio virtual, diferentemente de um instrumento de corda, que o músico faz questão de testar vários e comparar”, explica.

Focados, mas sem medo de arriscar - Embora 80% dos lucros da Harmônica Master provenham do comércio virtual, Morenno planeja ampliar a loja física, atualmente com 50 m². De acordo com o empresário, o espaço já não atende às suas necessidades, pois desde 2010 também funciona a Escola de Música no piso superior. “Estamos buscando um novo local, de 150 a 200 m²”, comenta.
Morenno prefere mudar de estabelecimento em vez de abrir uma filial por estar seguro de que uma loja é suficiente, ainda mais porque seu foco é web.
Em Santos, além da Harmônica Master, existem oito lojas de instrumentos musicais e, nas outras cidades da Baixada Santista, apenas quatro. “O consumidor tem se voltado cada vez mais para o e-commerce e assim a concorrência passa a ser até internacional. Investimos e apostamos muito mais em nossa loja virtual, pois já temos clientes em todo o Brasil”, explica.
Com tanto investimento na web, é claro que a Harmônica Master precisa prezar pela eficácia da entrega dos pedidos da loja virtual e pelo atendimento personalizado aos clientes: “Oferecemos diversas formas de contato, telefonamos, nos preocupamos em somente vender aquilo que vai satisfazer a necessidade. Nosso foco é cliente satisfeito”.
O retorno de tamanha personalização tem sido satisfatório, pois a loja recebe diariamente e-mails espontâneos de consumidores elogiando o serviço. Já na loja física, a empresa aposta na flexibilidade na hora da negociação. “Em uma loja pequena, cada cliente é importantíssimo. Temos uma agenda repleta de contatos e os convidamos para os eventos que realizamos, além de avisarmos quando chegam novos produtos. Damos atenção personalizada a esses clientes também”, destaca.
Para sua felicidade, Morenno tem notado que, no segmento das harmônicas, a procura por instrumentos de melhor qualidade vem crescendo a cada dia: “Os gaitistas estão amadurecendo e encarando cada vez mais a gaita como um instrumento sério e completo, adequado a todo tipo de música”. O comerciante acredita que a facilidade de acesso às informações na internet tenha contribuído muito pra isso.
No próximo ano, além de instalar a loja e a Escola de Música num espaço físico maior — ajudando, também, na disseminação do estudo musical —, o empresário espera tornar a Harmônica Master tão conhecida na região quanto ela já é no comércio virtual. Para tal, Morenno e sua esposa pretendem explorar outros segmentos. “Já nos consolidamos no comércio virtual de gaitas, e sabemos que as harmônicas não devem representar nem 1% do faturamento de outras lojas. Vamos agora aplicar nossa qualidade de serviço a outros nichos que, embora sejam muito concorridos, representarão um crescimento expressivo para a Harmônica Master”, antecipa, otimista, o comerciante.




sexta-feira, 18 de novembro de 2011

De volta aos palcos de Santos, Maria Rita vai emocionar em show com canções inéditas

A cantora se apresenta no sábado, dia 10 de dezembro, às 22 horas, no Mendes Convention Center. O repertório conta com sucessos da carreira e canções de seu novo trabalho


Maria Rita volta ao palco em Santos com um espetáculo que promete emocionar e divertir seu público. A cantora usa a canção como foco e a voz como instrumento, em um show que reúne canções dos três discos gravados ao longo da carreira, além de músicas de projetos dos quais ela participou e inéditas para celebrar o lançamento de seu mais recente trabalho.
O show de Maria Rita tem encantado os fãs e é sinônimo de sucesso por onde passa. Em julho, a cantora viajou para uma curta temporada na Europa, onde se apresentou na França, Portugal e Suíça e, na volta ao Brasil, se prepara para celebrar seu quarto e tão esperado novo trabalho.
Maria Rita sobe ao palco acompanhada pelo trio composto por Thiago Costa (piano), Sylvinho Mazzucca (baixo) e Cuca Teixeira (bateria). No repertório, a cantora apresenta músicas como Caminho das Águas, O que é o amor, Num Corpo Só, Conceição dos Coqueiros, Santana, Só de Você, Encontro e Despedidas, entre outras. 
Além das músicas já conhecidas do público e canções escolhidas porque, segundo a cantora, são músicas que gosta de cantar e que a emocionam, os fãs terão a oportunidade de conhecer trabalhos inéditos.

Serviço:
Show: Maria Rita
Local: Mendes Convention Center 
Data: sábado, dia 10 de dezembro
Horário: 22 horas
Endereço: Av. Gen. Francisco Glicério, 206
Classificação: 14 anos
Ingressos no site WWW.compreingressos.com ou pelo telefone 4062-0027 
E também nos pontos de venda:  
Loja Ferrs’ – Av. Ana Costa, 549 – lojas 53/54 – Gonzaga – (13) 3284-8669 – Santos
Papelaria Marchiori – Av. Marina, 713 – Centro - Mongaguá

Preços:
Primeiro lote – 1300 ingressos
Setor Vip – R$ 170,00
Setor A – R$ 120,00
Setor B – R$ 100,00
Setor C1 – R$ 70,00
Setor C2 – R$ 70,00

Segundo lote
Setor Vip – R$ 200,00
Setor A – R$ 150,00
Setor B – R$ 120,00
Setor C1 – R$ 80,00
Setor C2 – R$ 80,00

Realização: Hub Entretenimento
Produção: Mannish Boy Produções Artísitcas 
Apoios: Clube Assinante A Tribuna, TV Tribuna, Ferrs' e Papelaria Marchiori

