sexta-feira, 11 de abril de 2014

Fenômeno da internet, A Banda Mais Bonita da Cidade traz a Santos o show O Mais Feliz da Vida


Composta por Uyara Torrente (vocal), Thiago Ramalho (guitarra), Vinícius Nisi (teclado), Marano (baixo) e Luís Bourscheidt (bateria), a banda mostra amadurecimento musical e mudança de rumo em seu segundo disco. Produção Mannish Blog e Lucas Shows e Eventos
 
 
A Banda Mais Bonita da Cidade teve sua carreira propagada após a viralização do vídeo Oração, em 2011, e atualmente está em turnê nacional divulgando seu segundo álbum “O Mais Feliz da Vida”. Muito bem recebido pela crítica e pelo público, o álbum traz a atmosfera já consagrada dos seus shows para um disco de estúdio.
Começando em 2009 sem grandes pretensões, A Banda Mais Bonita da Cidade nasceu da vontade de reinterpretar as canções que amava. Teve sua carreira propagada após publicar na internet seu vídeo “Oração” em 2011 (um dos mais vistos em todo o mundo) e gravou seu primeiro disco pelo sistema de crowdfunding, conceito pouco conhecido no Brasil na época. Atualmente, a banda trabalha na Turnê de lançamento do segundo disco de estúdio: O Mais Feliz da Vida.
Nesse novo álbum, a banda apresenta um registro maduro, sugerindo uma mudança sonora sem abrir mão de suas principais características e trazendo para o estúdio a atmosfera já consagrada dos seus shows.

Serviço:
Show: A Banda Mais Bonita da Cidade
Local: Teatro Coliseu de Santos
Data: 15 de maio de 2014
Horário: 21 horas
Endereço: Rua Amador Bueno, 237 - Centro - Santos – SP
Ingressos: À venda na bilheteria do Teatro Coliseu, pelo telefone (13) 4062 0016 e pelo site: http://www.compreingressos.com/

Primeiro lote (300 ingressos)
R$ 60,00 - Inteira
R$ 30,00 - Meia

Segundo lote
R$ 80,00 - Inteira
R$ 40,00 - Meia
Ficha Técnica

Produção: Lucas Shows e Eventos e Mannish Boy Produções Artísticas
Apoio: Conceituall
 

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Sérgio Duarte corrige rota e dá uma aula de harmônica em Acoustic Blues Harp


Texto e fotos: Eugênio Martins Júnior

Ao lado de Flávio Guimarães, Sérgio Duarte é um dos pilares da gaita blues no Brasil. Já abriu show de Buddy Guy e teve aulas de harmônica com James Cotton e Willian Clarke. Coisa para poucos.
Por sua vez, ajudou a formar gaitistas atuantes na cena blueseira brasileira, entre eles, Róbson Fernandes, Ivan Márcio e Big Chico.
Após dois discos lançados com a banda Entidade Joe, Sérgio Duarte e Entidade Joe e Destilado’n’Blues, e participações em gravações de inúmeros artistas, o gaitista veterano parte para uma nova fase na carreira.
Acoustic Blues Harp, seu terceiro disco, traz o melhor blues tradicional que o Brasil pode exportar ao mundo. São 13 temas, três clássicos do blues norte-americano e dez composições próprias, todos gravados em São Paulo com seu time titular, Celso Salim (guitarra) e Rodrigo Mantovani (baixo). De quebra, apresenta seu filho Leo Duarte (guitarra).
É um grande disco. Sérgio Duarte explora caminhos onde só os mestres conseguem ir, com timbres limpos e técnica impecável. Com esse CD, Sérgio Duarte iguala os feitos de Flávio Guimarães e Alamo Leal em Ain’t No Stranger Here e Ivan Márcio e Jon McDonald com Chicago Blues Sessions Vol. 2. Ou seja, o grande blues tradicional com a harmônica limpa, como era no começo de tudo, como as grandes duplas de country blues.
O trabalho de pesquisa que mistura blues com ritmos nordestinos e regionais, outra característica do gaitista paulistano, continua. Essa entrevista foi realizada em um dia especial, pouco antes de Sérgio Duarte subir ao palco do Sesc Santos com o show magistral: Entre o Blues e o Baião. Com as participações do guitarrista e violonista Luiz Waack e do sanfoneiro Antonio Bombarda. As fotos estão aí pra ilustrar essa matéria.



