sexta-feira, 11 de abril de 2014

Fenômeno da internet, A Banda Mais Bonita da Cidade traz a Santos o show O Mais Feliz da Vida


Composta por Uyara Torrente (vocal), Thiago Ramalho (guitarra), Vinícius Nisi (teclado), Marano (baixo) e Luís Bourscheidt (bateria), a banda mostra amadurecimento musical e mudança de rumo em seu segundo disco. Produção Mannish Blog e Lucas Shows e Eventos
 
 
A Banda Mais Bonita da Cidade teve sua carreira propagada após a viralização do vídeo Oração, em 2011, e atualmente está em turnê nacional divulgando seu segundo álbum “O Mais Feliz da Vida”. Muito bem recebido pela crítica e pelo público, o álbum traz a atmosfera já consagrada dos seus shows para um disco de estúdio.
Começando em 2009 sem grandes pretensões, A Banda Mais Bonita da Cidade nasceu da vontade de reinterpretar as canções que amava. Teve sua carreira propagada após publicar na internet seu vídeo “Oração” em 2011 (um dos mais vistos em todo o mundo) e gravou seu primeiro disco pelo sistema de crowdfunding, conceito pouco conhecido no Brasil na época. Atualmente, a banda trabalha na Turnê de lançamento do segundo disco de estúdio: O Mais Feliz da Vida.
Nesse novo álbum, a banda apresenta um registro maduro, sugerindo uma mudança sonora sem abrir mão de suas principais características e trazendo para o estúdio a atmosfera já consagrada dos seus shows.

Serviço:
Show: A Banda Mais Bonita da Cidade
Local: Teatro Coliseu de Santos
Data: 15 de maio de 2014
Horário: 21 horas
Endereço: Rua Amador Bueno, 237 - Centro - Santos – SP
Ingressos: À venda na bilheteria do Teatro Coliseu, pelo telefone (13) 4062 0016 e pelo site: http://www.compreingressos.com/

Primeiro lote (300 ingressos)
R$ 60,00 - Inteira
R$ 30,00 - Meia

Segundo lote
R$ 80,00 - Inteira
R$ 40,00 - Meia
Ficha Técnica

Produção: Lucas Shows e Eventos e Mannish Boy Produções Artísticas
Apoio: Conceituall
 

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Sérgio Duarte corrige rota e dá uma aula de harmônica em Acoustic Blues Harp


Texto e fotos: Eugênio Martins Júnior

Ao lado de Flávio Guimarães, Sérgio Duarte é um dos pilares da gaita blues no Brasil. Já abriu show de Buddy Guy e teve aulas de harmônica com James Cotton e Willian Clarke. Coisa para poucos.
Por sua vez, ajudou a formar gaitistas atuantes na cena blueseira brasileira, entre eles, Róbson Fernandes, Ivan Márcio e Big Chico.
Após dois discos lançados com a banda Entidade Joe, Sérgio Duarte e Entidade Joe e Destilado’n’Blues, e participações em gravações de inúmeros artistas, o gaitista veterano parte para uma nova fase na carreira.
Acoustic Blues Harp, seu terceiro disco, traz o melhor blues tradicional que o Brasil pode exportar ao mundo. São 13 temas, três clássicos do blues norte-americano e dez composições próprias, todos gravados em São Paulo com seu time titular, Celso Salim (guitarra) e Rodrigo Mantovani (baixo). De quebra, apresenta seu filho Leo Duarte (guitarra).
É um grande disco. Sérgio Duarte explora caminhos onde só os mestres conseguem ir, com timbres limpos e técnica impecável. Com esse CD, Sérgio Duarte iguala os feitos de Flávio Guimarães e Alamo Leal em Ain’t No Stranger Here e Ivan Márcio e Jon McDonald com Chicago Blues Sessions Vol. 2. Ou seja, o grande blues tradicional com a harmônica limpa, como era no começo de tudo, como as grandes duplas de country blues.
O trabalho de pesquisa que mistura blues com ritmos nordestinos e regionais, outra característica do gaitista paulistano, continua. Essa entrevista foi realizada em um dia especial, pouco antes de Sérgio Duarte subir ao palco do Sesc Santos com o show magistral: Entre o Blues e o Baião. Com as participações do guitarrista e violonista Luiz Waack e do sanfoneiro Antonio Bombarda. As fotos estão aí pra ilustrar essa matéria.



Eugênio Martins Júnior – Como começou a tua vida musical?
Sérgio Duarte –
Foi aos doze anos. Gostava de escrever poesia e de escutar rock e blues, com o dinheiro de aniversário de treze anos comprei um violão e comecei a aprender a tocar sozinho, com as revistinhas ou com amigos que já tocavam. Depois de um ano e meio, comecei tocar com amigos, mas mudei para o contrabaixo. Nunca mais parei. Tocava rock pesado e rock and roll nacional. Era uma banda chamada Tomate Inglês que teve clip na MTV com uma música minha chamada Fogo no Bordel.

EM – E a gaita, como apareceu?
SD –
Eu gostava de acampar em Minas e levava violão e tocava. Fui a uma caverna onde tinha um hippie tocando lá no fundo. Segui o som e chegando lá perguntei o que era aquilo. Ele me disse que era uma gaita especial para tocar blues, uma Hohner. Me apaixonei pelo som e quando voltei para São Paulo fui procurar uma gaita daquela. Mas não existia gaita Hohner no Brasil, só Hering.

EM – O cara da caverna mandava bem?
SD –
Eu não sabia tocar nada, pra mim era maravilhoso. Pensei, a próxima viagem que fizer vou levar o violão e a gaita. Comprei uma Hering nas casas Manon, na 24 de maio, Centro de São Paulo. Produtos importados naquela época, final dos anos 80, eram raridades. Depois tive acesso porque meu pai trabalhava nos Estados Unidos. No próximo acampamento, levei uma gaita em Mi. O pessoal gostou e meu interesse pelo instrumento aumentou. Passei a transpor o meu conhecimento do contrabaixo para a gaita. Em uma das viagens aos Estados Unidos, meu pai trouxe um método que vinha o desenho da gaita com todas as notas, explicando com fazia os bends, como fabricar aquelas notas.  A partir daí criei uma tabela para estudar através do contrabaixo. Sozinho, naquela época não havia professores. Tinha o Clayber (de Souza), o Clay Willians e o Maurício (Einhorn) que tocavam cromática e sempre falavam mal da gaita diatônica: “Ahhh, isso aí é brinquedo, isso aí não é gaita”. Eu dizia que eles não haviam escutado Sonny Boy, Little Walter. “Aquele barulho de gaita com amplificador?”. Os caras eram radicais. Conheci muita coisa graças ao Cidão Aparecido que era um colecionador de discos de blues. Ele me levava as fitas cassetes, “esse aqui é James Cotton, esse aqui é não sei o que”. Ouvindo aqueles sons e o meu conhecimento musical, criei um método que tenho até hoje. Também estudava os métodos de guitarra, Fly Fingers, Play Alone Blues, com riffs de blues na guitarra que eu transpunha para a gaita, notas, frases, tudo. No começo passei a ser um virtuoso. Tinha muita técnica, virei um gaitarrista, estava em uma banda de rock e nessa vibe de velocidade.


EM - E o primeiro contato com o Blues, quando se deu realmente?
SD –
Sonny Boy Willianson e Yardbirds. Também Blues Etílicos e Atlântico Blues, que eram os discos que existiam na época.