OBS: Sócio Clube Assinante A Tribuna ganha 20% de desconto na compra de qualquer ingresso com apresentação de comprovante.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Chicago e São Paulo dividem o coração de Donny Nichilo

Donny no Sesc Santos em 2010 - Produção do Mannish Blog

Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Marcos Rodrigues
Imagens: Chico Blues

Donny Nichilo nasceu em um dos lugares mais quentes do mundo para o blues: West Side Chicago. Em suas próprias palavras, “um bairro animado e turbulento”. Luther Allison, Magic Sam e Jimmy Dawkins são alguns nomes que assinam o som dessa parte da cidade.  
Cresceu na lendária Maxwell Street, onde todos os domingos se instalava um mercado informal onde se vendia de tudo. Os aromas de churrasco de porco e frango frito se misturavam com o som do mais puro blues que poderia existir. 
Naquela época, anos 60 e 70, a passagem pela Maxwell era obrigatória a todos os blueseiros, conhecidos ou não.
Essa atmosfera proporcionou um grande aprendizado ao jovem Donny que, em buscar do “Santo Graal”, tocava como, quando e com quem podia. Ainda havia os clubes onde a coisa real acontecia todas as noites. Sem exceção. 
De tanto acender velas aos deuses do blues, um dia eles atenderam os pedidos de Donny e ele entrou para a banda de Buddy Guy. Aí sim, estava numa boa. No primeiro time, finalmente. Nesse período tocou com Junior Wells, Floyd McDaniel e Mighty Blue Kings. Além de cruzar com as personalidades da música na estrada, como veremos na entrevista abaixo. Algumas imagens são do show em Santos, em fevereiro de 2010. A produção foi do Mannish Blog e Agência Urbana.
Mas a vida é uma caixinha de surpresas e o coração de Donny foi fisgado pro uma brasileira. Assim, se instalou no Brasil e passou a desenvolver uma carreira solo na terra do Xote e do Baião. 
Desde então, participa de shows por todo o país com as mais diferentes bandas de blues brasileiras. Lançou no começo de 2011 o CD Long Way From Chicago, com a participação da Igor Prado Band (eles de novo) e Sax Gordon. Uma história que une o frio (não a frieza) do hemisfério norte com o sol aqui de baixo. Isso dá blues.


Eugênio Martins Júnior - Quando e como foi seu primeiro contato com o blues?
Donny Nichilo – Conto uma pequena história na contracapa do meu CD, Long Way From Chicago, que responde essa pergunta. Tinha uns 17 anos e ouvia o rádio quando Little Walter tocou Key to the Highway. Senti como se estivesse ouvindo a melhor coisa que já havia ouvido em minha vida. Senti como se tivesse sido atingido por um raio. No mesmo dia corri pra comprar um álbum do Little Walter chamado Hate to See You Go e também comprei uma harmônica. Me tranquei no quarto até poder tocar um riff ou dois. Foi amor à primeira ouvida. 

EM – Como foi o seu primeiro contato com a cena de Chicago? Conheceu a Maxwell Street nos bons tempos?
DN – Comecei a trabalhar na Maxwell Street na mesma época, vendendo coisas em uma barraca numa esquina. Havia bandas e músicos de blues andando em todos os lugares. Foi a última grande era da Maxwell Street. Às vezes eu sentava e ficava com as bandas. Isso faz parte da minha educação e paixão pelo blues. Sentia como se estivesse no céu.  

EM - E o piano, como foi essa escolha?
DN – Comecei com a harmônica, que, é claro, ainda amava. Após tocar a harmônica, que toquei por mais ou menos um ano, percebi que precisava de outro instrumento para me expressar por completo, musicalmente falando. Então, comecei a aprender piano. Sempre amei o piano e foi nessa época que descobri Otis Spann, outro herói pra mim. Toquei meus discos do Otis Spann tantas vezes que os destruí, ficaram muito arranhados e impossíveis de ouvir. Às vezes eu comprava o mesmo álbum duas ou três vezes.

EM – Você tocou com o Buddy Guy, considerado um dos maiores nomes da atualidade e porque não dizer de todos os tempos. Como foi a experiência?
DN – Ter tocado com Buddy Guy foi a “virada” na minha carreira musical. Uma tremenda experiência. Viajei pelo mundo e toquei com pessoas como Albert King, Albert Collins, Gatemouth Brown, Junior Wells, Dr John, John Lee Hooker, Carlos Santana, Stevie Ray Vaughan, Ron Wood, e muitos nomes importantes da música. Isso obriga você a melhorar suas habilidades, tocar em um nível mais alto. Costumávamos tocar noite após noite por meses. 
Todas essas coisas, mais as conexões e exposição, e todo aquele aprendizado se impõe em você. Isso me colocou em um lugar e em um nível musical diferente. Então, foi uma experiência inestimável. Foi maravilhoso.

James Wheeler, Donny e Igor Prado Band - Sesc Santos - Fevereiro de 2010

EM – Tenho a impressão de que tocar com o Buddy é caminhar em um campo minado. Ou seja, você tem sempre de estar atento, porque ele muda a toda hora. Procede?
DN – Uau! Boa pergunta... e muito verdadeira, muito perspicaz! Buddy é um grande showman, e como você sabe, muito espontâneo, pra dizer o mínimo. Buddy nunca prepara listas de músicas e não sei se você sabe às vezes ele não toca as músicas até o final! Então, você tem de prestar atenção, totalmente focado... todo o tempo. Por outro lado, é a outra face do meu grande aprendizado.
Espontaneidade e jogo de cintura são cruciais na música improvisada. Então, havia comunicação e respeito entre os membros da banda. Estamos em cima do palco trabalhando juntos, apoiando um ao outro, contando uma história como um grupo. Foi um ótimo treinamento.    