Eugênio Martins Júnior – Como começou a tua vida musical?
Sérgio Duarte –
Foi aos doze anos. Gostava de escrever poesia e de escutar rock e blues, com o dinheiro de aniversário de treze anos comprei um violão e comecei a aprender a tocar sozinho, com as revistinhas ou com amigos que já tocavam. Depois de um ano e meio, comecei tocar com amigos, mas mudei para o contrabaixo. Nunca mais parei. Tocava rock pesado e rock and roll nacional. Era uma banda chamada Tomate Inglês que teve clip na MTV com uma música minha chamada Fogo no Bordel.

EM – E a gaita, como apareceu?
SD –
Eu gostava de acampar em Minas e levava violão e tocava. Fui a uma caverna onde tinha um hippie tocando lá no fundo. Segui o som e chegando lá perguntei o que era aquilo. Ele me disse que era uma gaita especial para tocar blues, uma Hohner. Me apaixonei pelo som e quando voltei para São Paulo fui procurar uma gaita daquela. Mas não existia gaita Hohner no Brasil, só Hering.

EM – O cara da caverna mandava bem?
SD –
Eu não sabia tocar nada, pra mim era maravilhoso. Pensei, a próxima viagem que fizer vou levar o violão e a gaita. Comprei uma Hering nas casas Manon, na 24 de maio, Centro de São Paulo. Produtos importados naquela época, final dos anos 80, eram raridades. Depois tive acesso porque meu pai trabalhava nos Estados Unidos. No próximo acampamento, levei uma gaita em Mi. O pessoal gostou e meu interesse pelo instrumento aumentou. Passei a transpor o meu conhecimento do contrabaixo para a gaita. Em uma das viagens aos Estados Unidos, meu pai trouxe um método que vinha o desenho da gaita com todas as notas, explicando com fazia os bends, como fabricar aquelas notas.  A partir daí criei uma tabela para estudar através do contrabaixo. Sozinho, naquela época não havia professores. Tinha o Clayber (de Souza), o Clay Willians e o Maurício (Einhorn) que tocavam cromática e sempre falavam mal da gaita diatônica: “Ahhh, isso aí é brinquedo, isso aí não é gaita”. Eu dizia que eles não haviam escutado Sonny Boy, Little Walter. “Aquele barulho de gaita com amplificador?”. Os caras eram radicais. Conheci muita coisa graças ao Cidão Aparecido que era um colecionador de discos de blues. Ele me levava as fitas cassetes, “esse aqui é James Cotton, esse aqui é não sei o que”. Ouvindo aqueles sons e o meu conhecimento musical, criei um método que tenho até hoje. Também estudava os métodos de guitarra, Fly Fingers, Play Alone Blues, com riffs de blues na guitarra que eu transpunha para a gaita, notas, frases, tudo. No começo passei a ser um virtuoso. Tinha muita técnica, virei um gaitarrista, estava em uma banda de rock e nessa vibe de velocidade.


EM - E o primeiro contato com o Blues, quando se deu realmente?
SD –
Sonny Boy Willianson e Yardbirds. Também Blues Etílicos e Atlântico Blues, que eram os discos que existiam na época.

