Meu pai só trabalhava
E eu nem o via
Mas a minha mãe estava sempre ali
Velhos tempos em Santos
Não era só praia,
Havia o lado escuro que você tinha de ir
Os garotos da minha rua
Perdidos nos anos 80
Não pensavam no futuro
Era só diversão
E a dona Nazareth e sua fé
Ao caminho da igreja
Enquanto seu filho aprontava
E ficava famoso na vizinhança
Nunca perca a esperança
Há mais de um caminho para casa
A vida na estrada é sempre dura
Seja certa ou seja errada
Desde muito cedo
eu fui trabalhar
Depois de escola eu não tive escolha
Sentindo na pele o peso
da desigualdade
Conheci uma garota
que me fez pensar
E o tempo que eu passava na rua
Não fazia mais sentido
Uma criança estava chegando
E eu estava com medo
Passei muito tempo jogando conversa fora
Mas vi a verdade
E fiz minha escolha
Parei coma loucuras e as fissuras
E segui em frente
Nunca perca a tua esperança
Há mais de um caminho para casa
A vida na estrada é muito dura
Seja certa ou seja errada
Solo flow de guitarra
Nunca perca a esperança
Há mais de um caminho para casa
A vida na estrada é... sempre dura
Seja certa ou seja errada
Nunca perca a esperança
Há mais de um caminho para casa
A vida na estrada é... sempre dura
Seja certa ou seja errada
sexta-feira, 29 de maio de 2020
Um blues pra estrada
Ouvi muita mulher chorar
Agora estou sozinho
Tô pagando a conta
Do blues no caminho
Já dormi na rua
Arrumei confusão
Já quebrei a cara
Já tive ilusão
Já fumei maconha
Já usei pó
Já tomei birita
Já cheirei loló
Já quebrei a banca
E ganhei dinheiro
Já devi pro banco
Chorei no banheiro
Já nadei no mar
Já peguei estrada
Já fiz cerveja
Varei madrugada
Fui sacaneado
Já tomei geral
Apanhei na cara
É, já me dei mal
Eu já vi o Cazuza
Eu já vi o Melô
Eu já vi o Raul
Cantando o amor
Já vi o por do sol
Já vi um bebê nascer
Já vi tanta coisa
Você pode crer
Já rezei na privada
Isso eu admito
Mas nunca chamei
Um canalha de mito
segunda-feira, 18 de maio de 2020
Morre Lucky Peterson aos 56 anos em Dallas
A família de Lucky Peterson anunciou nesta manhã que o cantor, guitarrista e tecladista morreu ontem após dar entrada em um hospital em Dallas, Texas. A causa da morte não foi divulgada.
Judge Kenneth Peterson foi filho de um dos mais importantes blueseiros de Buffalo, no estado de New York, James Peterson, que por sua vez, era filho de um dono de uma concorrida jukejoint no Alabama.
Peterson especializou-se no órgão Hammond B3 e na guitarra e aos 17 anos já integrava a banda de Little Milton e depois a de Bobby “Blue” Bland, dois grandes nomes do blues.
Nessa época conheceu o produtor Bob Greenlee que o levou à Alligator Records para gravar os excelentes Lucky Strikes! e Triple Play.
Nunca mais parou de gravar discos acima da média e hoje é aclamado como um dos grandes do blues. Em 2017 gravou o excepcional Tribute to Jimmy Smith, homenagem ao seu ídolo e mentor.
Em junho de 2019 Lucky Peterson e sua esposa, Tamara, se apresentaram no festival de Rio das Ostras (RJ) que voltou com força total.
Ainda no final de 2019 Peterson lançou um ótimo álbum comemorando meio século no blues, 50 – Just Warming Up! Ironicamente foi seu último trabalho.
Tamara emitiu um comunicado agradecendo as condolências vindas de todas as partes do mundo: “Obrigado por seu derramamento de amor, pelas fervorosas orações, por todas as chamadas, textos e postagens nas mídias sociais. Sentimos sua presença e agradecemos todo o seu apoio durante este período difícil. Lucky ficaria impressionado com a demonstração de amor e afirmações positivas dadas em homenagem a ele.
E ainda citou a comunidade blueseira: “À nossa extensa comunidade de músicos, artistas e aqueles que nos adotaram como família OBRIGADO! Nossas vidas foram tremendamente abençoadas durante essa jornada musical; há tantos que conhecemos e nos abraçaram ao longo do caminho”.
sexta-feira, 1 de maio de 2020
Piedmont Bluz Acoustic Duo carrega um século de tradição da música norte-americana
Texto: Eugênio Martins Jr
Foto: Bibiana Huang Matheis
Valerie e Benedict Turner compôem o Piedmont Bluz Acoustic Duo que, como o nome diz, é uma dupla dedicada a uma vertente do blues tradicional chamado Piedmont Style.