EM – Você está morando no Brasil há quanto tempo? O que acha do país?
DN – Estou morando em São Paulo há três anos, indo e vindo de Chicago. Amo o espírito das pessoas daqui. Quando faço um show por aqui, é mais do que uma experiência interativa. As pessoas fazem parte do show e eu realmente gosto disso.

EM – Mesmo vivendo no Brasil, você continua tocando com os blueseiros norte-americanos por conta do intenso intercâmbio entre os músicos dos dois países. Fale um pouco sobre isso.
DN – Quando os blueseiros dos Estados Unidos vêm tocar no Brasil, sempre sou honrado com o convite para tocar piano com eles. Acho que é por que os músicos brasileiros sabem que tenho 35 anos de experiência profissional. E eu sempre posso ajudá-los com relação à cultura, de um ponto de vista norte-americano. Além disso, alguns já são velhos amigos e colegas de tocar nos EUA, acho que todas estas coisas ajudam a torná-los mais confortáveis aqui.      

EM - Quais as diferenças e semelhanças entre os blueseiros brasileiros e os norte-americanos?
DN – Acho que em qualquer tipo de música, levamos toda a experiência de vida à maneira de tocar. Claro, os brasileiros têm seu próprio sentimento e abordagem. Isso não significa que o blues feito aqui é menos válido do que o dos norte-americanos. Por exemplo, ninguém irá dizer que George Shearing, ou Hermeto Pascoal, ou Oscar Peterson, ou Michel Petrutianni não são reconhecidos como grandes jazzistas, mesmo que nenhum deles seja norte-americano.


EM - Você tem desenvolvido uma carreira no Brasil. Como vê a cena brasileira?
DN – Acredito que a cena brasileira de blues está crescendo e se desenvolvendo. Parece que há alguns anos no Brasil só havia blues rock e blues tradicional. Acredito que agora a cena está amadurecendo e se tornando mais rica, com uma ampla representação em todas as formas e estilos de blues. Além disso, às vezes eu penso que existe uma paixão ainda maior para o blues aqui no Brasil e na América do Sul, porque ainda está sendo descoberto por muitos ouvintes.    

EM – Você tocou nos discos e shows da Igor Prado Band e eles tocaram no teu CD. É uma parceria que está dando certo. Fale sobre isso.
DN – A primeira vez que toquei com o Igor foi no Sesc Araraquara, em 2004. Ele era muito novo naquele tempo, mas eu percebi que ele e seu irmão, Yuri, e a banda, eram especiais. Igor tem um profundo amor e entendimento sobre o blues norte-americano e acredito que nossa amizade pessoal e musical é boa para ambos.
Disse na contracapa do meu CD que não acredito que poderia ter achado uma banda mais apropriada do que Igor, Yuri e Rodrigo, para esse trabalho. Em Chicago ou em qualquer outro lugar... é verdade. Esses caras são os grandes novos talentos e acredito que todo o mundo do blues vai saber disso em breve.     

EM – Fale-me sobre o teu CD. Como surgiu a idéia e oportunidade de gravá-lo?
DN – Houve um longo atraso em meu primeiro CD solo. Quero agradecer e creditar ao Chico Blues e ao Igor por ter me empurrado e ajudado a torná-lo realidade. E tenho de dizer, fiquei muito satisfeito com o resultado. Não poderia ter feito sem o Chico Blues, Igor, Yuri, Rodrigo e Sax Gordon. Suas contribuições fizeram esse CD ficar bom, se é que posso dizer assim.     

EM - Você abriu o show do James Wheeler em Santos com Lately, a única composição sua no CD. Fale-me sobre ela.
DN – Lately é a única composição original do CD. É uma canção muito pessoal, escrita sobre uma experiência de vida minha. Sou muito crítico e exigente com relação às minhas composições. Inclui Lately por causa do que ela significa pra mim e porque acredito que ela é uma das minhas melhores composições... de longe. Mas virão mais por aí.   

EM - O que você mais gosta e o que mais odeia no Brasil?
DN – Amo uma porção de coisas! Amo a comida, o clima, a natureza, as praias... muitas coisas. Mas, como disse antes, o que eu mais gosto é o espírito das pessoas e quanto elas são calorosas. Especialmente a intensa conexão com a audiência que eu sinto por aqui. Não odeio nada por aqui. Só gostaria de ver o país e sociedade melhores, para que mais pessoas possam ter uma vida mais próspera, segura e pacífica.

Donny’s interview

Eugênio Martins Júnior – When and how was your first contact with the Blues?
Donny Nichilo - I tell a little story in the liner notes of my CD, " Long Way from Chicago", which gives the answer to this question. I was around 17 years old, and I was  listening to the radio, when I heard Little Walter playing " Key to the Highway". I felt like I heard the greatest thing I had ever heard in my life. I felt like I was struck by lightning !! That same day, I ran out and bought the Little Walter album " Hate To See You Go" and I also bought a harmonica and locked myself in my room until I could play a riff or 2. It was love at "first hearing".

EM – How was your contact with the local scene. Did you knew Maxwell Street?
DN – Around the same time, I started working on Maxwell St., selling goods from a street- corner stand. There were bands and strolling blues musicians playing everywhere !!. This was the last "great" era of Maxwell St. .I got to "sit in" with the bands sometimes.It was another great part of my blues passion and education. I felt like I was in heaven!