EM – Nessa época começou a sair muita coisa por aqui. Lembra da série da Atlantic que foi lançada nos anos 80?
SD –
Sim, Piano Blues, Gaita Blues, aquelas capas são maravilhosas. Aquilo foi uma escola, tive todos. Eu ficava tocando em cima das músicas que não tinham gaita. Estudando as escalas que estava tentando fazer. Cheguei a um nível que comecei a me achar limitado. Precisava achar um gaitista que me ensinasse a tocar. Fui para a Califórnia atrás do James Cotton e do Willian Clarke. Falei que precisa ir e meu pai me ajudou. A minha irmã havia cursado várias faculdades e eu sempre fui a ovelha negra da família (risos). Disse que ia para estudar. Meu pai pagou a passagem e eu limpei vidro, entreguei pizza, fazia várias coisas. Ia aos bares e conheci o James Cotton. Carregava a mochila dele e ia pra cima e pra baixo com os caras pedindo para ter aulas. O Cotton falou pra eu levar uma garrafa de bourbon ao seu apartamento e pediu sessenta dólares pela aula. Era pra eu ficar uma hora, mas fiquei até a madrugada. E aí ficamos bêbados e ele começou a tocar, falar do Little Walter e a mostrar as técnicas de tongue blocking que não eram conhecidas no Brasil. Colocou a gaita ao contrário e eu com aquela cara:”Tá ao contrário”. Ele pegou colocou a gaita ao contrario na boca e tocou pra caramba. Ele falou pra mim que se você toca de língua toca de qualquer lado. Tudo que eu achei que sabia foi por água abaixo. Fazia aulas de gaita cromática com o Clayber e tocava chorinho, bossa nova e sei tocar até hoje, então cheguei lá dizendo que já tocava. Os caras gostavam. Mas a melhor coisa que aconteceu foi que o Clarke e o Cotton me disseram, “Cara você não toca porra nenhuma”. Me destruíram.

EM – Você também teve uma aula com o Willian Clarke?
SD –
Sim, bastante aula de cromática.



EM – Qual foi a coisa mais importante que você aprendeu com eles?
SD –
Foi a desconstrução do meu conceito e trocar a embocadura de bico pela de língua que era uma técnica que no Brasil os caras falam que é viagem, mas que o gringos chamam de “side by side”, usando os dois cantos da boca, invertendo a língua de um lado a outro. Aos meus alunos aqui no Brasil eu chamo de inversão. Isso me chocou. Foram três a quatro anos pra começar a fazer. E nesse disco novo que eu vou conseguir mostrar o que aprendi lá.

EM – Você chama músicos que não tocam blues pra tocar nos teus discos. Usa o blues mais como base e não fica fechado só nisso. Fale um pouco sobre isso.
SD –
O cantor da banda de blues Entidade Joe saiu e me vi tendo que cantar e tocar gaita. Nesse processo, tive o sonho de fazer o blues virar o que virou o reggae e o rap que foram nacionalizados  e viraram grandes movimentos. Comecei a compor blues em português, na onda dos primeiros do Blues Etílicos e do André. Compus uma música chamada Vida de Poeta, que é um pouco Barão Vermelho, digamos, um pop blues, querendo popularizar. Insisti nisso até o segundo CD. O segundo muito mais elaborado, inclusive nas letras. Um disco muito bem gravado pelo Alexandre Fontanetti, que é primo da Rita Lee e produziu todo mundo. Até um tempo atrás tinha esse sonho. Agora estou no blues tradicional porque não dá pra viver de sonho. Estou cantando em inglês, mas metade desse novo disco é instrumental, comigo tocando gaita, com baixo acústico, dobro, escovinha, som tradicional. Quero mostrar o lado do Sérgio Duarte instrumentista até para abrir outras portas.

EM – Mas esse projeto com sanfona, triângulo, violão acústico e guitarra está na contramão de tudo isso que você está falando.
SD –
Na verdade esse projeto nasceu com meu amigo Ricardo Vignini, da banda Matuto Moderno, que mistura rock com regional. Fizemos um projeto chamado Blues Latino porque a gente já sacava que a escala das músicas nordestinas é parecida com a escala pentatônica. Que o solo da viola era com as mesmas cinco notas da guitarra. Começamos a fazer um world blues, o encontro do Tião Carreiro com o Robert Johnson. As notas são as mesmas, mas os andamentos dos compassos é que são diferentes. O Sesc nos convidou para um projeto de blues latino com bandas do Chile, Bolívia, Cuba e a nós do Brasil. Compus três blues para esse trabalho, com levadas de baião, uma delas se chama Homem Pra Casar. Trago influência das coisas que toquei. O rock, a gaita MPB, o contrabaixo abriram o leque para esse som diferente. Até hoje sou chamado para gravações que os outros não resolvem.


