terça-feira, 16 de abril de 2013

Tocando com Buddy Guy, Ric Hall entrou para o time dos grandes guitarristas de blues pela porta da frente



Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Arquivo Ric Hall

Na manhã de um domingo qualquer, como já fiz algumas vezes, saí de Santos e subi a serra para fazer uma entrevista com Ric Hall, guitarrista de Buddy Guy que estava hospedado com o resto da banda em um hotel na marginal do rio Tietê.
No mesmo hotel, estava o time do Santos Futebol Clube, que ia participar de um jogo decisivo em São Paulo. Não sei qual torneio. Entre xícaras de café e a aparição de um jogador ou outro no lobby, a entrevista rolou. Há um ano.
Pois é, a entrevista estava perdida, desde abril de 2012, ocasião de um show de Buddy Guy em Sampa. O fato é que achei a perdida no mesmo dia em que fiquei sabendo que o Buddy Guy ia tocar, mais uma vez, no Brasil em um grande festival que começa no dia 10 de abril de 2013. É alguma sorte.
Tenho um critério para fazer as entrevistas para o Mannish Blog, o músico tem de ter pelo menos um CD gravado e lançado. A não ser que esse músico participe de uma das grandes bandas de blues da atualidade.
Ric Hall, ou Ric Jaz, como também gosta de ser chamado, faz parte de uma das melhores formações de uma banda de Buddy Guy, com Marty Sammon (teclado), Orlando Wright (baixo) e Tim Austin (bateria).
Escolado no jazz, Ric entrou para a banda por acaso. Tocava blues sem maiores pretensões até ser “descoberto” por Phil Guy, irmão de Buddy.
Com Buddy, dividiu o palco com os maiores guitarristas de todos os tempos, entre eles, B.B. King, Eric Clapton, Carlos Santana, Hubert Sumlin, Nile Rodgers, Robert Cray, Ron Wood e outros.
Ah, só citei o Santos Futebol Clube porque Hall é fanático por basebol e o futebol, o de lá dos states, é claro. Mas eu não poderia deixar de dizer que o melhor time do futebol de todos os tempos foi da minha cidade... mesmo sendo corintiano.



Eugênio Martins Júnior – Quando foi a primeira vez que ouviu o Blues?
Ric Hall –
Bem, não posso dizer exatamente quando conheci o blues, mas quando comecei a me ligar em música. Foi no começo dos anos 70 por causa da minha mãe. Ouvíamos música o tempo inteiro, todos eram músicos, todos tocavam. Mas nunca pensei que seria músico ou guitarrista. Comecei a tocar por causa das garotas. Elas sempre ficavam admiradas pelos cantores e guitarristas e eu achei que poderia fazer aquilo. Então reuni um grupo de amigos e formei um grupo. Mas eu era cantor, não guitarrista e era fã de Smokey Robinson. Só que aí estava crescendo e minha voz estava mudando e não teve jeito. Quando me formei no ensino médio, minha mãe me deu um violão. Ela tinha um namorado que era ótimo músico, fazia parte de um grupo gospel chamado Original Gospel Soulsters. Ele tocava, cantava e começou a tentar me ensinar, mas eu odiei. Odiei. Ele não estava me ensinando o que eu queria aprender. Todo mundo da minha vizinhança ou era guitarrista ou baixista e havia música em toda a parte. Toda a minha vida ouvi Soul Music e todos aqueles músicos de blues e jazz. Queria tocar como George Benson. Adorava Sam Cooke, The Dells, mas não fazia ideia que depois iria tocar com eles. Também pensava em ser jogador de futebol, jogava no time da escola, mas aí aconteceu um acidente estranho, um deslocamento no quadril e foi o fim do futebol e de todos os esportes. Nessa época tocava um pouco de guitar steel e minha intenção era ser professor de música. Não estava nessa de blues, estudava be bop jazz e cantava em um coral. Albert King apareceu na faculdade procurando alguém para tocar naquele final de semana e me convidou para uma audição. Ele gostou do meu jeito de tocar os acordes de jazz e todos aqueles ritmos e eu peguei o trabalho. Agradeço a ele por isso, não sabia quem era Albert King e nem de sua importância. A primeira gig foi em Mineapolis, em um lugar chamado Cabul’s. Eu e ele duelando e as garotas gritando e eu pensei “Cara, olha isso?”. Depois disso resolvi que seria guitarrista profissional.