EM – Nessa época começou a sair muita coisa por aqui. Lembra da série da Atlantic que foi lançada nos anos 80?
SD –
Sim, Piano Blues, Gaita Blues, aquelas capas são maravilhosas. Aquilo foi uma escola, tive todos. Eu ficava tocando em cima das músicas que não tinham gaita. Estudando as escalas que estava tentando fazer. Cheguei a um nível que comecei a me achar limitado. Precisava achar um gaitista que me ensinasse a tocar. Fui para a Califórnia atrás do James Cotton e do Willian Clarke. Falei que precisa ir e meu pai me ajudou. A minha irmã havia cursado várias faculdades e eu sempre fui a ovelha negra da família (risos). Disse que ia para estudar. Meu pai pagou a passagem e eu limpei vidro, entreguei pizza, fazia várias coisas. Ia aos bares e conheci o James Cotton. Carregava a mochila dele e ia pra cima e pra baixo com os caras pedindo para ter aulas. O Cotton falou pra eu levar uma garrafa de bourbon ao seu apartamento e pediu sessenta dólares pela aula. Era pra eu ficar uma hora, mas fiquei até a madrugada. E aí ficamos bêbados e ele começou a tocar, falar do Little Walter e a mostrar as técnicas de tongue blocking que não eram conhecidas no Brasil. Colocou a gaita ao contrário e eu com aquela cara:”Tá ao contrário”. Ele pegou colocou a gaita ao contrario na boca e tocou pra caramba. Ele falou pra mim que se você toca de língua toca de qualquer lado. Tudo que eu achei que sabia foi por água abaixo. Fazia aulas de gaita cromática com o Clayber e tocava chorinho, bossa nova e sei tocar até hoje, então cheguei lá dizendo que já tocava. Os caras gostavam. Mas a melhor coisa que aconteceu foi que o Clarke e o Cotton me disseram, “Cara você não toca porra nenhuma”. Me destruíram.

EM – Você também teve uma aula com o Willian Clarke?
SD –
Sim, bastante aula de cromática.



EM – Qual foi a coisa mais importante que você aprendeu com eles?
SD –
Foi a desconstrução do meu conceito e trocar a embocadura de bico pela de língua que era uma técnica que no Brasil os caras falam que é viagem, mas que o gringos chamam de “side by side”, usando os dois cantos da boca, invertendo a língua de um lado a outro. Aos meus alunos aqui no Brasil eu chamo de inversão. Isso me chocou. Foram três a quatro anos pra começar a fazer. E nesse disco novo que eu vou conseguir mostrar o que aprendi lá.

EM – Você chama músicos que não tocam blues pra tocar nos teus discos. Usa o blues mais como base e não fica fechado só nisso. Fale um pouco sobre isso.
SD –
O cantor da banda de blues Entidade Joe saiu e me vi tendo que cantar e tocar gaita. Nesse processo, tive o sonho de fazer o blues virar o que virou o reggae e o rap que foram nacionalizados  e viraram grandes movimentos. Comecei a compor blues em português, na onda dos primeiros do Blues Etílicos e do André. Compus uma música chamada Vida de Poeta, que é um pouco Barão Vermelho, digamos, um pop blues, querendo popularizar. Insisti nisso até o segundo CD. O segundo muito mais elaborado, inclusive nas letras. Um disco muito bem gravado pelo Alexandre Fontanetti, que é primo da Rita Lee e produziu todo mundo. Até um tempo atrás tinha esse sonho. Agora estou no blues tradicional porque não dá pra viver de sonho. Estou cantando em inglês, mas metade desse novo disco é instrumental, comigo tocando gaita, com baixo acústico, dobro, escovinha, som tradicional. Quero mostrar o lado do Sérgio Duarte instrumentista até para abrir outras portas.

EM – Mas esse projeto com sanfona, triângulo, violão acústico e guitarra está na contramão de tudo isso que você está falando.
SD –
Na verdade esse projeto nasceu com meu amigo Ricardo Vignini, da banda Matuto Moderno, que mistura rock com regional. Fizemos um projeto chamado Blues Latino porque a gente já sacava que a escala das músicas nordestinas é parecida com a escala pentatônica. Que o solo da viola era com as mesmas cinco notas da guitarra. Começamos a fazer um world blues, o encontro do Tião Carreiro com o Robert Johnson. As notas são as mesmas, mas os andamentos dos compassos é que são diferentes. O Sesc nos convidou para um projeto de blues latino com bandas do Chile, Bolívia, Cuba e a nós do Brasil. Compus três blues para esse trabalho, com levadas de baião, uma delas se chama Homem Pra Casar. Trago influência das coisas que toquei. O rock, a gaita MPB, o contrabaixo abriram o leque para esse som diferente. Até hoje sou chamado para gravações que os outros não resolvem.


EM - Você passou pela cena nos anos 90 e 2000. Hoje é um dos veteranos na gaita blues no Brasil. Como vê a cena desse instrumento hoje?
SD –
Vou falar pra você a real. No começo havia o Flávio no Rio e eu em São Paulo. Todo mundo que estudou gaita blues e está aí até hoje fui o maior incentivador porque foram meus alunos: Big Chico, Robson Fernandes, Ivan Márcio. O Ivan estudou pela minha apostila porque naquela época não tinha material. Gravei três vídeos aulas da série Aprenda Música. Em 93/94, ainda estava cabeludo (risos). Hoje em dia todos têm equipamentos, blogs, sites, um é especialista não sei do que, o outro de outra coisa. Acho maravilhoso. Tem mais competitividade, mas pelo menos existe um mercado. Eu que vi o nada e ver que hoje tem até luthier. De madrugada os caras me pedem aula, método, estou sempre vendendo alguma coisa. Hoje sou reconhecido no Brasil inteiro e isso é muito bom. Não é pelo dinheiro que a gente não ganha mesmo. Com esse processo de internet e globalização os caras passam por cima dos pioneiros. Com a internet os caras já se acham bons, têm método, vídeo aula e não passou por todo aquele processo que eu e o Flávio passamos. Foi uma carga mais pesada. O festival do Flávio ajudou muito, já toquei três vezes toquei no primeiro com o Mark Hummel, ano retrasado abrindo para o Rick Estrin e ano passado me chamou para o Gaita SP com o Róbson e o Daniel Granado. 

EM – O que você tem mais facilidade em fazer: tocar, compor, produzir ou cantar?
SD –
Acho mais difícil compor. Depois de 20 anos tenho mais fluência em tocar um estilo que me sinto bem. Agora sempre estou buscando compor alguma coisa boa, com arranjos legais para a gaita. O cantar... até um tempo atrás não me considerava cantor. Hoje estou mais seguro quanto a isso. O mais difícil é compor uma boa letra, com arranjos bacanas. Às vezes com poucas notas você toca mais as pessoas do que quando quer mostrar todo o seu virtuosismo. As notas tocam as pessoas, aprendi que o menos é mais, a simplicidade. Você vê na reação do público.

