Foto: John Mason
Corey Harris nasceu no final da década de 60, quando os veteranos do blues tradicional, Mississippi John Hurt, Son House, Bukka White, Mississippi Fred McDowell, Lightnin' Hopkins, Mance Lpscomb e outros consagravam-se de uma vez por todas perante platéias brancas do norte dos Estados Unidos. Todos eles beirando ou ultrapasando os 70 anos.
Apesar de ter crescido na era do videoclip, Harris é um dos maiores preservacionistas das tradições musicais de seu país e não só das raízes mais profundas da música sulista chamada blues. Tocou nas ruas de New Orleans e estudou história, inglês e francês até forjar um estilo musical que o distingue dos artistas atuais.
Profundo conhecedor do êxodo involuntário de africanos para as Américas, Harris envereda pelos ritmos do antigo continente com desenvoltura e propriedade, como pode ser visto e ouvido no vídeo abaixo em Special Rider Blues. Uma mistura essencial para entender a linha genealógica dessa fascinante música que é o blues.
Parte dessa viagem às suas raízes musicais e culturais pode ser vista no documentário Feels Like Going Home, da série Blues, de Martin Scorsese, onde Harris busca a conexão entre o gênero norte-americano e os ritmos africanos no Mali.
Com Between Midnight and Day, Fishin' Ain't Bitin', Greens From Garden, Zion Crossroads, Mississippi To Mali, Vu Du Menz e outros, Corey Harris é reposnsável por alguns dos melhores discos da história recente do blues - leia-se décadas de 90 e 2000.
Eugênio Martins Júnior - Quando foi a primeira vez que você ouviu o blues?
Corey Harris – Eu nasci no blues. Todos os negros nasceram, quer eles saibam ou não.
EM - No Brasil somos entusiastas por nossas raízes culturais e temos muitos ritmos musicais, assim como nos Estados Unidos. Pra você, qual é a importância do blues para a cultura norte americana?
CH – O blues é a base de toda a música negra e popular da América do Norte. As raízes estão na África... nós somos os descendentes.
EM – No Brasil, alguns ritmos são acústicos, feitos com instrumentos de percussão e a evolução da música negra deu-se nesse sentido. No meu ponto de vista, nos Estados Unidos, passou pela eletrificação dos instrumentos e equipamentos. E também com a mistura de vários ritmos como o rap e elementos eletrônicos como nos álbuns mais recentes de R.L. Burnside. Você concorda?
CH – Não concordo. Os negros tocam música antes da eletricidade. O blues veio com nossos ancestrais africanos passando pela escravidão. Eles tocavam instrumentos acústicos como o violino, banjo e instrumentos de percussão como a washboard, ossos e bacias. Nessa época as músicas eram chamadas de “Spirituals” (música sagrada) e field rollers (música de trabalho nos campos).
EM – Uma série de artistas está voltando a fazer música acústica, como você mesmo, Phil Wiggins e John Cephas e outros. Como você vê a cena blues nos Estados Unidos atualmente? Há lugar para a música secular como o blues de raiz?
CH – A cena atual de blues é muito diferente. Há muitas pessoas brancas cujas raízes culturais não vêm do blues, mas elas gostam da música e tocam. O blues sempre foi uma cultura compartilhada entre os negros, mas têm sido comercializada e o dinheiro está mudando tudo e agora podemos encontra-la em todos os lugares, inclusive onde não há pessoas negras. Pense o que seria da música brasileira se fosse tocada por não brasileiros, mas que fosse tratada como se fosse a mesma música feita por brasileiros legítimos. Há muito mais na música do que simples notas. Há a cultura de um povo.
EM – Você gravou Mississippi To Mali e viajou para lá no filme Feels Like Going Home de Martin Scorsese, mostrando as conexões entre o blues e a música africana. A mesma coisa com o Zion Crossroads. No sentido de explorar novas experiências, como esse conhecimento influenciou sua música?
CH – O conhecimento da história da música negra ao redor do mundo e a história da minha família inspira minha música.
EM – Mas para gravar esses discos você teve de se adaptar seu modo de tocar e cantar às tradições locais? Como foi esse processo?
CH – Eu não faço adaptações. Simplesmente toco o que sinto e faço o melhor para soar original.
EM – Você poderia comparar sua jornada ao sul dos Estados Unidos com a viagem à África?
CH – Uma das maiores diferenças que eu percebi entre o sul e a África é que os africanos conhecem muito mais sobre nós do que os afro-americanos conhecem sobre a África. Muitos negros nos Estados Unidos ainda estão acordando para suas verdadeiras raízes.