EM - Você passou pela cena nos anos 90 e 2000. Hoje é um dos veteranos na gaita blues no Brasil. Como vê a cena desse instrumento hoje?
SD –
Vou falar pra você a real. No começo havia o Flávio no Rio e eu em São Paulo. Todo mundo que estudou gaita blues e está aí até hoje fui o maior incentivador porque foram meus alunos: Big Chico, Robson Fernandes, Ivan Márcio. O Ivan estudou pela minha apostila porque naquela época não tinha material. Gravei três vídeos aulas da série Aprenda Música. Em 93/94, ainda estava cabeludo (risos). Hoje em dia todos têm equipamentos, blogs, sites, um é especialista não sei do que, o outro de outra coisa. Acho maravilhoso. Tem mais competitividade, mas pelo menos existe um mercado. Eu que vi o nada e ver que hoje tem até luthier. De madrugada os caras me pedem aula, método, estou sempre vendendo alguma coisa. Hoje sou reconhecido no Brasil inteiro e isso é muito bom. Não é pelo dinheiro que a gente não ganha mesmo. Com esse processo de internet e globalização os caras passam por cima dos pioneiros. Com a internet os caras já se acham bons, têm método, vídeo aula e não passou por todo aquele processo que eu e o Flávio passamos. Foi uma carga mais pesada. O festival do Flávio ajudou muito, já toquei três vezes toquei no primeiro com o Mark Hummel, ano retrasado abrindo para o Rick Estrin e ano passado me chamou para o Gaita SP com o Róbson e o Daniel Granado. 

EM – O que você tem mais facilidade em fazer: tocar, compor, produzir ou cantar?
SD –
Acho mais difícil compor. Depois de 20 anos tenho mais fluência em tocar um estilo que me sinto bem. Agora sempre estou buscando compor alguma coisa boa, com arranjos legais para a gaita. O cantar... até um tempo atrás não me considerava cantor. Hoje estou mais seguro quanto a isso. O mais difícil é compor uma boa letra, com arranjos bacanas. Às vezes com poucas notas você toca mais as pessoas do que quando quer mostrar todo o seu virtuosismo. As notas tocam as pessoas, aprendi que o menos é mais, a simplicidade. Você vê na reação do público.

EM – O disco Acoustic Blues Harp acaba de sair e gostaria que você falasse sobre ele.
SD –
É a sequência do meu trabalho com a Entidade Joe que virou Sérgio Duarte Blues Band. Será lançado no Brasil, Estados Unidos e Europa simultaneamente. Os antigos parceiros participam de algumas músicas, mas agora é um trabalho próprio, voltado ao blues tradicional. Trazendo a experiência de vinte e cinco anos tocando gaita, com a sonoridade dos anos 30/40. Tem seis músicas minhas. E o selo Chico Blues conseguiu liberar três clássicos do blues, Little Red Rooster (Howlin’ Wolf), Blow Wind Blow (Muddy Waters) e Worried Life Blues (Louis Parker). As letras foram feitas em parceria com o Celso Salim que já morou lá fora e com a ajuda do meu amigo Todd Murphy que de umas opiniões.