EM – O disco Acoustic Blues Harp acaba de sair e gostaria que você falasse sobre ele.
SD –
É a sequência do meu trabalho com a Entidade Joe que virou Sérgio Duarte Blues Band. Será lançado no Brasil, Estados Unidos e Europa simultaneamente. Os antigos parceiros participam de algumas músicas, mas agora é um trabalho próprio, voltado ao blues tradicional. Trazendo a experiência de vinte e cinco anos tocando gaita, com a sonoridade dos anos 30/40. Tem seis músicas minhas. E o selo Chico Blues conseguiu liberar três clássicos do blues, Little Red Rooster (Howlin’ Wolf), Blow Wind Blow (Muddy Waters) e Worried Life Blues (Louis Parker). As letras foram feitas em parceria com o Celso Salim que já morou lá fora e com a ajuda do meu amigo Todd Murphy que de umas opiniões.


quinta-feira, 3 de abril de 2014

A música de Adriano Grineberg rompe as fronteiras entre Brasil, Índia e África


Fotos: Leandro Amaral e divulgação
Texto: Eugênio Martins Júnior

Adriano Grineberg começou seu aprendizado na música erudita, mas logo a família percebeu que o garoto tinha facilidade para todo tipo de gênero musical.
O investimento deu certo, hoje Adriano é um dos pianistas mais solicitados pelos músicos de São Paulo. Além de ter tocado em muitos discos de blueseiros brasileiros e acompanhado no palco outros tantos estrangeiros, entre eles, Magic Slim, Corey Harris, Big Time Sarah e Shirley King (essa última na minha conta), o músico paulistano tocou também com o Ira, Graça Cunha, Wanderléia, Ana Cañas e atualmente acompanha a revelação da MPB Filipe Catto.  
Na verdade, Adriano é um artista de mil faces. Um dos maiores especialistas no órgão Hammond B3 no Brasil, desenvolve uma incansável pesquisa de ritmos que não se limita às fronteiras nacionais. Ele e o guitarrista Edu Gomes, que por sua vez integra a Irmandade do Blues, viajam à Índia regularmente e são responsáveis por diversos discos de world music, new age e blues lançados no Brasil nos últimos 15 anos.
Em uma época em que meia dúzia de lunáticos reivindica a hegemonia do blues no Brasil, o conceito de seu mais recente trabalho, o CD Blues For Africa, faz uma viagem ao mundo da música negra e mostra que tudo está mais misturado do que, às vezes, podemos perceber. Essa caminhada começa em Key Blues, disco de clássicos norte-americano, e termina nos quatorze temas de Blues for Africa.



Eugênio Martins Júnior – Como foi a tua infância musical e quando começou a tocar piano?
Adriano Grineberg –
Comecei a tocar aos cinco anos. O piano surgiu na minha vida pela dificuldade nos esportes. Minha mãe tocava em um piano que ficava na marcenaria do meu pai. Comecei a fazer aulas e aquilo realmente passou a fazer parte da minha vida. Tinha muita facilidade em tirar música de ouvido. E ter estudado música clássica foi uma coisa muito importante para adquirir técnica, até para poder fazer outras coisas. Aos doze anos comecei aprender contrabaixo. Por sorte o meu professor era músico de orquestra, foi a pessoa que incentivou a ser músico, a estudar. Fiz meu pai gastar as economias dele e comprar um contrabaixo acústico e dediquei toda a minha adolescência a fazer testes para orquestra. Era aquele esquema, estudar oito horas por dia sem parar. Entrei na Orquestra Sinfônica Jovem do Estado como contrabaixista, mas não deixei de estudar piano. Formei-me em música na Escola Municipal de São Paulo, onde você tinha de tocar piano e um instrumento adicional. Até os 18 anos vivi na música clássica, mas sempre toquei outras coisas. O blues já havia surgido na minha vida.

EM – Quanto tempo você ficou na orquestra?
AG –
Fiquei três anos. Quando ia passar para a Orquestra profissional tive de fazer uma escolha de caminho. Na época as orquestras não pagavam bem os músicos, foi uma escolha definitiva na minha vida. Havia começado a tocar com o JJ Jackson em shows pelo Brasil e depois gravaria seu CD pela Eldorado, foi o primeiro disco que gravei. A questão financeira foi o fiel da balança.       

EM – E o blues, como entrou na sua vida definitivamente?
AG –
Como todos os brancos na América do Sul, pelo rock. Meu irmão era metaleiro e eu já convivia com Iron Maiden, AC/DC, Motorhead e sempre gostei. Havia um programa na TV Cultura chamado Som Pop e outro em outra emissora chamado Realce Baby. Às vezes o Som Pop fazia uns especiais com blues onde vi o B.B. King pela primeira vez, acho que em 1985. E ele balançava a cabeça e eu achava que ele imitava o Angus Young (risos).
Também virei ouvinte do programa do Jô Soares na Rádio Eldorado, mas pra valer foi em 1990. Meu irmão Sandro, que hoje é baterista da minha banda, ganhou uns convites para assistir o Blues Festival no Ginásio do Ibirapuera. Foi na última noite do festival, uma noite antológica com a Brazilian Blues All Stars, banda formada pelo André Christovam, Frejat, Flávio Guimarães, Greg Wilson, Paulo Zinner, Nelson Brito, uma jam session que terminou com o Ed Motta cantando Rock Me Baby. Na sequência foi a Koko Taylor. O engraçado é que naquela noite eu não entendo o show, achei muito parado, minha referência era mais roqueira. É claro que depois de anos reconheci o valor, era um tremendo show de Chicago blues. Gostaria de ter assistido esse show uns 15 anos depois. O grande momento da noite foi o Magic Slim que fez o mesmo Chicago blues. Mas aquele músico tem uma atmosfera, uma aura diferente. Ele fez um solo de uma nota só e quando acenderam as luzes do ginásio as pessoas ovacionavam como se ele tivesse acabado de fazer um gol. Depois daquilo eu pensei: “Humm, acho que vou tocar blues”.
No show do Magic Slim que você produziu em 2007 e que eu toquei, contei essa história pra ele que realmente se emocionou. Fazer esse show com ele foi uma realização e gravar o DVD depois também. Ele é um cara muito humilde, família, chega no horário. Um cara que ensina muito mais do que música às pessoas. E depois fui tocar na banda do JJ Jackson que é meu amigo até hoje. Foi o trabalho que me fez entrar definitivamente na música.


EM – Quanto tempo você esteve na banda de Jackson?
AG –
Entre 92 e 95. Depois ele deu um tempo na carreira, mas eu já conhecia a galera do blues. Fiquei amigo dos caras da Irmandade do Blues, o Vasco Faé, o Edu Gomes. Num desses encontros conheci o Lancaster e fiquei três anos em sua banda, gravando dois discos. O Lancatster revolucionou a forma de fazer blues. Ele tinha uma preocupação com a roupa, a estética. Ele foi muito feliz em seu primeiro disco, tem arranjos do Proveta. Antes de entrar no Chicago blues ele abordava vários estilos. Seu baterista era o Tuto Ferraz, um monstro no instrumento. Quando conheci o Lancaster, comecei a perceber como um músico deve gerenciar sua carreira.

EM – Você é um dos raros músicos que se dedica ao órgão Hammond B3 no Brasil, como se interessou pelo instrumento?
AG –
Toco os dois, Hammond e piano. Engraçado que quando toco Hammond em meu trabalho solo não consigo cantar. O Hammond faz uma função parecida com os metais, então eu preciso de um instrumento mais percussivo, onde fico batucando pra me acompanhar (risos). No começo nem sabia que o Hammond tinha aquele sistema de chaves, ouvia e ficava pensando, como o cara consegue “molhar” o timbre dessa forma? Mudar o som no meio da música? O Hammond entra justamente em uma das turnês do Lancaster. Uma das primeiras experiências de trazer um americano pra tocar aqui, o Deacon Jones. Fizemos cinco shows em 1995 e pude ver como ele trabalhava. Vi como ele manipulava o sistema de drawbars, usando uma caixa Leslie que pode ficar estática ou em movimento. O legal é que eu tocava junto com ele, não precisava descer do palco. Fazíamos como as bandas americanas fazem com piano e Hammond juntos. Atualmente os discos do Adriano Quarteto que gravo em estúdio são com os dois instrumentos, claro, faço um overdub aqui e ali. E o Deacon tem a experiência de ter trocado com o Freddie King, John Lee Hooker, além de ser uma grande pessoa.       