EM – Qual a importância de sua pesquisa para as novas gerações?
CH – É importante especialmente para as crianças saberem que tiveram uma história cultural nobre e rica muito antes dos Estados Unidos. Aprendemos por muito tempo a cultura branca e que não temos história e nada para nos orgulharmos... mas agora a verdade está vindo à tona.
EM – Você tocu algumas vezes com o Phil Wiggins e ele me disse que está pra sair um trabalho. Quando será isso?
CH – O trabalho com Phil Wiggins será guitarra e harmônica, tudo acústico. Será uma mistura de antigas e novas canções. Atualmente vendemos nos shows, mas quero disponibilizar online em breve.
EM – Você gravou com Henry Butler um álbum maravilhoso chamado Vu Du Menz. Como e quando você teve a idéia e como foram as sessões?
CH - Henry Butler e eu tivemos a idéia em 1999. As sessões foram muito divertidas... gravamos na Louisiana, perto de Lafayette. Henry é um verdadeiro gênio e é sempre muito bom fazer música com ele.
EM – Fale-me sobre o aprendizado de tocar nas ruas. Era seu único trabalho naquela época?
CH – Comecei tocando nas ruas em New Orleans durante todo o dia em 1993. A música sempre foi meu único emprego e eu sou muito grato por isso ser assim até hoje.
Corey Harris Interview
EM – How the first time you met the blues?
CH – I was born in the blues. All Black people are, whether they know it or not.
EM – We're very enthusiastic with roots culture in Brasil and we have so many musical rhythms like USA. For you, how important is the blues to american culture?
CH - Blues is the foundation of all Black and popular music in North America. The roots are in Afrika...we are the branches.
EM – In Brasil some of that rhythms are acoustic, made by percussion instruments, and the evolution of black music was made in that direction. In my point of view, in the USA, the evolution of music was through electric instruments and equipments. And made a mix with others rhythms like rap, and electronics elements like last albuns of R.L. Burnside. Do you agree?
CH - I don't agree... black people played music before electricity. Blues music came from our Afrikan ancestors experience in slavery. The acoustic instruments they played were fiddles, banjos, percussion instruments like washboard, bones and jugs. Back then, the music was called spirituals (sacred music) and field hollers (work music from the plantation fields).
EM - But, today, many artists was back in the acoustic roots like yourself, Phil Wiggins e John Cephas, Keb Mo and others. How do you see the blues scene. In the USA. Is there a place to the secular music like roots blues today?
CH - The blues scene in USA is much different today. There are many people (white) whose cultural roots do not come from blues, but who like the music and play it. It used to be that blues was a culture among Black people, but it has been commercialized and the money has changed everything so that now it can be found everywhere, even in places where there are no Black people. Think of what Brazilian music would be like if non-Brazilians played the music and were treated as if they were making the same music as the native Brazilians...there is more to music than just the notes. It is the culture of a people.
EM – Did you recorded Mississippi to Mali and travelled to Mali in the Martin Scorsese’s, Feel Like Going Home, showed the connections between blues e African music. As the same of Zion Crossroads. At the sense of explore a new experiences, how the knowledge influenced your music?
CH - The knowledge of Black history around the world and my family history inspires my music.
EM – To record that albuns did you had adapt your way of play and sing to the local traditions. How was the process?
CH – TI don't do any adaptations..I just play what I feel and do my best to be original.
EM – Could you to compare your journey to the deep south in the USA and to Africa?
CH - One of the big differences that I have noticed between the deep south and Afrika is basically that Afrikans know more about us than most Black Americans know about Afrika. Many Black people in America are still awakening to their true roots.
EM – What important are this research for the new generations?
CH - It is important especially for the children to know that they have a noble and rich Afrikan cultural history that is far older than the USA. For so long we have been taught be the white culture that we have no history and nothing to be proud of...now the truth is coming out!
EM – You play in duo with Phil Wiggins a few times and he told me that you are recorded an album will publish soon. How it will be this job?
CH - The record with Phil Wiggins is a guitar and harmonica, all acoustic. It is a mix of old blues songs and some originals. We sell it only at gigs right now, but in future I will make it available online.
EM – Did you recorded with Henry Butler a wonderful album called Vu-Du Menz. How and when did you have this idea and how was that sessions?
CH - Henry Butler and I had the idea way back in 1999. The sessions were a lot of fun...we recorded in Louisiana, near Lafayette. Henry is a true musical genius and it is always great to make music with him.
EM – Tell me about the learning to play in the streets. That was your only job in that time?
CH - I began playing in the streets of New Orleans full time in 1993. Music was my only full-time job, and I am thankful that it still is.
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