quinta-feira, 3 de abril de 2014

A música de Adriano Grineberg rompe as fronteiras entre Brasil, Índia e África


Fotos: Leandro Amaral e divulgação
Texto: Eugênio Martins Júnior

Adriano Grineberg começou seu aprendizado na música erudita, mas logo a família percebeu que o garoto tinha facilidade para todo tipo de gênero musical.
O investimento deu certo, hoje Adriano é um dos pianistas mais solicitados pelos músicos de São Paulo. Além de ter tocado em muitos discos de blueseiros brasileiros e acompanhado no palco outros tantos estrangeiros, entre eles, Magic Slim, Corey Harris, Big Time Sarah e Shirley King (essa última na minha conta), o músico paulistano tocou também com o Ira, Graça Cunha, Wanderléia, Ana Cañas e atualmente acompanha a revelação da MPB Filipe Catto.  
Na verdade, Adriano é um artista de mil faces. Um dos maiores especialistas no órgão Hammond B3 no Brasil, desenvolve uma incansável pesquisa de ritmos que não se limita às fronteiras nacionais. Ele e o guitarrista Edu Gomes, que por sua vez integra a Irmandade do Blues, viajam à Índia regularmente e são responsáveis por diversos discos de world music, new age e blues lançados no Brasil nos últimos 15 anos.
Em uma época em que meia dúzia de lunáticos reivindica a hegemonia do blues no Brasil, o conceito de seu mais recente trabalho, o CD Blues For Africa, faz uma viagem ao mundo da música negra e mostra que tudo está mais misturado do que, às vezes, podemos perceber. Essa caminhada começa em Key Blues, disco de clássicos norte-americano, e termina nos quatorze temas de Blues for Africa.



Eugênio Martins Júnior – Como foi a tua infância musical e quando começou a tocar piano?
Adriano Grineberg –
Comecei a tocar aos cinco anos. O piano surgiu na minha vida pela dificuldade nos esportes. Minha mãe tocava em um piano que ficava na marcenaria do meu pai. Comecei a fazer aulas e aquilo realmente passou a fazer parte da minha vida. Tinha muita facilidade em tirar música de ouvido. E ter estudado música clássica foi uma coisa muito importante para adquirir técnica, até para poder fazer outras coisas. Aos doze anos comecei aprender contrabaixo. Por sorte o meu professor era músico de orquestra, foi a pessoa que incentivou a ser músico, a estudar. Fiz meu pai gastar as economias dele e comprar um contrabaixo acústico e dediquei toda a minha adolescência a fazer testes para orquestra. Era aquele esquema, estudar oito horas por dia sem parar. Entrei na Orquestra Sinfônica Jovem do Estado como contrabaixista, mas não deixei de estudar piano. Formei-me em música na Escola Municipal de São Paulo, onde você tinha de tocar piano e um instrumento adicional. Até os 18 anos vivi na música clássica, mas sempre toquei outras coisas. O blues já havia surgido na minha vida.

EM – Quanto tempo você ficou na orquestra?
AG –
Fiquei três anos. Quando ia passar para a Orquestra profissional tive de fazer uma escolha de caminho. Na época as orquestras não pagavam bem os músicos, foi uma escolha definitiva na minha vida. Havia começado a tocar com o JJ Jackson em shows pelo Brasil e depois gravaria seu CD pela Eldorado, foi o primeiro disco que gravei. A questão financeira foi o fiel da balança.       

EM – E o blues, como entrou na sua vida definitivamente?
AG –
Como todos os brancos na América do Sul, pelo rock. Meu irmão era metaleiro e eu já convivia com Iron Maiden, AC/DC, Motorhead e sempre gostei. Havia um programa na TV Cultura chamado Som Pop e outro em outra emissora chamado Realce Baby. Às vezes o Som Pop fazia uns especiais com blues onde vi o B.B. King pela primeira vez, acho que em 1985. E ele balançava a cabeça e eu achava que ele imitava o Angus Young (risos).
Também virei ouvinte do programa do Jô Soares na Rádio Eldorado, mas pra valer foi em 1990. Meu irmão Sandro, que hoje é baterista da minha banda, ganhou uns convites para assistir o Blues Festival no Ginásio do Ibirapuera. Foi na última noite do festival, uma noite antológica com a Brazilian Blues All Stars, banda formada pelo André Christovam, Frejat, Flávio Guimarães, Greg Wilson, Paulo Zinner, Nelson Brito, uma jam session que terminou com o Ed Motta cantando Rock Me Baby. Na sequência foi a Koko Taylor. O engraçado é que naquela noite eu não entendo o show, achei muito parado, minha referência era mais roqueira. É claro que depois de anos reconheci o valor, era um tremendo show de Chicago blues. Gostaria de ter assistido esse show uns 15 anos depois. O grande momento da noite foi o Magic Slim que fez o mesmo Chicago blues. Mas aquele músico tem uma atmosfera, uma aura diferente. Ele fez um solo de uma nota só e quando acenderam as luzes do ginásio as pessoas ovacionavam como se ele tivesse acabado de fazer um gol. Depois daquilo eu pensei: “Humm, acho que vou tocar blues”.
No show do Magic Slim que você produziu em 2007 e que eu toquei, contei essa história pra ele que realmente se emocionou. Fazer esse show com ele foi uma realização e gravar o DVD depois também. Ele é um cara muito humilde, família, chega no horário. Um cara que ensina muito mais do que música às pessoas. E depois fui tocar na banda do JJ Jackson que é meu amigo até hoje. Foi o trabalho que me fez entrar definitivamente na música.


