Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Eugênio e Cezar Fernandes
Duke Robillard parece aquele tio que fica tomando goró na padaria falando sobre futebol com os aposentados. Só que ele nasceu nos Estados Unidos e com uma guitarra em punho. E tio Duke tem muita história pra contar. É guitarrista, bandleader, compositor, cantor, produtor, ganhador do prêmio Grammy e outros voltados exclusivamente ao blues.
Além disso, poucos podem dizer que sua
lista de parcerias inclui Bob Dylan, Tom Waits, Jay McShann, The Fabulous
Thunderbirds, John Hammond, Jimmy Witherspoon, Dr. John, Maria Muldaur e
Roomful of Blues. Só para ficar nos mais famosos.
A guitarra do tio Duke é elegante.
Suas cordas vibram fazendo com que as notas cheguem com leveza aos ouvidos. É
de arrepiar. Mas quando quer, Duke rasga o couro com os dentes, como diria o
Frejat.
Não bastasse tudo isso, Duke Robillard
é uma enciclopédia de ritmos. Sua carreira mostra. Desde a fundação do grupo Roomful
of Blues, em 1967, ou substituindo Jimmie Vaughan no Fabulous Thunderbirds, em
1990, sua carreira solo é recheada de discos de rockabilly, jazz, rock and roll
e rhytmn and blues.
Em mais de 40 anos de carreira, gravou
discos diferentes e arrebatadores: You Got Me, After Hours Swing Sessions,
Dangerous Place, Strechin’ Out, Conversation in A Swing Guitar, Groove a rama
são alguns.
Estive com Duke em Rio das Ostras esse
ano. Encontrei-o sentado em uma cadeira de vime apanhando um sol e matando o
tempo na beira da piscina do hotel onde imprensa e músicos se hospedam por
conta do grande festival.
Tímido como sol daquele
dia, Duke não é de falar muito. Pelo menos com estranhos. Depois de dois dias
se cruzando pelo festival e que tive de ajudar o Jefferson Gonçalves proteger o
órgão Hammond que estava apanhando uma chuva desgraçada no palco São Pedro
durante o seu show (ver foto), Duke se mostrou um coroa bem legal. Como aqueles
tios aposentados que ficam falando de futebol no bar da esquina.
Eugênio
Martins Júnior – Quando foi a primeira vez que ouviu blues?
Duke
Robillard –
Provavelmente tinha dez anos de idade. Ouvi em um lado b do Chuck Berry, em um
45 rpm. Uma delas era Wee Wee Hours,
um slow blues. Foi o primeiro blues de verdade que eu escutei. E eu amei aquilo.
EM – E quando a guitarra apareceu em sua vida?
DR
–
Desde cedo decidi que iria me tornar um guitarrista. Acho que com seis anos,
mas meus pais não me deram uma guitarra. Aprendi a tocar sozinho em um instrumento
que era do meu irmão. Vendo o seu jeito de tocar.
EM – Você tem um estilo muito elegante. Qual era a sua principal influência nessa época?
DR
–
Foi Hubert Sumlin, da banda de Howlin’ Wolf e Matt Guitar Murphy, da banda de
Memphis Slim. E mais tarde todas as pessoas sofreram a influência de Muddy
Waters, B.B. King e T Bone Walker.
EM – Roomful of Blues foi uma banda importante na cena blueseira. Fale sobre a fundação do grupo e seus anos na banda.
DR – Eu comecei na banda em 1967. A primeira
formação era básica, guitarra, piano, bateria e harmônica às vezes. Concentrávamos
no Chicago Blues. Alguns anos depois descobrimos o Rhytmn Blues dos anos 40 e
nos apaixonamos. Então adcionamos os metais no começo dos anos 70. Fiquei na
banda 12 anos, mas saí em 1979 para fazer carreira solo.
DR
–
Gosto de todas as variedades de blues, jazz, a origem do rock and roll e até as
formas mais primitivas de country music. Todos os estilos de música são
relativos ao blues. E todos eles me ajudam a construir o que eu faço.