EM – Vejo que você grava e toca bastante com músicos de diferentes estilos, gostaria que falasse sobre essa vida de sideman.
AG –
É uma coisa que acostumei fazer e não consigo me imaginar não sendo sideman. É uma coisa que me faz bem. Acho que os trabalhos se completam. A Wanderléia está fazendo um show comemorando cinqüenta anos de carreira e vai regravar o lado B da Jovem Guarda. É um repertório riquíssimo e que não fez sucesso. Ela curte justamente essa pegada blueseira do Hammond. Estamos fazendo uma releitura dessa forma mais estilizada. Ela está realizando o que realmente sempre quis fazer. E vê-la subir ao palco com aquela vontade me faz pensar que para ser músico você não tem de só tocar bem seu instrumento, você tem de passar uma mensagem para as pessoas e é o que ela faz.



EM – E com relação ao Filipe Catto é o inverso. Ele está chegando agora.
AG –
Exatamente. Quando parei de tocar com a Ana Cañas achava que seria a última artista nova que ia acompanhar. O Filipe foi uma surpresa, ele é a nova MPB, mais até do que a Ana Cañas. Então o Filipe Catto é um desafio, você tem de estar sempre renovando na linguagem, timbres, é um trabalho que não tem limites. Sou também sua segunda voz, todas as coisas que eu pesquiso acabo utilizando lá. Ele tem só vinte e cinco anos. É um artista muito novo pra colher o que está colhendo. Me faz bem, chego renovado para fazer o meu trabalho. Quando você toca com um artista não se preocupa com produção, é outra viagem.

EM – Dá muito trabalho gerenciar a própria carreira?
AG –
Muito trabalho. Muito mais do que tocar. Vender show é fácil, o problema é fazer a pré-produção. A parte burocrática, divulgação, passar as informações para a sua equipe.

EM - Você já viajou várias vezes à Índia e África, isso hoje faz parte da tua música. Fale um pouco sobre isso.
AG –
Acabam sendo a mesma experiência. Todas as vezes que fui à Índia, fiquei sempre uma semana de passagem na África, Angola e África do Sul. Sempre fiz um trabalho de pesquisa de músicas étnicas do mundo inteiro. Sempre fui muito ligado à filosofia e existe uma proximidade entre as duas culturas. Por exemplo, o vodu que foi desenvolvido na África e foi para a América Central nasceu na Índia. Em um estado chamado Gujarat. Tornei-me cantor entoando mantras na ioga tardiamente, aos 25 anos. Existe uma forma de cantar e a partir disso descobri a minha voz.
Eu, o Edu Gomes, o Edson Aquino e o percussionista Renato Martins, que hoje mora na Bélgica, nos juntamos para fazer um disco de músicas indianas, mas com características brasileiras. Em vez de tabla, usávamos moringa; eu fiquei responsável pela harmonização, dos arranjos; o Edu substituiu a cítara pela slide. Recriamos essas histórias. Existem músicas nesse CD que são devocionais, para Ganesha, Shiva, Krishna e outras divindades hindus e músicas profanas também. Fizemos um retrato da Índia. Esse disco foi lançado lá em 2004, antes de ser lançado no Brasil, em 2007.  



EM – E como foi a receptividade?
AG –
Foi boa. O indiano tem a sensibilidade muito grande e eles não se sentem donos daquela cultura. Existe um pensamento milenar que aquilo que foi feito e concluído na Índia são fragmentos de coisas universais. Eles enxergam a cultura deles na prática de outras culturas. Em questão de latitude, a distância da Índia para o Equador é a mesma que o Nordeste brasileiro, às vezes você está lá e pensa que está em Maceió, é cheio de coqueiros, o clima é muito parecido, o tempero, a pimenta, o uso do coco na culinária. Por isso eles não se surpreenderam com o CD.

EM – Você chegou a apresentar o trabalho lá?
AG –
Apresentei algumas vezes, tocamos no aniversário do guru Sai Baba. Mandamos o CD e ele nos convidou pra fazer o lançamento com tudo pago por sua organização. Deixamos lá alguns CDs que seriam vendidos em trabalhos filantrópicos. Mas foi uma festa, na Índia não existe tanta violência, o povo é um pouco mais tranqüilo. Acho que eles já passaram por mais coisas, existe uma unidade entre o mais rico e o mais pobre.

EM – Não estou querendo te contrariar, mas as notícias que a gente tem da Índia é de um país beligerante, o país tem bombas nucleares e os homens praticam estupro coletivo e outras coisas.
AG –
Você está certíssimo. A Índia não se preparou ao longo das décadas para essa abertura que o mundo está vivendo. A primeira vez que estive na Índia foi em 95 e era um país super rígido. Esse lance de um cara conhecer uma menina é muito diferente do que aqui. Em todos os lugares há separação de homens e mulheres. Ao mesmo tempo é um povo muito sensual, inclusive na música. Outra coisa que atrapalha muito a Índia é o sistema de castas, uma coisa colocada pelos ingleses. Antes do domínio inglês o sistema de castas era por funções, casta dos músicos, economistas, soldados. Para exercer seu domínio em um país tão grande, a coroa britânica separou em quatro castas e isso causou um atraso social muito grande. A terceira vez que voltei pra lá, em 2004, para o lançamento do Vera Mantra, liguei na MTV e tinha uma banda parecida com o É o Tcham, com uma menina rebolando e tal, parecia até que tava dançando na boquinha da garrafa. Então, não sei como vai ser esse povo lidando com isso. A questão dos estupros coletivos não me surpreende e acho que pode se tornar pior.



EM – Vamos para a África. Como nasceu o Blues For Africa?
AG –
O meu primeiro contato foi através daqueles corais de música gospel da África do Sul, que é o país africano que eu conheço melhor. O que me chama a atenção é a questão filosófica. Os artistas africanos tentam passar o lado positivo de uma coisa que aparentemente não tem lado positivo. Falar sobre a África é falar sobre sofrimento, guerras, mas que por trás disso existe um povo que é alegre. Isso é do blues, rir da sua própria desgraça. A coisa mais africana que existe no blues é isso. Você não está bem, mas tudo bem. O brasileiro também é assim, herdamos isso dos africanos. Musicalmente falando, há a minha experiência com os artistas. A primeira foi o Corey Harris, que acompanhei em 2003 e tenho o sonho de acompanhar de novo. A maneira como ele tratava as combinações, incluindo o reggae, os ritmos da América Central, foi uma influência direta. A outra foi o Marku Ribas, com quem tive a chance de fazer alguns shows antes de ele falecer ano passado. Pra quem não sabe, o Marku Ribas é um compositor ator, participou do Macunaíma, autor da música Zamba Bem, um cara revolucionário em seu tempo, anos 70. Ele tinha flerte direto com a música africana. Quando falei que tinha um trabalho de blues e que tinha admiração por ele, ele me disse com aquele jeitão dele de ator: “Porque você não faz um trabalho com o blues africano, é tudo a mesma coisa”. O CD abre com Iko Iko, do Mardi Gras de New Orleans, que tem uma ligação direta com a cultura creole, a porta da África. Pesquisei a música sul-africana, com a qual tive contato maior pela língua zulu dos corais. Conforme ouvia a melodia, a versão já ia ficando pronta. Não foi um trabalho fácil, mas foi feito com muita naturalidade.