EM – Quanto tempo você esteve na banda de Jackson?
AG –
Entre 92 e 95. Depois ele deu um tempo na carreira, mas eu já conhecia a galera do blues. Fiquei amigo dos caras da Irmandade do Blues, o Vasco Faé, o Edu Gomes. Num desses encontros conheci o Lancaster e fiquei três anos em sua banda, gravando dois discos. O Lancatster revolucionou a forma de fazer blues. Ele tinha uma preocupação com a roupa, a estética. Ele foi muito feliz em seu primeiro disco, tem arranjos do Proveta. Antes de entrar no Chicago blues ele abordava vários estilos. Seu baterista era o Tuto Ferraz, um monstro no instrumento. Quando conheci o Lancaster, comecei a perceber como um músico deve gerenciar sua carreira.

EM – Você é um dos raros músicos que se dedica ao órgão Hammond B3 no Brasil, como se interessou pelo instrumento?
AG –
Toco os dois, Hammond e piano. Engraçado que quando toco Hammond em meu trabalho solo não consigo cantar. O Hammond faz uma função parecida com os metais, então eu preciso de um instrumento mais percussivo, onde fico batucando pra me acompanhar (risos). No começo nem sabia que o Hammond tinha aquele sistema de chaves, ouvia e ficava pensando, como o cara consegue “molhar” o timbre dessa forma? Mudar o som no meio da música? O Hammond entra justamente em uma das turnês do Lancaster. Uma das primeiras experiências de trazer um americano pra tocar aqui, o Deacon Jones. Fizemos cinco shows em 1995 e pude ver como ele trabalhava. Vi como ele manipulava o sistema de drawbars, usando uma caixa Leslie que pode ficar estática ou em movimento. O legal é que eu tocava junto com ele, não precisava descer do palco. Fazíamos como as bandas americanas fazem com piano e Hammond juntos. Atualmente os discos do Adriano Quarteto que gravo em estúdio são com os dois instrumentos, claro, faço um overdub aqui e ali. E o Deacon tem a experiência de ter trocado com o Freddie King, John Lee Hooker, além de ser uma grande pessoa.       

EM – Vejo que você grava e toca bastante com músicos de diferentes estilos, gostaria que falasse sobre essa vida de sideman.
AG –
É uma coisa que acostumei fazer e não consigo me imaginar não sendo sideman. É uma coisa que me faz bem. Acho que os trabalhos se completam. A Wanderléia está fazendo um show comemorando cinqüenta anos de carreira e vai regravar o lado B da Jovem Guarda. É um repertório riquíssimo e que não fez sucesso. Ela curte justamente essa pegada blueseira do Hammond. Estamos fazendo uma releitura dessa forma mais estilizada. Ela está realizando o que realmente sempre quis fazer. E vê-la subir ao palco com aquela vontade me faz pensar que para ser músico você não tem de só tocar bem seu instrumento, você tem de passar uma mensagem para as pessoas e é o que ela faz.