EM – How did you start to play piano?
DN - Started with harmonica, which , of course, I still love. After playing harp for a year or so, I knew I needed another instrument to express myself more fully, musically,... so I started to learn piano. I had always loved piano, and also around this time, I discovered Otis Spann, another early "hero" of mine. I would play my Otis Spann records so many times, that I would destroy them. After playing them so many times, they would be too scratched -up to hear. Sometimes I would have to buy the same album 2 or 3 times !!

EM – Did you play with Buddy Guy, one of the greats of all times. How was the experience?
DN – Playing with Buddy Guy was actually the "turning point" in my musical life. It was a tremendous experience. I toured the world and played on shows with people like Albert King, Albert Collins, Gatemouth Brown, Jr Wells, Dr. John, John Lee Hooker, Carlos Santana, Stevie Ray Vaughn, Ron Wood, and many more of the great names in Music at that time. This forces you to really sharpen your skills and play at a very high level.  We would play night after night for many months at a time sometimes.
All of these things, plus the connections and exposure, and the great learning that it imposes on you, raised me to a different musical level and place. So, it was an invaluable experience. It was great!!!

EM – I feel that play with Buddy Guy it is walk in a minefield. I mean, you always have to pay attention because they change everytime. That is true?
DN - Wow! Great question!!... and very true, very perceptive!! Buddy is a great showman, and as you know, very spontaneous, to say the least! Buddy never prepared set lists, and as I think you know, Buddy sometimes doesn't even play the same song to the end!! So, you had to be paying attention, with extreme focus,... at all times! But this was another part of the great learning experience that it was for me. Spontaneity and thinking on your feet are crucial to improvisational music. So is  this communication and respect for your band members. You're up on that stage working together, supporting  each other, in order to tell a story,.... as a group. So, it was great training!

EM – How many time do you live in Brasil.? What do you think about the country?
DN - I've been living in Sao Paulo on and off for 3 years, but I sometimes stay in Chicago.
 I love the spirit of the people here. When I do a show here, it is more of an interactive experience. The people make part of the show, and I really like that.

EM – Even live in Brasil a few years, you continue to play with USA bluesmen. This is possible because reciprocal exchange between both countrys. Tell me about it.
DN – When blues players from the U.S. come here to do shows, I am often honored to be requested to play the piano with them. I think this is because they know I have 35 years of professional experience with this music, and I also can help to show them around... teach them the culture a little bit, at least from an another Americans perspective. Also, some are already old friends and colleagues from playing in the U.S. I think all of these things  help to make them more comfortable here.

EM – Describe the difference or similarities about brasilians and North-american bluesmen. 
DN – I think that in any kind of music, you bring all of your life experience to your playing. So of course, Brazilians having their own feeling and approach. But that does not mean that their blues playing is any less valid than Americans. For example, nobody would say that George Shearing or Hermeto Pascoal or Oscar Peterson or Michel Petrucianni are NOT great and valid jazz musicians, even though none of them are American.

EM – You have been developing a career in Brasil. How can you see the brasilian blues scene.
DN - I believe the Brazilian Blues scene is growing and developing. It seems to me that years ago blues in Brazil meant only either traditional or blues-rock. But now, I believe the scene is maturing and become richer, with a fuller representation of blues in all of its many styles and forms. Also, sometimes I think that there is an even greater passion for the blues here in Brazil and in South America because it is still being discovered by many new listeners.

EM – Did you played at Igor Prado Band’s CDs and shows as they played in yours. The’re a apositive partnership. Tell me about it.
DN – I first played with Igor at a show in SESC Araraquara in 2004. He was very young at the time, but I perceived very quickly that he and his brother, Yuri, and band ,were something special. Igor has a deep love and understanding of American blues music and I believe that our personal and musical friendship has been good for both of us. As I said on the liner notes of my CD, I don't believe that I could have found a more fitting band for my CD than Igor, Yuri, and Rodrigo, in Chicago or anywhere ... really!
These guys are great young talents that I believe the whole world of blues will know about very soon!

EM – Tell me about your first solo CD. How appear the idea and oportunity to record?
DN – My first "solo" CD was long overdue. I want to give thanks and credit to Chico Blues and Igor for giving me the push and help that I needed to make it a reality. And I have to say, I am really pleased with the result! I couldn't have done it without Chico Blues, Igor Prado, Yuri Prado, Rodrigo Montovani, and Sax Gordon. Their contributions all make the CD the very nice CD it is, if I may say so!

EM – Did you opened the James Wheeler’s gig in Santos with Lately, the song you wrote to your firt solo CD. Tell me about this composition.
DN - Lately is the one original composition on the CD. It's a song that is very personal to me, written from experiences from my own life. I am very critical and demanding of my own songwriting, but I included LATELY because of it's meaning to me, and because I believe it is one of my best compositions,... so far. But, there will be more to come!!