Ambos fogem do esteriótipo do blueseiro tradicional, são graduados em universidades e atuam em outras áreas além da música. Portanto, a dupla que nasceu em Nova York está nessa pelo amor às tradições musicais afro-americanas.
Esse estilo musical nasceu no sudeste do país, na região que compreende as Virgínias e a Georgia e cresceu juntinho ao seu irmão mais conhecido, o Mississippi Delta Blues, que por sua vez deu origem ao estridente Chicago Blues.
O Piedmont Style, continuou no campo por muito tempo e mesmo quando chegou nas grandes cidades da costa leste norte americana, não passou por grandes modificações.
Valerie e Benedict são cultivadores ativos dessas raízes musicais, tanto nos instrumentos acústicos tradicionais que usam, quanto na própria forma de tocar.
Valerie reproduz a forma de tocar dos gênios Blind Blake, Blind Boy Fuller, Blind Willie McTell, Mississippi John Hurt. Ben cuida da sua percussão com instrumentos artesanais, a washboard e artefatos de madeira e ossos, além da harmônica.
Atuam em festivais e possuem projetos educacionais que promovem o Piedmont blues com oficinas e publicações que levam conhecimento às novas gerações.
Gravaram dois CDs excepcionais, verdadeiros mapeamentos do blues tradicional do começo do século passado. Ambos podem ser encontrados nas mídias física e digital, são eles: Ambassadors of Country Blues, com Avalon Blues (Mississippi John Hurt), Statesboro Blues (Blind Willie McTell), Canned Heat (Tommy Johnson), Whistli’n Blues (Gary Davis), Old Freight Train (Elizabeth Cotten), When The Levee Breaks (Kansas Joe McCoy), Last Kind Words (Geeshie Wiley) e a tradicional CC Rider (gravada por inúmeros artistas ao longo do século 20).
E Country Blues Selections, com Fishin’ Blues (gravada pela primeira vez por Henry Thomas), That’s No Way To Get Along (Robert Wilkins), Future Blues (Willie Lee Brown), Louis Collins (Mississippi John Hurt), Big Road Blues (Tommy Johnson), Trouble I’ve Had it All My Days (Mississippi John Hurt), Turn Your Money Green (Furry Lewis), Drunken Barrelhouse (Memphis Minnie), Guitar Rag (Sylvester Weaver e Sara Martin).
Eugênio Martins Júnior – Me fale sobre a sua infância. Você nasceu em New York, mas tem raízes no sul. Podereia falar sobre isso?
Valerie Turner – A família do meu pai é da Georgia e a família da minha mãe é da Virgínia. Tendo estado lá por muitas gerações, eles têm raízes profundas no sul. No entanto, durante a Grande Migração, quando milhões de pessoas se mudaram das cidades do sul para as cidades do norte e oeste para ter uma chance de vida melhor, meus pais acabaram na cidade de Nova York. Nasci em Nova York e morei aqui a vida toda.
EM – E quando foi que você decidiu que ia ser portadora dessa tradição musical importante como o country blues?
VT – Tive a sorte de ter um mentor maravilhoso chamado John Cephas. Ele era um músico de country blues de Washington D.C. e me ensinou muito sobre a música que fazia. Mais importante, ele me passou um profundo apreço pelas tradições. John pediu a todos os seus alunos que continuassem com as tradições musicais e, quando ele faleceu, decidi manter essa promessa realizando e ensinando outras pessoas. Eu e meu marido, Benedict Turner, publicamos um livro, "Noções básicas de guitarra de blues no estilo do Piedmont", que fornece instruções sobre o estilo de digitação no Piedmont, e está disponível em nosso site, www.piedmontbluz.com. A Biblioteca do Congresso em Washington DC adquiriu nosso livro e temos o prazer de saber que conseguimos contribuir dessa maneira.
EM – Gostaria que você falasse um pouco sobre o seu estilo de tocar a guitarra de aço. Para nós aqui no Brasil um instrumento mutio peculiar.
