Texto e fotos de Eugênio Martins Júnior
Além de boas conversas, essa minha busca por entrevistas gera bons encontros. Conheci o Leo Susi por intermédio do Herbert Lucas, diretor artístico do Bourbon Street Music Club, que me indicou o baterista como melhor pessoa para chegar ao lendário trompetista Randy Brecker.
Acabei conhecendo a trajetória – ou saga? – do Leo pela Ásia, especificamente pela China, e fiquei pasmo e admirado com a história. Também conheci o percussionista Marco Bosco, mas desse encontro falo depois. Em outra entrevista.
Conhecendo o caminho percorrido por muitos músicos, não me são estranhas as histórias de artistas que concretizam o sonho de estar perto da música que praticam, o jazz. Nesses casos específicos, os destinos são Estados Unidos e Europa.
Leo Susi tomou outra rota, a do oriente. E se estabeleceu em Xangai, vibrante centro cultural com 26 milhões de habitantes, mas que atrai músicos de todos os cantos do planeta, transformando-a um palco global para artistas que buscam novas inspirações e oportunidades.
Leo conta que os 15 anos de residência na grande metrópole chinesa foram fundamentais para seu desenvolvimento como artista. Tocou em inúmeros programas da TV local, tocou jazz, música pop, inclusive “acompanhando o Fábio Júnior de lá”. E, por fim, fez o que foi para fazer, tocar música brasileira.
Leo também se enturmou na Alemanha com o Andreas Günther Quartet, com quem excursionou por 12 cidades esse ano, entre elas Berlim, Hamburgo e Colonia. Com eles gravou dois discos, um que ainda está para ser lançado, o Hemisfério Sul.
E, com saudade de dar aquela groovada em português – depois que inventaram deletar, startar, precificar, por quê groovar não pode virar verbo? - Leo Susi ainda arrumou tempo para gravar e lançar em 2022 um disco há muito planejado, BraGilidade, com temas do Gilberto Gil, com a participação do próprio.
O show do Randy Brecker, Ada Rovatti e o Leo Susi Trio no Bourbon Street, numa noite fria de junho, quando essa entrevista foi realizada, contou ainda com o Marco Bosco (percussão), Adriano Magoo (teclados) e Carlinhos Noronha (contrabaixo).
Ada Rovatti e Leo Susi no camarim do Bourbon Street
Eugênio Martins Júnior – Como foi a tua infância musical?
Leo Susi – Sou de Brotas, interior de São Paulo. E havia muitas festas na casa de meus pais. As pessoas iam tocar violão, cantar, tocar percussão. Me interessei pela música e fui tocar na fanfarra da cidade e depois roda de samba. Daí me interessei por essa parte percussiva da música e aos 15 anos comecei a estudar bateria. Foi em Piracicaba, com um professor e depois de três anos fui para Tatuí. Mas a influência maior foi da família. Minha mãe cantava e meu avô tocava cavaquinho.
EM – A casa dos teus pais era um local de encontro do pessoal da música da cidade?
LS – Sim, quase todos os dias. Cidade do interior não tinha muito o que fazer (risos). Bastante gente frequentava a minha casa naquela época. Tenho três irmãs. Uma cantava, mas parou, virou farmacêutica. Mas minhas sobrinhas gêmeas cantam e tocam percussão e violão.
EM - Você estudou com o Paulo Braga, Nelson Faria e Hermeto Pascoal. Gente da pesada. Aprendeu lições importantes?
LS – Em Tatuí esses grandes nomes da música davam aulas nos cursos de verão e a gente frequentava. Mas tínhamos as aulas fixas, harmonia, execução, grupo, bateria. Uma aula que mudou a minha visão de palco foi a do Nelson Ayres. Como um músico deve se comportar em cima do palco.
EM – E como é que se comporta?
LS – Respeito com os outros músicos. Sempre escutando. Evitar de ficar pegando o celular. Por ser baterista eu não mexo, mas vejo as pessoas usando. Respeitar enquanto o outro está falando.
Leo Susi e Marco Bosco
EM – Você viveu muitos anos fora do Brasil. Como se deu a ida para o exterior?
LS – Eu dava aula em uma escola de música em Brotas e o pessoal de uma de uma banda de São Carlos em convidou para ir para a China, cumprir seis meses de contrato em uma casa de shows. Eu aceitei, mas foi época da SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave), em março de 2003, e a turnê foi cancelada. Em maio estourou a guerra dos Estados Unidos contra o Iraque. Acabei indo para a China só em agosto de 2003. E fiquei até 2017.
EM – Foi para ficar seis meses e ficou de vez?
LS – Sim. Fiquei quase 15 anos. E depois, em 2019, antes da Covid voltei à China em turnê novamente.
EM – Que lugar da China?
LS – Sempre em Xangai.
EM – Tocando Jazz?
LS – No começo fui contratado para tocar música brasileira com uma banda brasileira. Depois fiquei free lancer, fazendo de tudo e foi a maior escola da minha vida. A China estava abrindo para o mundo, músicos do mundo inteiro estavam em Xangai. E foi aí que aconteceu a troca de informações, de musicalidade. Tocava hoje com uma big band, amanhã com um grupo de salsa, depois com um trio de jazz, música pop. Fui crescendo cada vez mais até chegar nos popstars da China. Trabalhei no The Voice de lá e em vários outros.
Randy Brecker e Ada Rovatti
EM – Fora a música popular deles, qual era a cena musical mais forte lá?
LS – O jazz é muito bem aceito. Me gerou muito trabalho, muitas oportunidades. Mas o ápice da minha carreira foram os programas de televisão, trabalhei no Ídolos, como disse, as turnês com os popstars da China. Conheço mais a China do que o Brasil. Rodei mais por lá.
EM - Como começou essa parceria com o Randy?
LS – Ainda morava na China, mas tinha um grupo com o percussionista Marco Bosco, o Balaio. O Marco me apresentou o Randy. E nós o chamamos para uma turnê em 2016, na China e na Europa. Fizemos 16 shows, passando por vários festivais em Xangai. Tocamos no Ronnie Scott, em Londres; Blue Note, em Milão; Roterdam e Amsterdam. Depois fizemos outra turnê pela China e Taiwan. E agora estamos trazendo para tocar com a gente aqui no Brasil.
EM – Como nasceu o BraGilidade, disco em homenagem ao Gilberto Gil?
LS – Essa ideia surgiu em Xangai, em 2006. Quando o Gil ainda era ministro da cultura e foi em uma missão à China, em uma caravana do Lula. O consulado do Brasil ofereceu um almoço a ele e o vice-cônsul me convidou, mas com a recomendação que levasse meu pandeiro, porque ele iria levar o violão. Nós tocamos umas três músicas e depois conversei muito tempo com o Gil. Daí surgiu a vontade de fazer um disco com músicas instrumentais do Gil, o que nunca tinha acontecido. Mas só lancei o disco em 2021. O Gil tocou violão em uma faixa. É um disco bem lado B. Percebi que se colocasse um G ali no meio ficava BraGilidade. Uma verdadeira homenagem ao Gil. Esse ano volto para a China e levo esse trabalho na bagagem.
EM – Vai voltar e ficar?
LS – Não, vou para uma turnê de 20 dias. Fiz muitos contatos por lá. E tenho um grupo na Alemanha também. Tocamos muito por lá. Mas não morei. Sempre vou para ficar 20/30 dias e volto. Tenho disco gravado com várias composições minhas e do pianista, o Andreas Günther. Vamos lançar novo trabalho.
Adriano Magoo
Carlinhos Noronha