EM – Entre o período de pesquisa, desenvolvimento e gravação, quanto tempo levou para esse trabalho ficar pronto?
AG –
Uns dez anos. Ia acrescentando músicas. Após o Key Blues, queria fazer um disco mais world music, mas só com três músicas africanas. Mas aí o Edu Gomes, que é meu parceiro e produz, achou que eu tinha de fazer um disco inteiro já que tinha dezenove músicas. O disco começou a tomar forma. Das dezenove, ficaram quatorze. Onze versões e três compostas por mim em dialetos africanos, além do Zulu, o Bembe em uma música tradicional da Zâmbia, uma espécie de hino do país. Para muitas dessas músicas não existem traduções. Você fala uma palavra e representa uma frase, é muito complexo. Por exemplo, Jingoloba, do Santana em Iorubá, da Nigéria, significa remelexo. Tem outra em Ioruba que é minha, Olodumare, uma referência aos orixás, tem berimbau, trazendo a coisa aqui para o Brasil. Tenho uma composição em Ibó, que é outra tribo da Nigéria e com a participação do Rex Thomas que é nigeriano. Ele nem é músico profissional, mas compõe músicas, é educador, mora em Alto Paraíso. A gente compôs Ekenemu Uwa que é uma mensagem de felicidade, de coisa boa para as outras pessoas. Tuareg Blues também é minha, em homenagem ao povo tuaregue que não tem fronteiras. Eu canto em inglês e o Edu Gomes faz um violão puxando para o árabe. Tem muita mistura nesse disco.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Big Joe Manfra ajudou a divulgar a cena blueseira carioca editando os novos talentos

Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Leandro Amaral e divulgação

As diversas atividades de Big Joe Manfra fizeram do guitarrista, cantor e produtor um dos mais importantes representantes da cena carioca.
Manfra fundou o selo Blues Time gravando e dando visibilidade a grupos iniciantes e veteranos do vários lugares do Brasil. Maior força pra rapaziada.
Atua como produtor do maior festival de jazz e blues do país, o Rio das Ostras Jazz e Blues, comandado por Stênio Mattos, da Azul Produções e é road manager aqui no Brasil do guitarrista Stanley Jordan. E ainda parceiro de fé de Jefferson Gonçalves e o responsável por trazer ao Brasil um dos maiores gaitistas de blues dos Estados Unidos, Peter Madcat. Participa ainda do tributo oficial ao Celso Blues Boy.
Ao longo de seus 15 anos de carreira, Manfra gravou quatro CDs e o primeiro DVD de blues lançado no Brasil, o Ao Vivo em Juiz de Fora. Sua própria discografia conta com uma pérola da discografia nacional: Live In Rio – Peter Madcat e Big Joe Manfra Blues Band (com a participação de Jefferson Gonçalves).
O CD foi gravado ao vivo no extinto Mistura Fina e conta com 15 temas como Baby Changed the Lock, Key to the Highway, Help me, Fishing Blues, Take Five, Mellow Down Easy e outras notáveis versões. É blues rolando solto num clima de espontaneidade raramente visto e ouvido em discos ao vivo no Brasil. Se você não tem esse disco, dê um jeito de arrumar.
Logo após esse lançamento, tive a oportunidade de trazer o show a Santos. São as fotos que ilustram essa matéria.
Com a Blues Time Records, Manfra editou Baseado em Blues, Mojo Society, Beale Street, Blues Power, Fernando Vidal e Taryn Szpilman (Rio de Janeiro), Rodrigo Nézio & Duocondé Blues (Minas Gerais), Felipe Cazaux (Fortaleza).



Eugênio Martins Júnior – Como você começou na guitarra e como o blues entrou na tua vida?
Big Joe Manfra –
Comecei aos 16 anos, depois do Rock In Rio. Meu primo tocava violão e havia muito movimento na casa dele. Meu pai também gostava muito de música e o primo dele tinha uma loja de discos no subúrbio de Campo Grande, era a maior do pedaço. Então sempre tive esse lado. Parei o curso de inglês para entrar no curso de guitarra. Estudei no São Bento, que era um colégio forte, estava ligado em fazer faculdade, mas não deu certo. Fiquei três meses parados só tocando guitarra e entrei em um curso, o Musiarte, passei a estudar muito e meu pai viu que não precisava me cobrar. Quando chegou a época de prestar novo vestibular ele não falou nada e eu nem pensei em mais nada mesmo. Depois que me formei aqui fui lá pra fora fazer o IG&T...

EM – Na Califórnia?
BJM –
Sim, na época a IG&T era considerada a melhor escola de música do mundo, principalmente de guitarra. Na época tocava cover de rock e nem tinha banda própria. Quando cheguei o primeiro cara que com quem toquei foi o Keith Wyatt que já conhecia de vídeo. Alguns professores eram muito conhecidos, o Scott Henderson, Steve Trovato e outros.

EM – Foi lá que você conheceu o Scott Henderson? Ele lembrou de você esse ano? (Em 2013, ano dessa entrevista, Henderson foi uma das atrações em Rio das Ostras).
BJM –
Sim, conheci o Scott lá. Ele tem muito aluno, mas eu falei pra ele. O Fernando Vidal, que estudou lá também disse que eles iam tocar no mesmo festival e falou de mim. E na época eu tinha outro visual, né? (risos). Durante o curso comecei a me ligar no blues. Dos quinze guitarristas brasileiros que estavam lá naquela época, eu era o único ligado em blues.

EM – Quem estava lá nessa época?
BJM –
O Sérgio Morel da LS Jack; o Max Viana, filho do Djavan; o João Suplicy; o Vinnie Rosa, que é consultor do The Voice, tocou com a Ana Carolina. Isso em 1993/94. 


EM – Você tocou na Califórnia?
BJM –
Não, dei canja. Não era a intenção na época. Acabei voltando e dando aulas. Um dia apareceu uma oportunidade de tocar e o cara perguntou se eu tinha banda. Eu disse sim, mas era mentira. Aí perguntou o nome e eu disse Big Joe Manfra. Meu nome é Marfídio, mas todo mundo entendia “Manfrídio”. Era um bar lá em Minas chamado Prova Oral, bastante conhecido em Juiz de Fora. Não era só blues, porque os caras que eu peguei conheciam muito Beatles e rock tradicional e nós tínhamos que tocar três sets. O primeiro ficou sendo de blues, o segundo classic rock e no terceiro os dois misturados. Nessa época eu não cantava. Comecei a cantar por causa do inglês.