VT - O violão que eu toco, que é uma liga de zinco, níquel e bronze, não tem nada a ver com o meu estilo de tocar. Toco exatamente da mesma maneira em uma guitarra de madeira, e na verdade prefiro guitarras de madeira. Uso uma guitarra de metal porque dá um bom volume. Além disso, como não tem muita madeira, exceto no braço, não é afetada pela umidade e isso faz com que se comporte de maneira mais consistente, independentemente do ambiente. Entendo que é um instrumento incomum no Brasil, mas é amplamente utilizado nos Estados Unidos. Debaixo da placa circular, onde você normalmente vê uma cavidade sonora, existe um cone de metal que amplifica o som naturalmente. Alguns músicos de blues antigos usavam esse tipo de guitarra por duas particularidades, a de ser ouvida acima dos outros instrumentos e também do barulho produzido dentro das juke joints.
EM – Ben nasceu em Trinidad. Quando foi para os Estados Unidos? Podemos ouvir ecos caribenhos em sua formação musical?
VT - Benedict nasceu em Trinidad e Tobago, uma ilha do Caribe ao norte da América do Sul. Sua família chegou aos Estados Unidos quando ele tinha oito anos e viveu na cidade de Nova York a maior parte do tempo. Como designer gráfico, suas habilidades criativas permitiram que ele criasse nosso logotipo, CDs, livros e infinitos materiais de marketing. O tambor de aço (steel drum), instrumento inventado durante o século XX, foi criado em sua cidade natal, Port of Spain, e esses ritmos certamente influenciam suas escolhas quando me acompanha. Quando formamos nossa dupla, ele se direcionou à percussão e escolheu a washboard como seu principal instrumento. Ele também toca instrumentos artesanais de ossos, madeira e harmônica. Suas influências na washboard incluem a Washboard Chaz, de Nova Orleans, e Newman Taylor Baker, baterista de formação clássica que também toca a washboard.
EM – Quando e como nasceu o duo Piedmont Bluz?
VT - Uma vez que tomei a decisão de dar suporte e continuar as tradições do country blues, meu marido Ben se juntou a mim e formamos nossa dupla de blues acústico chamada Piedmont Blūz. Demos esse nome para que as pessoas saibam que tipo de música esperar de nós, porque eu toco no estilo do Piedmont. Também temos uma empresa, a Mudbone Watson Productions, através da qual produzimos nossos CDs e materiais de instrução. Sempre fomos apenas nós dois e gostamos assim.
EM - Pra nós aqui no Brasil o Piedmont blues não é um estilo muito conhecido. Acho que até aí nos Estados Unidos. Me parece que fica mais relegado a festivais de música folk. Estou errado?
VT - A região do Piemont percorre a costa leste dos Estados Unidos, da Virgínia à Georgia, e há muito debate sobre o que é o estilo do Piemont – ou até se ele existe. Como meu mentor, John Cephas, defino o estilo do Piedmont como uma técnica de palhetada que é caracterizada por um baixo alternado que é tocado pelo polegar enquanto os outros dedos tocam uma melodia sincopada. É preciso muita prática para torná-lo suave, mas vale a pena o esforço.
EM - Vocês estão no caminho oposto à eletrificação do blues, mantendo uma tradição acústica, inclusive com instrumentos rústicos. Gostaria que você falasse sobre a importância dessa preservação das raízes do blues.
VT - Além do violão, nossa instrumentação inclui a washboard, sopro e harmônica. Esses instrumentos eram comumente usados para a música blues nas décadas de 1920 e 1930, por isso faz sentido usar as mesmas coisas para as músicas antigas que gostamos de tocar.
EM - Eu estava pesquisando para essa entrevista quando vi que vocês gravaram When the Levee Breaks e lembrei da catástrofe que foi o rompimento dos diques em New Orleans pela força do furacão Katrina. Essa música conta uma história de quase cem anos e que se repetiu recentemente. Gostaria que você falasse sobre essa capacidade de o blues ser o porta voz das pessoas simples, das pessoas reais e de seus problemas.
VT - Músicas de blues sempre contam histórias. Essa música é a maneira de as pessoas se expressarem. Toda emoção humana pode ser encontrada em uma música de blues. Isso era verdade em 1920 e, 100 anos depois, ainda é verdade! As músicas de blues também capturam a história. O gênero em si é uma tradição oral e muitas músicas documentam os tempos do cantor. Ao ouvir essas músicas, você pode aprender sobre inundações, fome, Jim Crow, a Grande Migração, heróis locais e muito mais.
EM – Você estudou com John Cephas, um grande representante do estilo Piedmont. Gostaria que falasse um pouco sobre isso. Recentemente estive com Phil Wiggins aqui no Brasil. Foi uma experiência única estar com um músico que leva essa tradição musical. Eu nunca tinha visto nada igual.