EM – Como entrou para a banda do Buddy Guy?
RH –
Costumava tocar em um clube de Chicago chamado Kingston Mines, mas também tocava em um grupo de rhythm and blues chamado The Dells. Toquei com eles muito tempo e me ensinaram muito sobre show business e o mundo do entretenimento. As aulas que tive com Kirk Stuart na Howard University me ajudaram a ler os difíceis arranjos feitos pra big bands dos Dells. Tenho muito respeito por aqueles caras, me ensinaram muito. Bem, após serem indicados ao Rock and Roll Hall of Fame, eles me chamaram para uma grande turnê e eu cancelei todos os meus outros shows, mas no último minuto a turnê foi cancelada e eu não consegui minhas datas de volta. Fiquei falido. Encontrei o Phil Guy e ele me disse que seu irmão, Buddy Guy, estava procurando um guitarrista...

EM – Que sorte! Inacreditável!
RH –
Eu tive a mesma reação e disse para o Phil, “Get out of here, man!”, mas ele insistiu e disse que era sério. Caramba, Buddy conhece um monte de guitarristas! Um mês depois em um domingo, estava tocando em um clube quando Buddy Guy entrou, sentou, pediu uma bebida, conversou com o dono do lugar e me ouviu tocar. Antes que eu pudesse falar alguma coisa ele foi embora. E eu com pressa, precisava estar em outro clube no subúrbio a cinqüenta quilômetros de Chicago, no Larry’s. Era um trabalho regular. Aí aconteceu de novo, ele entrou no bar, sentou e pediu uma bebida e eu pensei, “dessa vez vou falar com ele”, mas no intervalo ele já tinha desaparecido (risos). Na terceira semana ele foi de novo, mas dessa vez antes de eu começar a tocar, estava arrumando as minhas coisas, de costa para a platéia e ele caminhou até mim e perguntou se eu queria entrar para sua banda. Me virei dando risada e disse “Get out of here, man!” (risos).
Ele disse que estava falando sério. Eu aceitei é claro, mas disse que tinha uma obrigação com os Dells pelo menos mais duas semanas. Ele disse que então não daria, mas eu achei que estava blefando por que como band leader não faria isso. Nesse meio tempo a minha mãe morreu e pude ver quanto Buddy Guy era um bom sujeito. Ele nem me conhecia direito, mas foi ao seu funeral. Eu não tinha dinheiro para comprar um caixão e nem flores e ele comprou o caixão. No Natal do mesmo ano ele me convidou a ir à sua casa e me apresentou a sua família e amigos.



EM – Como é o sentimento de tocar com um dos maiores nomes do blues de todos os tempos e de estar no palco com essa grande banda?
RH –
É elétrico. Não é como eu via o blues. Achava que era uma música triste, baixo astral, guitarras chonc, chonc chonc... de verdade. Esses caras têm fogo. Fazem a coisa ficar interessante. Temos que prestar atenção. Buddy diz, olhe para mim, me siga. E tem sido assim pra mim nos últimos oito anos. É muito bom estar no palco com eles.

EM – Tocar na banda de Buddy Guy te deu projeção internacional. Você acha que é a hora de gravar um CD solo?
RH –
É difícil dizer. Não sei... é difícil dizer.

EM – Você tem as suas composições?
RH –
Não em blues. Estudei muito jazz e gosto de fusion. Toco blues tradicional, mas gosto de progressivo, rock, esse tipo de coisa.


EM – Penso que tocar com Buddy Guy é como andar o tempo todo em um campo minado. Quero dizer, você tem de estar sempre 100% alerta, porque ele muda toda hora, às vezes duas vezes no mesmo tema. Você concorda?
RH –
(risos) Como disse antes, Buddy Guy sempre fala pra banda observá-lo. E prestar atenção é a única coisa que você pode fazer. Todos na banda tocaram com diferentes músicos e carregam a experiência de observar a movimentação no palco.

EM – Outra coisa que percebi vendo cinco shows de Buddy Guy é que ele não tem playlist.
RH –
Certo, ele não tem playlist. Sempre em janeiro de cada ano tocamos no Buddy Guy Legend’s. Esses são nossos ensaios. Aprendemos em janeiro o que vamos tocar o ano todo.

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