EM – Em uma conversa há algum tempo eu te perguntei se o blueseiro brasileiro deveria gravar em inglês ou português. Você respondeu já dando uma bronca: “Ninguém pergunta isso pro Sepultura”. Fale um pouco sobre isso.
BJM –
Bom, são coisas diferentes. Primeiro tem a ver com o fato de eu ter ido morar e tocar lá nos Estados Unidos. Segundo, por causa da produção, tive contato com John Mayall e John Primer. Acho que aqui há um preconceito das pessoas com relação a isso. Dizem que os gringos acham ridículo ouvir a gente cantando em inglês. Olha, nunca alguém chegou e me disse isso pessoalmente. Acredito que nem para o Igor Prado, ou Blues Etílicos. O Celso Blues Boy que fazia blues rock em português cantava em inglês e não agredia ninguém com isso. Você vê o André (Chritovam) fazendo direito em inglês e português. Você vê o Nuno (Mindelis) fazendo. Tem de ter personalidade. Do mesmo jeito que há uma patrulha aqui no Brasil dizendo que o que a gente toca não é blues, também há nos Estados Unidos. O Roy Rogers me falou que deixou de fazer vários festivais porque os caras falavam que ele não tocava blues. Pô, ele produziu um disco e tocou com o John Lee Hooker. Será que alguém pode chegar e dizer que ele não sabe tocar blues? Sua personalidade o levou a dar um toque de rock and roll, um slide mais agressivo, captador de guitarra no violão. Olha, quando toquei nos Estados Unidos procurei cantar da melhor maneira possível, com sotaque certo, pronúncia correta. Ano passado fiz uma turnê com o Peter Madcat e depois toquei as minhas músicas com um pessoal que conheci lá, a banda do Tommy Castro. Eles falavam pra não me preocupar com isso porque ninguém prestava atenção nem no que eles cantavam. O público iria gostar de me ver tocar. Ninguém perguntou de onde eu era. Há muita diferença entre o americano que viaja e o que fica só lá nos Estados Unidos. Muitos vêm o que a gente faz aqui e acha que a gente tem mais respeito pela música deles do que muitos americanos. Outra coisa, o John Mayall precisa chamar alguém pra tocar com ele? Ele me ouviu tocar, gostou e me chamou. Isso é coisa de músico. A primeira vez que toquei com o Madcat foi a mesma coisa. O ensaio não foi legal, mas quando fomos tocar deu certo. Estamos falando em 1998, tem toda uma história.

EM – Mais tarde vocês gravaram o Ao Vivo no Rio que é um disco muito bom.
BJM –
Obrigado, já ouvi muitos elogios sobre esse trabalho. O entendimento foi de gravar para ele poder voltar mais vezes. Mas como disse, não houve uma coisa forçada. Foi natural. Ano passado toquei em um lugar onde o Peter já havia gravado, o The Ark. Eu não canto em português porque não gosto. Já ouvia o Celso, gosto dos primeiros trabalhos do André, mas nunca foram trabalhos que me influenciaram. Quem me influenciou foi o Hendrix, Stevie Ray, um pouco do blues de Chicago, mas que não é o meu forte. Bato palma para o trabalho do Igor (Prado), é uma coisa natural. Jefferson (Gonçalves) outra coisa totalmente diferente. Quando o Blues Etílicos juntou o lance da capoeira eu bati palma. Porque foi bem feito. Foi feito genuinamente.

EM – Outra coisa que eu acho importante nessa equação é que o blues no Brasil tem DNA classe média. Ninguém aqui colheu algodão na fazenda e muitas vezes os caras cantam sem entender as letras.
BJM –
Exatamente. Eu sou carioca, não uso nem as mesmas roupas que os caras. E não vai ser no palco que vou usar. Mas também não critico que usa. O artista pode usar qualquer roupa no palco.


EM – Como nasceu a Blues Time Records?
BJM –
Nasceu de duas situações. Uma que eu precisava lançar o meu CD independente em 1999. Outra que o Jefferson viajou para um congresso de harmônica e voltou dizendo que estava todo mundo fazendo discos independentes. Eu estava com uma grana na época e pensei em começar uma história. O Baseado em Blues, que era a banda do Jefferson, havia acabado de sair da distribuidora que literalmente esqueceu o disco deles em uma prateleira. Lançado foi, pela Velas, se não me engano, mas não tinha divulgação. Depois as coisas foram mudando e começamos a fazer mais coisas. Eu ficava na parte da empresa e o Jefferson dava um apoio indicando artistas, mas não trabalhava diretamente. Fizemos mais de 40 CDs.

EM – Como selecionava os lançamentos do selo, os músicos te procuravam ou você ia atrás?
BJM –
Pessoas que eu já conhecia, que ia encontrando pela estrada, que são recomendadas, o caso do Rodrigo Nézio lá de Minas, o Felipe Cazaux de Fortaleza. A gente analisava e gostava. O selo não surgiu com a proposta de ser comercial. Foi uma grande coisa que fizemos, mas como negócio foi um grande erro. Tínhamos uma porcentagem de administração muito básica em cima dos discos. Na época que vendíamos nos shows e as distribuidoras estavam vendendo bastante CDs estava tudo bem. Quando passamos a vender só nos shows... o selo só viabilizando os lançamentos, ficando só com a parte ruim, os custos. Tivemos problemas com os pagamentos, a distribuidora demorou muito, pagou anos depois. E aí o dinheiro foi para saldar coisas.
Recebíamos muito material também, mas sempre íamos ver a pessoa ao vivo. Ver o que o grupo ia agregar para o selo. Era como uma comunidade. Cada um levava para distribuir no seu estado. Só depois entramos na Tratore que tinha distribuição nacional.

EM – Hoje o selo não existe mais?
BJM –
Existe só o CNPJ. O mercado mudou muito. Além de estar investindo em outras coisas no momento, é uma coisa que dá muito trabalho. O que sustentou a Blues Time por algum tempo foi a venda dos meus CDs e DVDs.   

EM – Teu último lançamento foi o DVD, em 2008. Você está trabalhando em alguma coisa nova?
BJM -
Você viu o crescimento do festival. Começamos a fazer muitas coisas e os projetos pessoais ficaram um pouco de lado. Tenho oito músicas gravadas que já dá pra fazer um CD. Gostaria de gravar umas coisas lá fora, mas não há tempo. No primeiro semestre de cada ano não consigo viajar por causa do festival. E tem também meu tratamento de saúde que comecei em 2010. Vi que se continuasse viajando do jeito que eu estava não ia chegar a lugar nenhum. A base do tratamento que eu fiz era o respeito aos horários de comer e dormir. Tenho que pensar o que vou fazer agora.

EM – Como nasceu a parceria com o Peter Madcat e como nasceu a idéia de gravar o Ao Vivo no Rio com ele?
BJM –
O Jefferson me ligou dizendo que um amigo dele viria ao Brasil tocar, a dupla Madcat and Kane, acho que era no Nescafé e Blues em São Paulo, do Cesar Castanho. Como eu morava sozinho naquela época, o Jefferson me perguntou se o Madcat poderia ficar na minha casa em visita ao Rio. Depois de um tempo ele me liga de novo dizendo que o negócio ia ficar mais legal, que o Madcat estava acertando para ser endorser da Hering e iria fazer uma visita à fábrica de harmônicas e se a gente conseguia organizar um show, ou alguma coisa com a minha banda. Fizemos um show no Rio, cujos ensaios foram ruins e achei que aquilo ali não ia dar em nada. Mas quando o show acabou todo mundo veio falar com a gente para dar os parabéns e eu fiquei pensando, “pô será que foi isso tudo mesmo?”. Fizemos outro em Blumenau e foi melhor ainda. O Jefferson não pode ir porque tinha um show com o Baseado em Blues. A partir daí passamos a fazer as turnês dele aqui nesse formato. Após isso, lançamos o disco dele. Em 2009 ele me disse que foi o ano que mais gostou de me ouvir tocar, coincidentemente, foi logo após do meu tratamento. Ele organizou uma turnê lá fora e tal. Fiquei três semanas em Michigan, cidade dele; em Chicago, no Rosa’s Lounge, um bar super tradicional, com fotos de todos os caras na parede. Fui uma semana antes pra conhecer e depois fui pra tocar. Ele me apresentava para as pessoas e é por isso que eu te digo, não fez diferença nenhuma eu ser brasileiro. 