EM – Como o Brasil, os Estados Unidos têm muitos ritmos e gênero musicais. Você conhece algum gênero musical brasileiro?
DR
–
Não conheço os ritmos populares do Brasil. Conheço o jazz dos anos 60, Jobim e
pessoas como ele. Gostaria de aprender mais sobre isso. Estive por aqui três ou
quatro vezes, mas nunca fui muito exposto. Toquei no Brasil em um festival e em
alguns clubes. Em São Paulo toquei em um clube que parece New Orleans.
EM – Você vinha, tocava e ia embora?
DR – Toquei uma vez no Rio de Janeiro e eles não me
deixavam sair do hotel porque diziam que era muito perigoso. E em São Paulo
também.
EM
– Mas nem é tanto assim, a ponto de não poder sair do hotel.
DR
-
Isso faz 15 ou 20 anos atrás, talvez naquela época as coisas eram piores.
Gostaria de mencionar que estou produzindo um guitarrista de blues brasileiro
pelo meu selo. Talvez até o final desse verão. Ele se chama Nuno Mindelis.
Tenho sociedade em dois novos selos, um de jazz e outro de blues de raiz e
vamos gravar o Nuno nesse selo de blues.
EM
– Como surgiu essa parceria?
DR
–
Meu sócio já havia se envolvido com o Nuno em outras gravações e me convidou
pra produzi-lo dessa vez.
EM
– Você já conhecia o Nuno? O que achou de seu estilo?
DR
–
Sim, tenho alguns de seus CDs. Acho um ótimo guitarrista.
EM
– Você tocou com Big Joe Turner que era um grande compositor. Ele escreveu Shake Rattle and Roll, Corrine Corrina, Honey Rush e outras. Na minha humilde opinião, ele nunca teve o
reconhecimento merecido, talvez por ser muito velho, muito preto e muito
grande. Você concorda?
DR
– No
tempo do rock and roll ele chegou tarde. Mas acho que as suas gravações foram
populares. É claro que Bill Haley, por ser branco, ganhou mais atenção com
Shake Rattle and Roll. Provavelmente também era muito mais jovem do que Joe
Turner. Mas acho que ele teve o seu reconhecimento. As pessoas que tocam blues
nos Estados Unidos não eram muito reconhecidas até B.B. King se tornar um dos
maiores. Eles nunca tocaram para grandes audiências até alguns começarem a
produzir hits e os guitarristas britânicos começarem aclamar caras como Buddy
Guy e B.B. King. Isso fez toda a diferença em suas carreiras.
EM – Gosto de fazer essa pergunta para diferentes músicos de blues. Uma vez o Rod Piazza me disse que o blues é a música do banco de trás (back seat music). Você concorda?
DR
–
(risos) Acho que sim. Como no jazz, você não pode esperar ficar rico tocando
blues porque isso não vai acontecer.
EM – Fale um pouco sobre essa banda que o acompanha.
DR
–
São quatro músicos, Bruce Bears no piano e orgão, Mark Teixeira na bateria e Brad
Hallen no baixo. Realmente acho que é a melhor banda que já tive. Tocamos muito
bem juntos. Eles são músicos completos em jazz, blues e outros gêneros. São
muito versáteis.
EM – Qual é a importância do blues para a cultura-norte americana?
DR
–
É a música que fala da vida das pessoas, mas apesar disso, uma minoria escuta
blues. Mas é o suficiente para nos manter viajando e tocando pelo país e pelo
mundo. Sempre foi assim. Talvez ele tenha sido popular por um tempo. Mas dá
para nos manter vivos, tocando em clubes pequenos e às vezes em clubes grandes.
Acho que concordo com o Rod Piazza (risos).
DR – Realmente foi, mas não é mais. Da década de 70
para trás, até o começo do século. Nos anos 80 a música popular começou a mudar
e não e passou a não ter mais a influência do blues. Não sei de onde vem, mas
não é do blues.
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