EM – What you love more in Brasil and what you hate more?
DN – I love a lot of things!!.... I love the food, the weather, the nature, the beaches...many things. But as I said before, mostly, I love the spirit and warmth of the people. I love the special, intense connection to the audience that I feel here in Brazil.
 I don't hate anything here...., or anywhere. I just would like to see the country and society here improve so that more people could have a more prosperous, safer and peaceful life.

sábado, 15 de outubro de 2011

You can run but you can't hide: Shirley King segue seu destino dentro do blues

Shirley King - São Bernardo

Texto: Eugênio Martins Jr
Fotos: Gondwana Producciones, Eugênio Martuins Jr

Shirley King e o saxofonista Gerald Noel desembarcaram na madrugada de 23 de agosto em Guarulhos, vindos de dois shows, na Argentina e Uruguai. No Brasil, foram seis apresentações: Bauru, Santos, Sorocaba, Piracicaba, São Bernardo e São Paulo. 
O único ensaio entes das apresentações brasileiras aconteceu no dia 23 no estúdio Cake Walking em São Paulo. Começou tenso. Como lutadores que nunca se enfrentaram, banda e Shirley começaram estudando-se mutuamente. 
Shirley está acostumada a se apresentar fora do circuito blues, por isso, seu repertório usual inclui soul music e alguns funks. Mas não era isso que a gente queria. Quando fechamos o show, o combinado era injetar blues na veia. Não se tratava de um problema real, foi mais uma falta de sintonia fina. Sem nenhuma objeção a moça topou montar o repertório em cima de temas de blues conhecidos por ela e já ensaiados pela banda.
Tema após tema, Ivan Márcio, Giba, Julio, Wagner, Gerald e Shirley começaram a se entender e se soltar. No final da noite, o som alto do bom e velho blues soou nos amplificadores e todo mundo ficou numa boa. 
No repertório, Next Time You See Me e Crossroads (abertura com a banda de Ivan Márcio); Futher Up Down the Road e Shotgun (Gerald Noel); e Thrill Is Gone, Let the Good Times Roll, Mustang Sally, Hoochie Coochie Woman, Sweet Home Chicago, Proud Mary, Wang Dang Doodle, Rock Me Baby e outras. 
Shirley e Gerald ficaram 12 dias no Brasil, quatro deles em Santos, quando ambos tiveram a oportunidade de conhecer um pouco a cidade, pelo menos o bairro do Gonzaga, onde ficaram hospedados, e a orla da praia, lugar de vários passeios. 
Para alguns, ser filha de um dos maiores nomes do Blues não a habilita a ser uma grande artista. A rigor, a afirmação é verdadeira. Para muitos, principalmente as pessoas que foram aos shows, Shirley provou ter herdado um pouco do talento do pai, como cantora e como entretainer. Sua voz é forte e quando sobe no palco, àquela senhora de 62 anos sabe como agradar. Ela mexe com o público o tempo inteiro e instiga a banda dar o melhor de si. 
Essa entrevista foi realizada em um dos dias em que Shirley esteve em Santos. Frente à frente com a filha do blues.
O giro de Shirley foi uma parceria entre o Mannish Blog, Lucas Shows e Eventos e Ivan Márcio Blues Band. Em Santos a co-produção foi de Cássio Laranja.
Os agradecimentos vão para Dayse Marchiori, Mendes Hotéis, TVB Litoral, Studio A, Gondwana Producciones e restaurante Kenzo pelo ótimo jantar oferecido à artista.


Shirley King - Sorocaba

Eugênio Martins Júnior – Você começou a carreira de cantora de blues profissional aos 40 anos. Porque demorou tanto tempo? 
Shirley King – Não comecei minha carreira de cantora aos 40, comecei a cantar aos três anos. Só não tentei fazer dinheiro cantando até os 40 porque tinha uma frustração com relação a isso. Como dançarina tinha mais controle da minha carreira e das coisas que fazia e não precisava me envolver com agentes, promotores e esse tipo de pessoas. Também odiava o blues porque ele afastou o meu pai, então nunca me vi como cantora profissional de blues. Então, quando completei 40 anos e abandonei a dança fiquei sem ter o que fazer. Tive de entrar no show business e o blues era o caminho mais fácil.  

EM – Você disse que odiava o blues porque achava ele havia afastado o seu pai da família. Quando foi que mudou de idéia?
SK – Acho que tenho um caso de amor e ódio em relação ao blues. O estilo de vida me afetou muito, mas quando passei a me apresentar em diferentes clubes e comecei a perceber como as pessoas que curtem blues são diferentes, pude ver como elas amam o blues. O que eu mais queria era ser aceita e amada, então quando percebi que essa música pode fazer as pessoas se divertirem ou até mesmo ser usada para esquecer os problemas, vi sua real importância. Passei a levá-lo mais a sério quando passei a cantar na escola para as crianças. Agora ensino às crianças a não odiarem o blues, assim como eu fazia quando era jovem. Quando comecei a ensinar sobre o blues nas escolas, isso mudou completamente minha forma de vê-lo, porque encontrei as formas de entender e conhecer mais sobre as pessoas envolvidas com ele e sua história.

EM - Você nasceu perto de Memphis e agora mora em Chicago. São duas cidades chaves para a música norte-americana. Gostaria que falasse sobre essas diferenças musicais.
SK – Na verdade nasci em Arkansas, mas cresci em Memphis com meu pai. A diferença é que o blues de Chicago é mais tradicional, com baixo, bateria, guitarra e harmônica, ou uma segunda guitarra. Às vezes um teclado. O blues de Memphis sempre pede o som de big bands e sempre inclui uma seção rítmica com metais. É mais jump ou be bop blues, mais contador de histórias. O blues de Chicago é “Got My Mojo Working”. É tradicional, como nos campos e nas juke joints. Diferente do que o meu pai fazia quando ficou conhecido, contando os altos e baixos da vida. 
Pra mim o Chicago blues é mais alegre comparado com o que é feito em Memphis, traz aquela sensação de diversão, não é como aquelas histórias de The Thrill is Gone ou Sweet Little Angel.          