EM – Em todos esses anos de Rio das Ostras você fez alguns contatos. Surgiu a oportunidade de gravar nos Estados Unidos?
BJM –
Aqui eu toquei com Michel Hill, Magic Slim e sempre pensei em fazer alguma coisa. Mas passa pelo meu problema de saúde. Era difícil fisicamente. Em janeiro de 2010 fui à Namm Show, nos Estados Unidos, é uma feira de música como a Expomusic aqui do Brasil. Andava todos aqueles pavilhões e ficava muito cansado. Me convidavam pra sair e eu não ia. Enfim, não conseguia aproveitar minhas viagens. Tenho muitos contatos, mas fica complicado ir pra lá sozinho nessas condições. Ano passado o Keith Crossan, saxofonista que toca em San Francisco com o Tommy Castro, me convidou pra fazer uma série de shows no Biscuits & Blues, um bar tradicional da cidade. Foi legal porque a banda foi eleita pela revista Blues Revue como a melhor banda de blues durante dois anos. Gostaria de fazer alguma coisa com uma banda parecida como essa, com o Tony Steddy, um cara que tocou até com o Sly & the family Stone e que estou produzindo.

EM – Como andam os espaços para o blues no Rio de janeiro?
BJM –
Todos vazios. (risos). Na verdade não há um lugar de shows. O que existem são as jam sessions e projetos com convidados com uma banda base tocando e chamando os músicos. Os Sescs daqui não são como em São Paulo. Lá no Bar do B é legal de fazer, mas é esse clima, às vezes o músico está no Rio de bobeira e vai tocar, aproxima o pessoal. Mas é um lance que não dá pra acomodar todos. Tinha um lance aqui que era legal, numa cervejaria na Lapa, mas de uma hora para outra acabou. 

EM – E já que estamos nesse assunto, como você vê a atual cena brasileira?
BJM –
Vejo em um movimento positivo para as bandas. O problema que eu vejo é o fechamento desses lugares menores pra show. Tem muito festival, é impressionante como pipoca festival no Brasil. Mas só isso não é o ideal, o que eu vejo nos Estados Unidos é que o cara vai de uma cidade a outra e no caminho vai parando em bares para ver shows de blues. Aqui os artistas não conseguem isso. Poderia ter mais coisas nas cidades do interior.

EM – Você está focado na produção, mas banda está ativa?
BJM –
Acabei de fazer o Festival de Campos de Jordão e Paraty. Vou fazer o festival de Tiradentes, no interior de Minas. Estou fazendo as gigs em tributo ao Celso Blues Boy. Esse ano estou fazendo muita coisa boa, não gosto de fazer as coisas a toa. A banda já está junta há um tempo, tenho responsabilidade com o pessoal, não vou pagar qualquer coisa.

 
 

segunda-feira, 17 de março de 2014

O repórter fotográfico Leandro Amaral comemora dez anos de profissão com grande exposição de imagens em Santos


O repórter fotográfico Leandro Amaral, grande colaborador do Mannish Blog, cujas fotos ilustram algumas de nossas principais entrevistas, abre na quinta-feira, dia 20 de março, sua segunda mostra fotográfica. O público poderá visitar a mostra de segunda a sexta, até o dia três de abril, entre 19 e 22 horas no Espaço Cultural da Unisanta.
Com o título "Retrô 10 anos”, a exposição cobre acontecimentos da última década, numa verdadeira viagem no mundo do jornalismo fotográfico.
Essa história começou em 20 de março de 2004, quando cobriu o Senna In Concert, evento que marcou os 10 anos da morte do piloto Ayrton Senna. Após isso, Leandro Amaral passou a trabalhar em um jornal da Baixada Santista e com as maiores agências de notícias, tendo suas fotos publicadas nos maiores veículos de comunicação impressos do país e fora.
A exposição reúne mais de 150 fotos, em painéis de vários tamanhos e divididos por pauta, algumas com quatro, cinco, seis fotos. "Quando pensei em fazer esse trabalho, a primeira ideia foi de reunir as fotos mais bonitas ou impressionantes, mas pensei, isso todo fotógrafo faz, quero algo diferente!", explica Leandro Amaral, que, por este motivo, resolveu fazer uma exposição em que o tema seria as pautas realizadas com as principais fotos em cada assunto. "Há pautas que se resumirmos em uma foto parecem ficar incompletas, por isso, em um mesmo painel, fiz uma montagem com mais de uma imagem". Todas as fotos têm legenda, para lembrar o visitante de quando o fato aconteceu e um rápido resumo do assunto.
Entre os assuntos expostos, estão eventos de importância nacional, como o São Paulo Fashion Week, Fórmula Indy e Carnaval em São Paulo, visita do Papa Bento XVI ao Brasil. Pautas regionais, como visitas presidenciais, shows, a retomada do Carnaval santista, em 2006, jogos de futebol e pessoas que ficarão sempre na memória.
"O painel principal desta mostra considero ser o que relembra o Mundial Interclubes Fifa (no Japão, em 2011), quando o Santos FC perdeu para o Barcelona. Este painel reúne várias fotos do jogo e dos 20 dias que passei no Japão cobrindo o dia a dia do Santos. Só este painel tem 1,40 metro de largura", explica Leandro, que foi um dos quatro fotógrafos brasileiros no Japão.