EM – E com relação ao Filipe Catto é o inverso. Ele está chegando agora.
AG –
Exatamente. Quando parei de tocar com a Ana Cañas achava que seria a última artista nova que ia acompanhar. O Filipe foi uma surpresa, ele é a nova MPB, mais até do que a Ana Cañas. Então o Filipe Catto é um desafio, você tem de estar sempre renovando na linguagem, timbres, é um trabalho que não tem limites. Sou também sua segunda voz, todas as coisas que eu pesquiso acabo utilizando lá. Ele tem só vinte e cinco anos. É um artista muito novo pra colher o que está colhendo. Me faz bem, chego renovado para fazer o meu trabalho. Quando você toca com um artista não se preocupa com produção, é outra viagem.

EM – Dá muito trabalho gerenciar a própria carreira?
AG –
Muito trabalho. Muito mais do que tocar. Vender show é fácil, o problema é fazer a pré-produção. A parte burocrática, divulgação, passar as informações para a sua equipe.

EM - Você já viajou várias vezes à Índia e África, isso hoje faz parte da tua música. Fale um pouco sobre isso.
AG –
Acabam sendo a mesma experiência. Todas as vezes que fui à Índia, fiquei sempre uma semana de passagem na África, Angola e África do Sul. Sempre fiz um trabalho de pesquisa de músicas étnicas do mundo inteiro. Sempre fui muito ligado à filosofia e existe uma proximidade entre as duas culturas. Por exemplo, o vodu que foi desenvolvido na África e foi para a América Central nasceu na Índia. Em um estado chamado Gujarat. Tornei-me cantor entoando mantras na ioga tardiamente, aos 25 anos. Existe uma forma de cantar e a partir disso descobri a minha voz.
Eu, o Edu Gomes, o Edson Aquino e o percussionista Renato Martins, que hoje mora na Bélgica, nos juntamos para fazer um disco de músicas indianas, mas com características brasileiras. Em vez de tabla, usávamos moringa; eu fiquei responsável pela harmonização, dos arranjos; o Edu substituiu a cítara pela slide. Recriamos essas histórias. Existem músicas nesse CD que são devocionais, para Ganesha, Shiva, Krishna e outras divindades hindus e músicas profanas também. Fizemos um retrato da Índia. Esse disco foi lançado lá em 2004, antes de ser lançado no Brasil, em 2007.  



EM – E como foi a receptividade?
AG –
Foi boa. O indiano tem a sensibilidade muito grande e eles não se sentem donos daquela cultura. Existe um pensamento milenar que aquilo que foi feito e concluído na Índia são fragmentos de coisas universais. Eles enxergam a cultura deles na prática de outras culturas. Em questão de latitude, a distância da Índia para o Equador é a mesma que o Nordeste brasileiro, às vezes você está lá e pensa que está em Maceió, é cheio de coqueiros, o clima é muito parecido, o tempero, a pimenta, o uso do coco na culinária. Por isso eles não se surpreenderam com o CD.

EM – Você chegou a apresentar o trabalho lá?
AG –
Apresentei algumas vezes, tocamos no aniversário do guru Sai Baba. Mandamos o CD e ele nos convidou pra fazer o lançamento com tudo pago por sua organização. Deixamos lá alguns CDs que seriam vendidos em trabalhos filantrópicos. Mas foi uma festa, na Índia não existe tanta violência, o povo é um pouco mais tranqüilo. Acho que eles já passaram por mais coisas, existe uma unidade entre o mais rico e o mais pobre.