EM - Quando está no palco mostra a mesma empatia pelo público que o velho B.B. No campo musical o que mais B.B. King influenciou na sua música?
SK – Estar sempre perto de meu pai ajudou bastante, mas vi que ele fazia as pessoas amá-lo porque agia como se elas fossem seus melhores amigos. Elas se sentiam tocadas pessoalmente. Também acho que o fato de ter sido dançarina e feito as pessoas dançarem comigo ajudou. Sempre agi assim quando era dançarina. Não sei por que eu e meu pai temos tantos traços artísticos semelhantes, mas acontece desse jeito. Eu não fico sentada assistindo o que ele faz no palco para depois copiar. Às vezes eu vejo meu pai e vejo que ele está fazendo o que eu já havia feito. (risos). Não sei, talvez seja alguma conexão espiritual. Ou simplesmente herdei esse jeito por estar sempre por perto dele assistindo seus shows.


Teatro Municipal Brás Cubas - Santos

EM- Seguindo a pergunta interior, no campo musical, qual foi a principal lição que aprendeu com B.B. King? De onde vêm suas principais influências?
SK – Essa é uma pergunta que sempre me fazem. Em grande parte sempre me ajudou. Por outro lado eu sou a “filha de B.B. King”. Não sou a Shirley King. Essa é parte ruim, porque as pessoas passam a não reconhecer o meu talento. Principalmente quando faço alguma coisa igual a ele. Todos os dias tento fazer as coisas diferentes do meu pai para que não haja comparação. Eu não toco guitarra, digo às pessoas que eu balanço os quadris. Em outras palavras, não sou uma instrumentista, sou uma entretainer. Gosto de estar no controle no palco.

EM - Até que ponto ser filha do rei do blues atrapalha e até que ponto ajuda?
SK – Sempre andei com meu pai e percebi que quando ele andava pela cidade as pessoas o colocavam em um pedestal.
As pessoas às vezes me usam por causa disso. Quero apenas que elas me aceitem por mim, mas nem sempre acontece. Nunca o aborreci para estar no show, as pessoas vivem me perguntando isso, mas eu digo que a coisa tem de ser natural, pra mim está tudo bem.
Não sei, parece que com o passar do tempo ele queria ver o que eu havia aprendido com os anos e eu mostrei que estava totalmente à vontade.

EM - Você já subiu ao palco com seu pai?
SK - Nesse ano meu pai me chamou ao palco mais do que em todos os outros anos. Em janeiro eu estava em um show quando ele me chamou ao palco e disse para as pessoas pegarem suas câmeras, seus gravadores e disse que estávamos a ponto de fazer história. Ele me apresentou como sua filha e cantamos um blues. Fiquei muito nervosa, porque não estava preparada, mas cantei.
Na noite seguinte subi ao palco e tive uma lição de como não roubar o show de outro artista. As pessoas pediram para eu cantar um número a mais e eu disse sim. E ele me disse para não tomar conta do show. Eu disse: “Ok é o seu show”. E ele me disse: “Então não faça isso, ok?”. Eu disse: “Ok Sr.” (risos).
Em março ele me chamou e foi bem diferente de janeiro. Dessa vez eu estava calma e nós cantamos: “You Are My Sunshine, My Only Sunshine”. Adoramos esse momento, ele me deu o microfone e eu fiquei lá ouvindo os aplausos e dessa vez não houve problema, porque fiz o que ele disse.

EM – Demorou quanto tempo para isso acontecer?
SK – Acho que ele me chamou umas cinco ou seis vezes. Na primeira vez ele veio ao meu show. Ele me disse que as pessoas poderiam me usar para atraí-lo aos meus shows e tocar de graça e os empresários não gostam disso. Se eles pagam centenas de milhares de dólares para você e outros o têm de graça. Então apareceu por alguns momentos, porque não queria ferir meus sentimentos. Enfim, ele apareceu uma noite e eu te digo, o que ele disse que ia acontecer, aconteceu. Eu estava cantando e ele andou em direção ao palco e as pessoas começaram a gritar. Eu disse: “Uau, o que eu fiz?”. Mas eles não gritavam por minha causa, eu não havia visto que ele estava atrás de mim. Em outra ocasião ele disse que não apareceria, porque não estava sendo pago para estar no festival, mas para não me deixar chateada ele apareceu. Mais uma vez eu estava no palco e a audiência estava sentada. Quando ele entrou pela porta eu passei a cantar para as poltronas. Todos desapareceram.
Em outras palavras, meu pai é da escola antiga, ele gosta de ir direto ao ponto. Ele não gosta de falar as coisas e você não acreditar. Ele gosta de mostrar para você acreditar. Ele estava tentando me mostrar que é uma grande pessoa.


The Orleans - São Paulo

EM - Quando recebi seu repertório para planejar a turnê brasileira havia muitas músicas de soul e funk e poucos blues. Porque essa escolha?
SK – Bem, a primeira vez que escolhi com o líder de minha banda, o guitarrista Glen Nelson, as músicas que cantaria em Chicago, eu não atuava só em clubes de blues. Não tínhamos de tocar blues todas as noites. As cenas são distintas, mas no South Side de Chicago não tocamos apenas aquele estilo de blues. No East Side idem. Então, quando enviei pra você o primeiro set list achava que as pessoas gostariam que eu misturasse as músicas e não quisesse ouvir só blues todas as noites.

