terça-feira, 21 de agosto de 2018

Após 50 anos Aluê traz Airto Moreira de volta ao Brasil


Nos anos 60 o samba brasileiro invadiu o DNA do jazz, do funk e do rock. Não tem vacina e nem cura. Nosso batuque é conhecido faz tempo e Airto Moreira é um dos responsáveis por isso ter acontecido. Usando uma palavra tão na moda,  um “influenciador”.
Apresentado por Joe Zawinul a Miles Davis, tocou no disco Bitches Brew, que consolidou as bases do fusion jazz, a revolução musical inventada pelo trumpetista de Saint Louis  e que, na época, muita gente não entendeu.
Com Chick Corea gravou os dois primeiros discos de seu Return To Forever, o primeiro disco homônimo e Light as a Feather, já com sua esposa, a cantora Flora Purim.
A lista de participações e parcerias é imensa, inclui Cannonball Adderley, Lee Morgan, Paul Desmond, Dave Holland, Jack DeJohnette, John McLaughlin, Keith Jarret, Al Di Meola, George Duke e tantos outros.
O retorno ao Brasil marca a gravação de Aluê, disco lançado pelo selo Sesc em 2017 com temas novos e antigos: Aluê (Airto Moreira e Flora Purim), Lua Flora (Flora Purim e José Neto), Sea Horse (Jossé Neto) e Misturada, Rosa negra, I’,m Fine, How Are You?, Não Sei Pra Onde, Mas Vai e Guarany (Airto Moreira). O time de bambas inclui Diana Purim (voz), José Neto (guitarra), Vítor Alcântara (sopros), Fábio Leandro (piano), Carlos Ezequiel (bateria e produção).
Nessa terça-feira, dia 21 de agosto, a partir das 21h, Airto Moreira apresenta com a banda Fotografia Sonora no Bourbon Street, em São Paulo, o show Viva Airto!

Eugênio Martins Júnior – Você está com um CD lançado recentemente, o Aluê. Gostaria que falasse sobre ele. Como surgiu a ideia e a oportunidade?
Airto Moreira – Aluê foi uma ideia do produtor Carlos Ezequiel. Ele foi aos Estados Unidos e nós ensaiamos. Quando chegamos aqui ensaiamos mais e gravamos pelo selo Sesc. Os músicos são muito bons.

EM – As músicas de Aluê foram gravadas ao vivo e em um único take. Gostaria que falasse sobre isso.
AM – Sempre achei que o primeiro take é o melhor de todos. Mesmo que a gente grave mais dez.

EM – Ano passado o disco Quarteto Novo fez 50 anos. Um marco. Gostaria que falasse sobre isso.
AM - Na época foi o projeto mais importante que fizemos e ainda existem pessoas que gostam dele.

EM – Gostaria que você falasse sobre o disco Bitches Brew. Você participou das faixas Great Expectations e Little Blue Frog. Como foram as sessões?
AM – As sessões do Bitches Brew foram muito boas. Gostei muito de fazer.

EM – Gostaria que falasse sobre a banda Weather Report que foi a que abriu a minha cabeça para o jazz fusion nos anos 80 e que tenho todos os discos.
AM – Não tenho muito o que falar. Gravei o primeiro disco deles, mas nunca toquei ao vivo com o Weather Report. 


EM – Mais do que nunca entramos de cabeça nas batidas eletrônicas. Há convivência pacífica entre as batidas orgânicas de Airto Moreira e as novas batidas?
AM – Não sei se há convivência pacífica porque nunca usei máquinas. As máquinas ficam de um lado e eu de outro. 

EM - O grupo Fotografia Sonora gravou o CD Viva Airto, uma homenagem a você. É o show que vocês vão apresentar no Bourbon? Como recebeu a homenagem?
AM – Gravamos há um ano. Eu estava aqui no Brasil e eles me chamaram. Foi muito bom, pessoas boas e bons músicos. É a primeira vez que tocaremos ao vivo juntos.  

EM – Quem vai, não digo ocupar o lugar, mas seguir os passos de Airto Moreira, Naná Vasconcelos, Paulinho Costa, Robertinho Silva, Laudir de Oliveira?
AM – Quem vai seguir os passos? Não acho que alguém segue os passos de alguém. Cada um tem seu estilo e toca o que gosta. Assim ficamos mais criativos e não seguindo passos. E quem vai ocupar eu não sei. Algumas pessoas que você mencionou já não estão mais por aí e não tenho a menor ideia.


Flora Purim
Eugênio Martins Júnior – O disco Return to Forever faz parte da vida de ambos. Gostaria que falasse sobre esse disco e essa época. Vocês estavam no meio da revolução que se tornou o fusion.
Flora Purim – O disco realmente faz parte das nossas vidas. Foram dois discos muito bons. Uma época que o Chick Corea começou escrever músicas mais melódicas e nós estávamos no meio da revolução que se tornou o fusion de verdade.

EM – Em 1967 você foi estudar música nos Estados Unidos e isso não era comum. Como se deu isso?
FP – Em 1967 não era comum. Fui para sair da ditadura militar, pois havia censura da música de Vandré, Chico, Gil, Caetano. Tinha 22 anos e achei que não teria futuro num país que censurava a liberdade de expressão.

EM – Vocês saíram do Brasil na década de 60, quando o país passava por forte turbulência política (uma ditadura militar). Após 50 país se encontra mais uma vez em um encruzilhada ideológica, política e cultural. Como vê o Brasil hoje com o olhar estrangeiro?
FP – Estou no Brasil há seis anos. Não olho pro Brasil como um estrangeiro. O país está passando por uma grande dificuldade. Tenho esperança que se elegerem os candidatos certos, talvez melhore. 

EM – Por outro lado, chegaram aos Estados Unidos do flower power sessentista. Deve ter sido uma transição curiosa. Poderia falar sobre isso?
FP – Chegar aos Estados Unidos no final dos anos 60 nos permitiu verificar uma revolução lá também. O flower power foi uma transição interessante, liberdade total. E foi assim que a gente começou a ouvir Jimi Hendrix, Janis Joplin, nos aproximamos ao Grateful Dead, com os quais colaboramos muito. Foi muito interessante influenciarmos e sermos influenciados.