EM – Não estou querendo te contrariar, mas as notícias que a gente tem da Índia é de um país beligerante, o país tem bombas nucleares e os homens praticam estupro coletivo e outras coisas.
AG –
Você está certíssimo. A Índia não se preparou ao longo das décadas para essa abertura que o mundo está vivendo. A primeira vez que estive na Índia foi em 95 e era um país super rígido. Esse lance de um cara conhecer uma menina é muito diferente do que aqui. Em todos os lugares há separação de homens e mulheres. Ao mesmo tempo é um povo muito sensual, inclusive na música. Outra coisa que atrapalha muito a Índia é o sistema de castas, uma coisa colocada pelos ingleses. Antes do domínio inglês o sistema de castas era por funções, casta dos músicos, economistas, soldados. Para exercer seu domínio em um país tão grande, a coroa britânica separou em quatro castas e isso causou um atraso social muito grande. A terceira vez que voltei pra lá, em 2004, para o lançamento do Vera Mantra, liguei na MTV e tinha uma banda parecida com o É o Tcham, com uma menina rebolando e tal, parecia até que tava dançando na boquinha da garrafa. Então, não sei como vai ser esse povo lidando com isso. A questão dos estupros coletivos não me surpreende e acho que pode se tornar pior.



EM – Vamos para a África. Como nasceu o Blues For Africa?
AG –
O meu primeiro contato foi através daqueles corais de música gospel da África do Sul, que é o país africano que eu conheço melhor. O que me chama a atenção é a questão filosófica. Os artistas africanos tentam passar o lado positivo de uma coisa que aparentemente não tem lado positivo. Falar sobre a África é falar sobre sofrimento, guerras, mas que por trás disso existe um povo que é alegre. Isso é do blues, rir da sua própria desgraça. A coisa mais africana que existe no blues é isso. Você não está bem, mas tudo bem. O brasileiro também é assim, herdamos isso dos africanos. Musicalmente falando, há a minha experiência com os artistas. A primeira foi o Corey Harris, que acompanhei em 2003 e tenho o sonho de acompanhar de novo. A maneira como ele tratava as combinações, incluindo o reggae, os ritmos da América Central, foi uma influência direta. A outra foi o Marku Ribas, com quem tive a chance de fazer alguns shows antes de ele falecer ano passado. Pra quem não sabe, o Marku Ribas é um compositor ator, participou do Macunaíma, autor da música Zamba Bem, um cara revolucionário em seu tempo, anos 70. Ele tinha flerte direto com a música africana. Quando falei que tinha um trabalho de blues e que tinha admiração por ele, ele me disse com aquele jeitão dele de ator: “Porque você não faz um trabalho com o blues africano, é tudo a mesma coisa”. O CD abre com Iko Iko, do Mardi Gras de New Orleans, que tem uma ligação direta com a cultura creole, a porta da África. Pesquisei a música sul-africana, com a qual tive contato maior pela língua zulu dos corais. Conforme ouvia a melodia, a versão já ia ficando pronta. Não foi um trabalho fácil, mas foi feito com muita naturalidade.

EM – Entre o período de pesquisa, desenvolvimento e gravação, quanto tempo levou para esse trabalho ficar pronto?
AG –
Uns dez anos. Ia acrescentando músicas. Após o Key Blues, queria fazer um disco mais world music, mas só com três músicas africanas. Mas aí o Edu Gomes, que é meu parceiro e produz, achou que eu tinha de fazer um disco inteiro já que tinha dezenove músicas. O disco começou a tomar forma. Das dezenove, ficaram quatorze. Onze versões e três compostas por mim em dialetos africanos, além do Zulu, o Bembe em uma música tradicional da Zâmbia, uma espécie de hino do país. Para muitas dessas músicas não existem traduções. Você fala uma palavra e representa uma frase, é muito complexo. Por exemplo, Jingoloba, do Santana em Iorubá, da Nigéria, significa remelexo. Tem outra em Ioruba que é minha, Olodumare, uma referência aos orixás, tem berimbau, trazendo a coisa aqui para o Brasil. Tenho uma composição em Ibó, que é outra tribo da Nigéria e com a participação do Rex Thomas que é nigeriano. Ele nem é músico profissional, mas compõe músicas, é educador, mora em Alto Paraíso. A gente compôs Ekenemu Uwa que é uma mensagem de felicidade, de coisa boa para as outras pessoas. Tuareg Blues também é minha, em homenagem ao povo tuaregue que não tem fronteiras. Eu canto em inglês e o Edu Gomes faz um violão puxando para o árabe. Tem muita mistura nesse disco.