EM - Seus CDs são dos anos 90. Porque passar tanto tempo sem gravar? Não sente necessidade de apresentar um novo trabalho?
SK – O que aconteceu quando fiz o CD The Daughter of the Blues, foi que uma jovem veio até mim com muito dinheiro após me ouvir cantar. Ela era cantora profissional em Las Vegas e ficou impressionada ao me ouvir e quis gravar imediatamente. Então, ela criou o CD e um selo de gravação para mim. Tudo estava bem até ela querer... a mim. Mas eu não estou nessa. Pra mim é puramente negócio.
Então deixei tudo para traz, o selo, a gravação e tudo o que havia realizado. Não queria contrariar, mas quando as pessoas ganham dinheiro por você, você faz o que elas querem e foi isso que aconteceu. Depois de um tempo conheci um produtor em Toledo, Ohio, e estávamos trabalhando em um CD que seria lançado em outubro de 2009. Fui diagnosticada com câncer em abril do mesmo ano. O médico me disse que se eu continuasse a trabalhar e subir aos palcos não poderia me ajudar. Tive de parar de trabalhar no CD e tudo mais para me submeter a uma cirurgia e depois a sessões de quimioterapia. Então tive de parar e o CD nunca foi lançado.

Shirley King, Gerald Noel, Ivan Márcio Blues band em ação - São Bernardo

EM – Você me disse que tem um trabalho inacabado e que faltam apenas duas canções para colocar.
SK – Estou parada com esse projeto porque o produtor e meus dois compositores preferidos não se dão bem. O produtor não quer trabalhar com os compositores e vice versa. Mas o produtor é o fator principal na gravação. Tive de começar novamente em Shelter in the Storm estão tentando me ajudar. Tenho outras canções, Agravation que é do CD The Daughter of the Blues, e It Ain’t Easy Bein’ a Diva, escrita por mim e por meu baixista, sei que é uma grande canção por que todos me pedem para cantar.

EM - Você tem tocado no Brasil com a banda de Ivan Márcio, o que achou deles? Quero dizer, você nem os conhecia, houve apenas um ensaio antes de pegar estrada. Com está sendo esse entrosamento?
SK – Costumo ir sempre à Itália e a banda é de lá, vou à Argentina e a banda é de lá. Não sou o tipo de pessoas que por ser a cantora tenho que ficar acima da banda. Tento fazê-los tocar o melhor que podem. Não são músicos de Chicago, mas respeitam nossa música.  Eles estudam, aprendem e tentam tocar bem para mim. E eu tento não deixá-los constrangidos quando as coisas não saem bem. Não canto para a banda, canto para a audiência e ela sabe que pequenos erros ocorrem e isso não é nada demais. Procuramos tocar as músicas de forma diferente, todo mundo faz isso.

Ivan Márcio e Giba Byblos

EM – É a sua primeira vez no Brasil e você viajou por várias cidades do estado de São Paulo. Tirando o cansaço por estar na estrada, o que tirou dessas viagens?
SK – São tão poucas as coisas que vi por aqui e não gostei. As pessoas me trataram tão naturalmente, exceto pelo fato de não falarem a minha língua. Passei um tempo muito bom, as pessoas foram cuidadosas. Não são estressadas, são relaxadas. Quando fui à praia e me sentei em frente ao mar, uma das coisas que passou pela minha cabeça foi: ”O meu deus, como deve ser bom morar em frente à praia”. (risos)
Todas as coisas que vi aqui, a praia, as montanhas, me relaxaram muito porque eu sou de Chicago, uma cidade grande. Andei hoje pelas ruas em volta ao hotel e as pessoas que encontrei não falavam minha língua, mas tentavam responder. Fui a uma loja de discos e a um café e eles tentaram me ajudar o máximo que puderam. Então não é tão ruim mesmo não entendendo a língua e sendo uma pessoa falante como eu. Um dos melhores momentos foi quando fui ao Bourbon Street. Adorei aquele clube e eles me trataram muito bem porque meu pai inspirou aquelas pessoas. Na noite passada também foi muito bom, fomos a um restaurante japonês onde a comida era ótima. Há muitas coisas pra fazer aqui. Ao mesmo tempo em que tive a oportunidade de entreter as pessoas, tive a oportunidade de conhecer sua cidade. Voltei da praia ontem e as pessoas me paravam na rua pra tirar fotos, até as crianças.  
   
EM – Notei que você ouviu algumas músicas brasileiras nos ambientes que freqüentou e ficou bem ligada nela. O que você conhece da música brasileira?
SK – No dia do nosso ensaio ouvi uma banda de jovens no estúdio que chamou minha atenção, fui até tirar fotos com eles. (a banda Conex). Ouvi um pouco de Bossa Nova e Samba. Quando fiquei sabendo que ia fazer alguns shows por aqui, entrei na internet para me informar sobre o público, sobre a música brasileira, procurei conhecer alguns artistas. Tentei aprender sobre a audiência a qual iria a trabalhar. Percebi que os brasileiros curtiam a música, cantavam juntos, adoravam o show, mas não aplaudiam. (risos). Quando vi isso pensei: “Oh, oh!”. 
Isso é o meu termômetro. Então, quando fizemos o primeiro shows (em Bauru) as pessoas estavam enlouquecidas e eu pensei: “Que porra era aquela que eu vi na internet? Olhem essas pessoas. Dançando e subindo no palco”. Não esperava uma reação daquelas logo no primeiro show. E depois desse foram todos iguais. Eles não queriam me deixar ir embora. E quanto mais as pessoas ficam excitadas nos meus shows, elas me deixam mais excitada também.  

