EM - Você gravou um disco com o Antonio Eduardo, o Amor Antigo. É um disco muito bonito. Gostaria que falasse sobre essa parceria.
JS – O Antonio é um personagem. É o principal pianista do Gilberto Mendes. E a gente fez muita bagunça em cima disso. Tínhamos bastante intimidade com ele e houve vários fatos pitorescos nesse disco. Em 2010 o Gilberto me encomendou um concerto para flauta para orquestra sinfônica. Daí fiz uma transposição para o piano e flauta e nós gravamos. E o Gilberto tem uma música chamada A Mulher e o Dragão que é lindíssima. E a gente meteu um jazz no meio. Ligamos para o Gilberto e perguntamos o que ele achava e ele disse: “Esse baixinho está virando um pianista de bar. Mas ficou bom, pode gravar”. Outro compositor que gravamos foi o Michel Lysight, um belga amigo do Antonio. É um cara muito bom. E o Gilberto com ciúme. “Esse baixinho aí é o único pianista no hemisfério sul que grava esse cara”. O Gilberto e o Antonio eram como pai e filho. Tem ainda a Adriana Bernardes cantando Entrelinhas, parceria minha com a Glorinha Veloso. Choro dos Meninos que foi feita para big band, mas que ganhou um arranjo para sax e piano. Saudades da Minha Voz, uma de minhas músicas mais antigas, de 1984. Esse disco tem bastante dessa mistura eu a gente estava falando.
EM - Como foi participar dos concertos em homenagem aos 100 anos do maestro Gilberto Mendes?
JS – O Sesc, com sua estrutura, consegue mostrar esse lado não popular para as pessoas. De uma música mais elaborada, vamos colocar assim. Mostrando esse lado dele que é a música de câmara e coral. Participei dos recitais. E o Gilberto é um personagem de Santos. Vou muito ao cinema de arte ali no Gonzaga e em uma dessas ocasiões falei o nome dele e as pessoas que trabalhavam lá me contaram que Mendes era um a frequentador assíduo. Ele também ia ao baile da praia dançar. Um personagem atuante na cena cultural em vários sentidos e passou isso tudo para a música, Santos Futebol Music, que você já citou, Urubuqueçaba e outras. Era conhecido mundialmente por isso.
EM – Já que você falou isso. De que forma a cidade de Santos interfere na tua música? Digo interfere porque percebo a influência que o mar, por exemplo, exerce na criação dos artistas daqui é muito impositiva. O mar de Santos se mete em tudo, na escrita, na música, na fotografia, nas artes plásticas.
JS – Sim, fiz uma sinfonia para o Orquidário de Santos. Foi tocada no ano passado, no Teatro Municipal. Fiz um baião para o bonde turístico e quando inauguraram a nova linha me convidaram para tocar lá onde ficam os bondes. Com o projeto Tocando na Cidade me apresentei na Casa da Frontaria Azulejada, na Alfândega, na Pinacoteca Benedicto Calixto. Sem dúvida essa relação com a cidade é motivadora.
EM – Inclusive você fez uma música para o teatro Coliseu, que nos anos 80 era um puteiro. O teu tema Noites de Coliseu é sobre essas noites?
JS – (gargalha). Nunca tive essa concepção. Mas é verdade, antigamente era mesmo, podia ter uma parte alusiva a essa época. O meu disco mais recente, cujas fotos do encarte foram feitas todas no Coliseu, foi lançado ano passado, ano do centenário do teatro. Até cogitamos lançar o disco lá, mas não deu certo porque o Coliseu está em reforma.
Antonio Eduardo
EM – O teatro Coliseu passa mais tempo em reforma do que funcionando. Em todas as administrações municipais nos últimos 30 anos. É uma vergonha.
JS – É, as obras não foram concluídas e acabamos não fazendo. Mas o tema era sobre as noites musicais. Lá ouvi muita orquestra sinfônica e fiz alguns shows. Com o show Mil Motivos homenageamos os chorões aqui de Santos, Zé Roberto, Orlando do Pandeiro. E Noites no Coliseu é um choro com flauta em sol e piano que fiz para essas noites memoráveis. Nunca tinha pensado pelo teu viés. (risos).
EM – Nesse teu show mais recente de jazz e bossa você falou sobre bastante sobre a viagem à Alemanha. Como se deu isso?
JS – O Marcos Fregnani, um dos meus primeiros professores de flauta, isso há quarenta anos, de vez em quando vem ao Brasil. Ele é músico erudito, toca em orquestra. No ano passado ele veio e disse que na universidade de sua cidade iria ter um festival e perguntou se poderia apresentar meu trabalho. É claro que concordei. Passou um tempo recebo um e-mail da diretora da universidade dizendo que quatro músicas minhas foram selecionadas para serem apresentadas com big bands e com músicos de câmara e que gostaria que eu fosse. Tive que me programar porque tenho a escola de música para administrar, mas acabei indo. Fiquei duas semanas.
EM – Rodou por lá?
JS - Foi curioso porque cheguei lá numa terça e na quarta já teve ensaio. E na quarta a noite recebi uma ligação de um brasileiro me dizendo que iam tocar uma música minha em Hammelburg, cidade vizinha d a Nuremberg, onde eu estava. E ele me disse que se não quisesse ir não haveria problema porque iriam gravar. “É claro que eu vou, só me diz o que tenho que fazer pra chegar lá?” Pô, viajei 12 horas e estava do lado!
Fui para a cidade e era uma big band, músicos de vinte e poucos anos tocando muito bem, dinâmica, articulação, afinação, improviso, a primeira parte tocaram Duke Ellington e a segunda música brasileira, João Donato, Guinga, Hermeto Pascoal e minha música. Uma que gravei no primeiro disco, com big band e mixei na própria Alemanha em 1998, quando fiz uma turnê lá.
EM – Fez algum show?
JS – Sim, depois me levaram para jam sessions. Toquei choro, jazz, bossa, tudo. De Tico Tico no Fubá a jazz. Terça-feira e o bar lotado.
EM – Cheguei aqui na escola e estava rolando um heavy metal. O que vocês mais ensinam? Há um direcionamento para a música brasileira?
JS – Não, ensinamos tudo. A escola faz trinta anos esse ano. Comecei dando aula nas casas das pessoas. Depois aluguei uma salinha e depois a escola. Foi crescendo. A escola é bem diversa em relação aos estilos musicais. Poderia abrir um conservatório, mas aí teria de restringir. Tem coisas específicas que não são interessantes para a maioria do público. Ficamos na linha popular, embora tenha choro bossa nova, jazz. Nosso programa vai de Bach a AC/DC.