VT - John Cephas era meu professor, meu mentor e nosso grande amigo. Ele era um talentoso e respeitado músico de country blues. Estou muito satisfeita por tê-lo conhecido. As pessoas pensam que ele me ensinou muitas músicas - e ele ensinou! - mas conversávamos sobre vida, política e pesca sempre que passávamos um tempo juntos. Nós o conhecemos como pessoa. Seus pensamentos, seus gostos e desgostos, suas experiências de vida, coisas assim. Ele possuía um trailer e um barco de pesca e gostava de fazer viagens, principalmente quando a pesca estava envolvida. Era um carpinteiro maravilhoso e orgulhava-se de ter construído sua própria casa. Além disso, era um fazendeiro entusiasmado e lembro como ele ficou desapontado ao ver nosso jardim. Cultivamos apenas plantas e flores decorativas e ele pensou que era um desperdício porque não podíamos comê-las! Esses são os tipos de coisas que ele compartilhou conosco. Em relação à sua arte, John tinha idéias muito definidas sobre a música que tocou, de onde veio, para onde estava indo e transmitiu seu profundo respeito por ela, bem como o dever de continuar tocando e ensinando-a.
EM – Grandes nomes desenvolveram o estilo Piedmont, Blind Blake, Blind Boy Fuller, Brownie McGhee, Barbecue Bob entre outros. Quem você considera o defensor dessa tradição hoje?
VT - Embora muitas pessoas se preocupem com o fato de a música tradicional do blues acústico estar "desaparecendo", eu diria que isso está longe da verdade. Existem inúmeros músicos modernos que mantêm as músicas antigas vivas e, mais importante, adicionam novas músicas próprias, o que ajuda a tradição a evoluir. Os mais conhecidos incluem pessoas como Corey Harris, Eleanor Ellis, Keb 'Mo', Rev. Robert Jones, Andy Cohen, Guy Davis, Taj Mahal e Roy Book Binder - mas existem muitos outros. Phil Wiggins, o fabuloso gaitista que foi o parceiro musical de John Cephas, fez muito em termos de identificação e promoção de novos músicos de blues acústico. Uma vez por ano, ele nos reúne em um workshop que dura uma semana chamado Blues Week in West Virginia, e foi assim que nos conhecemos. Ministramos aulas, tocamos muita música, compartilhamos histórias, dançamos e geralmente nos divertimos muito juntos. Todo mundo espera por isso. Conhecemos muitos músicos lá, Samuel James, Resa Gibbs, Hubby Jenkins, Geoff Seals, Benjamin Hunter, Tina Dietz, Marcus Cartright, Jontavious Willis, Joe Seamons e Andrew Alli. Cada um deles está contribuindo generosamente para o gênero de uma maneira única.
EM – Estamos no meio de uma pademia e muitos artistas estão com as suas vidas paradas nesse momento. Como você está sobrevivendo e o que acha que vai acontecer quando esse problema passar?
VT - Essa pandemia é difícil para todos. Não importa quem você é, isso te afeta de alguma forma. Embora muitas pessoas tenham empregos para retornar, os músicos podem ter que redefinir o que "trabalho" significa. O distanciamento social é nosso novo normal, até que uma vacina esteja disponível em todo o mundo, e isso impossibilita shows, festivais e workshops no sentido tradicional. Como todos os outros músicos que conhecemos, todo o nosso calendário para 2020 foi cancelado e muitos locais relutam em reservar para 2021 até que a pandemia seja resolvida. Portanto, 2021 também pode ser um ano difícil para músicos. Meu marido, Benedict, é um designer gráfico profissional e é capaz de trabalhar em casa. Também fazemos uma performance semanal via transmissão ao vivo a partir de um local digital que criamos no Facebook chamado "Piedmont Blūz Café". É um mini-concerto que acontece toda sexta-feira de manhã às 10 horas – horário da costa leste norte americana – e recebemos algum dinheiro com isso. Além disso, podemos vender cópias de nossos CDs e também de nosso livro de música. Passaremos por esse momento difícil e esperamos que outras pessoas também encontrem maneiras criativas de gerenciar. A longo prazo, essa pandemia terá efeitos de longo alcance para os músicos, pois todos temos preocupações com a segurança de voar, ficar em hotéis e estar perto de grandes grupos de pessoas. Nosso trabalho exige que façamos a coisa certa, por isso relutamos em retornar a essas atividades no futuro próximo.
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