EM – Ontem no jantar você estava me falando das suas influências. E entre elas estava a dançarina Josephine Baker. Gostaria que falasse um pouco sobre isso.
SK – Josephine Baker era uma dançarina muito famosa. Etta James não era uma dançarina, mas ela era uma cantora muito boa e também é uma de minhas influências. Ela pode cantar diferentes estilos como blues, country, jazz, R&B. Eu gostaria de ser uma versão das duas coisas, gosto de fazer tudo no show, como Take 6 que assisti aqui no Brasil, eles colocam Gospel, Hip Hop, Michael Jackson. As pessoas não gostam de um só estilo de música, todos amam todos os tipos de música. Então, Etta James tem esse seu estilo. Koko Taylor é uma cantora de blues tradicional, do mais puro Chicago Blues. Me identifico com Josephine porque eu mesma era uma dançarina. Não consigo apenas ficar em pé no palco e cantar. Não é assim que acontece. 
Ruth Brown me ensinou muito sobre como ter classe. Ela conversava comigo sobre os dias de glamour de Diana Ross, porque elas eram muito próximas. Ela era uma mulher muito elegante e cuidadosa com os detalhes. Aprendi com ela como me comportar no palco. Você sabe, as pessoas querem ver isso. Se você for ver no passado as mulheres que subiam ao palco estavam sempre elegantes.


The Orleans - São Paulo

EM – Quais as cantoras de hoje que você curte?
SK – Para ser honesta com você, aprecio novos talentos que se inspiraram nas mais velhas, como Tina Turner, Madona e Aretha Franklin. Que não esqueceram essas influências.
Agora, pessoas como Lady Gaga. Não sei. Não me inspira a fazer algumas coisa, não vou ser uma Lady Gaga de 60 anos. As coisas que ela faz nos shows são criativas, mas parece que as pessoas assistem seu show mais para ver essas coisas do que a para ouvi-la. Admiro Beyoncé, duas ou três mais. Essa geração está tentando fazer sua música, mas muito do que elas fazem remete às cantoras antes delas. Beyoncé foi colocada em um filme, mas o que ela sabia sobre a Chess? (N.R. Shirley se refere ao filme Cadillac Records, o qual Beyoncé interpreta Etta James).

EM – Ontem recebemos a notícia sobre a morte de Honeyboy Edwards. Gostaria que você falasse um pouco sobre ele.
SK – Todos os anos eu era convidada para uma festa de fim de ano em um clube em Chicago. Com álcool grátis e toda a família de Chicago. E o que acontecia era que tocávamos o blues tradicional e Honeyboy sempre estava lá. Foi quando o conheci pessoalmente. Até então só havia ouvido falar dele. Na comunidade do Blues de Chicago, todos se conhecem. Todos iam lá, Billy Branch, Big Time Sarah, Zora Young, Eddie Shaw, Eddy Clearwater, Lonnie Brooks, Buddy Guy. Todos eles vivem em Chicago. Tenho algumas fotos com Honeyboy. Ele era uma verdadeira lenda porque foi contemporâneo e amigo de Robert Johnson. Ele Robert Lockwood Jr e meu primo Booker (Bukka White) eram da mesma região. Meu pai é da geração após essa.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Eric Clapton encerra turnê brasileira com show de blues


Texto: Eugênio Martins Jr
Foto: Dayse Marchiori

Depois de tantos anos de estrada, o guitarista britânico Eric Clapton atingiu um status como poucos artistas no mundo. O cara faz o que quer, grava com quem quer a hora que bem entende.   
A introdução tem a intenção de justificar a atitude de Clapton de não abrir a boca para se comunicar com o público que foi ao Morumbi no dia 12 de outubro, último show da turnê brasileira daquele que é considerado o deus da guitarra. E também para justificar o repertório calcado em velhos blues e músicas antigas repassadas com muita competência por Clapton e sua banda, em 1h40 de show. São Pedro ajudou.
É certo que Clapton nunca foi muito chegado a arroubos de afetividade, mas após tantos anos sem mostrar a cara no Brasil não custava um pouco mais de empatia. Ele já havia dito que não excursionaria fora dos Estados Unidos e Europa, mas a crise econômica tá brava lá pra cima e isso deve ter influenciado a sua decisão de atravessar a linha do Equador rumo ao sul. 
Paciência, se não teve conversa fiada, o show compensou. Calcado em velhos blues e composições próprias, Clapton mostrou que sua Fender Stratocaster continua afiada.   
Key to the Highway abriu o espetáculo seguida por outros clássicos da música negra dos Estados Unidos, entre elas Hoochie Coochie Man, de Willie Dixon, conhecida na versão de Muddy Waters; Driftin' Blues, standard de 1945 de Johnny Moore's Three Blazers; Nobody Knows When You're Down And Out, de Bessie Smith; Before You Accuse Me, de Bo Diddley; e duas de Robert Johnson, inspirador da carreira de Clapton e de tantos outros guitarristas: Little Queen of Spades e Crossroads. Essa última com direito à participação do novato Gary Clark Jr, competente guitarrista do Texas.
De sua lavra, Tell the Truth que não constou no set list dos outros dois shows, em Porto Alegre e Rio de Janeiro, Wonderful Tonight, Tearing Us Apart, Lay Down Sally e Badge (emocionante) e a mais recente When Somebody Thinks You’re Wonderful, do disco Clapton, lançado ano passado. Layla apareceu em uma versão bluesy de arrepiar os cabelos da nuca (das meninas, é claro) e... Cocaine. Tema composto por J.J. Cale e registrada em vinil por Clapton que levantou o estádio.
A cozinha foi composta pelos fiéis Steve Gadd (bateria) e Willie Weeks (baixo), e nos teclados seu velho amigo Chris Stainton e também Tim Carmon. Duas maravilhosas backing vocals completaram o time, Michele John e Sharon White.