Além disso, há o registro de boa parte do caminho do time da Vila Belmiro até chegar à final do Mundial. "Acho que tudo começou com a conquista, em Salvador, da Copa do Brasil de 2010, que garantiu a vaga do Santos na Copa Libertadores do ano seguinte.
Temos os jogos de 2011, as dancinhas que ficaram conhecidas nas comemorações dos gols, a expulsão de Neymar após usar a máscara com a cara dele, até a final da Libertadores da América, no Uruguai e no Pacaembú, todos os jogos que pude acompanhar", completa.
Entre as pessoas que estão em nossa memória, Leandro traz fotos do Chorão, Padre Paulo, Serafim Gonzalez, Magic Slim, entre outros. Há também imagens dos antigos clubes da Ponta da Praia, como o Regatas Santista e o Vasco da Gama antes da demolição, e Sírio Libanês (no Gonzaga), antes de vender o terreno para uma construtora.
Entre os fatos que viraram notícia na região, o destaque fica para duas imagens de acidentes. Leandro lembra do desabamento de uma Pedreira, em 2011 que resultou na morte de dois trabalhadores, e do rebocador que ficou encalhado na Praia do Embaré, em 2012. "Essa imagem me lembrou muito uma foto histórica que mostra o navio Ais Giorgis, que em 1974 encalhou próximo ao Canal 6. A minha foto mostra uma praia, em 2012, cheia, com o pessoal curtindo ao lado da embarcação encalhada.
Outra imagem da exposição que merece destaque é o lançamento do filme Pelé Eterno, uma grande festa no Cine Roxy, em Santos. "Foi a primeira vez que fotografei o Rei do Futebol. Tinha apenas três meses de fotografia, era eu com uma máquina e lente simples e os outros fotógrafos com verdadeiros arsenais de guerra, aquele empurra-empurra, mas que rendeu boas fotos", explica.
Pelé, aliás, é uma das personalidades que aparece mais de uma vez na exposição, já que na última década ele foi notícia constante. "Depois do lançamento do filme, ele participou da gravação de um comercial com o Robinho na Vila Belmiro. Na época eu estagiava no Santos FC, depois o lançamento das obras do Museu Pelé e a inauguração da Escolinha do Rei".
Política é outro assunto bastante abordado na exposição. Desde o debate entre os prefeituráveis de Santos, passando por um debate entre Lula e Alckmin na Record, até visitas do presidente Lula na Baixada, as férias dele no Guarujá, e a atual presidente (Dilma Roussef) na época em que ela era Ministra Chefe da Casa Civil e acompanhava Lula nas visitas à Santos. "Há uma foto de Dilma que considero especial, foi durante a visita dela ao 57º Congresso Estadual de Municípios, a foto com a expressão dela triste foi capa da revista Carta Capital, quando foi anunciado um câncer em Dilma, semanas depois da vinda à Santos, foi a minha primeira capa de revista", completa Leandro.
Cada foto tem a uma história que Leandro gosta de contar. Nem sempre o dia é perfeito, o clima ajuda e a posição escolhida para ficar foi a certa. "O futebol é uma loteria, o campo tem quatro cantos, em um jogo o gol pode ser do time oposto ao escolhido pelo fotógrafo para acompanhar, e se o gol é do time que você está acompanhando ainda tem de torcer para o jogador correr para o seu lado, senão a foto já era".
Há ainda os dias chuvosos, o frio, ou o calor intenso, entre outros problemas. "Em muitas pautas ficamos de longe, temos que explorar as lentes objetivas, ou o empurra empurra é tanto que temos de usar lentes grandes angulares e contar com a sorte de estar no lugar certo. Em outras, o problema é o ambiente escuro, muitas vezes, um inimigo para o fotógrafo".
Entre as dificuldades que mais enfrentou, Leandro lembra da final da Copa do Brasil em Salvador. "Choveu a semana inteira e o estádio Barradão fica em um antigo lixão. O gramado era uma lama só, o tênis afundava. Na comemoração do título teve fotógrafo caindo na lama, estava muito escorregadio, no dia seguinte, ao chegar em Santos, o tênis estava pesado e duro de tanta lama" Já no Japão, o que atrapalhou foi o frio. Antes da final, a temperatura estava perto do zero grau, mas a sensação térmica era negativa", explica.


Leandro se formou em Jornalismo pela Unisanta em 2005, mas desde 2003 trabalha na área, primeiro como jornalista e, após um ano, também como repórter fotográfico.
Aprendeu fotografia durante a faculdade de Jornalismo, no segundo ano. Com as aulas dos professores André Luis Ferreira e depois com Fabiano Accorsi.
Começou a se interessar pela fotografia e sua complexidade. A partir daí decidiu explorar mais este lado do curso de Jornalismo, pois havia o interesse em trabalhar como repórter da mídia impressa ou internet.
Graças à dedicação dos dois docentes, decidiu investir na fotografia, quando começou na área com uma câmera simples. Aperfeiçoou-se lendo, assistindo palestras e workshops sobre o assunto.
A escolha pelo Jornalismo começou em 2001, quando, no terceiro ano do Ensino Médio do colégio Santa Cecília, participou do Projeto Vozes de Santos, coordenado pelo jornalista Gilberto Dimenstein e acompanhado em Santos pelo jornalista Gustavo Klein, que na época editava o caderno Tribu, no jornal A Tribuna.
O resultado do projeto foi a edição de um livro com a união de vários textos publicados semanalmente no jornal. Esse foi o fator que fez com que Leandro decidisse entrar na faculdade de Jornalismo. Em 2002, o projeto ganhou um prêmio durante o GP Ayrton Senna de Jornalismo.
Nesses 10 anos, além de abrir um estúdio fotográfico focado em casamentos e eventos corporativos, Leandro nunca parou de fotografar para o Jornalismo. Graças a uma parceria, a partir de 2007, com as agências de fotografia Estado, Futura Press e ABCDigiPress, teve suas fotos publicadas em todo o mundo, tendo estampado as capas das revistas Carta Capital e Contigo, além de imagens no interior das revistas Veja e Caras, além de diversos jornais, como Jornal da Tarde, A Tribuna de Santos, Metro, Diário de São Paulo, Estado de São Paulo, Lance, entre vários veículo. Internacionalmente, suas fotos foram publicadas pela Agência EFE na Argentina, Uruguai, Chile, Bélgica, Espanha, México e Estados Unidos e na cobertura do Mundial Interclubes Fifa em sites de todos os cinco continentes.
Atualmente, Leandro também presta serviços para diversas empresas da região, como Transpetro, Miramar Shopping, Shopping Pátio Iporanga, Santos Arquidecor, Todeschini, entre outros.
Em 2013 fez sua primeira exposição fotográfica, focada em fotos de casamentos, em homenagem ao Dia dos Namorados.




quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Trinta anos e trezentos shows internacionais de Jazz e Blues no Brasil. O produtor Herbert Lucas conta como a coisa toda começou

Há 25 anos os discos Mandinga de André Chistovam e Água Mineral do Blues Etílicos inaugurariam o blues no Brasil

O maior bluesman do mundo com o maior produtor de blues do Brasil


Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Eugênio  e Cezar Fernandes

Em janeiro de 2006, li naquela revistinha da Folha de S.Paulo que o Bourbon Street Music Club iria trazer ao Brasil o veterano gaitista de blues Charlie Musselwhite e um dos maiores guitarristas de blues de todos os tempos, Otis Rush. Uma verdadeira lenda.
Fui dormir pensando naquilo e no dia seguinte não me contive e liguei para o bar. Pedi para chamar o responsável pela programação e quando ele atendeu o telefone fui logo falando: “Tudo bem, meu nome é Eugênio e quero trazer o Otis Rush a Santos, dá pra fazer?”.
Veja bem, qual é a chance de você fazer uma proposta dessa a alguém que nem te conhece e a pessoa dizer sim?
Pois foi o que aconteceu, o cara do outro lado da linha era o Herbert Lucas, um dos maiores produtores de shows internacionais no Brasil e, nos gêneros blues e jazz, com certeza o maior do país, disse que estava de partida para os Estados Unidos e quando voltasse conversaríamos.
Um mês se passou e fizemos a reunião em um restaurante em Santos. O Otis Rush ficou doente e sua turnê brasileira nunca aconteceu. Nossa primeira parceria foi o show do guitarrista de Memphis, Eric Gales. Só por curiosidade, foi também o primeiro show internacional no Teatro Coliseu de Santos após sua longa reforma. O guitarrista veio acompanhado pelos músicos Fred Sun Walk (guitarra), Papel (bateria) e Ugo Perrota (baixo).
Para quem não conhece o nosso ramo, o fato narrado espelha bem o que é a produção cultural no Brasil: uma eterna busca por oportunidades.
Herbert, macaco velho, não perdeu a chance de pular mais um galho. Eu, novato, já estava fazendo a coisa certa sem saber. Além de cavar “a” oportunidade de ouro, começava a aprender sobre produção com o melhor do ramo.
A entrevista que segue mostra bem o que é a produção musical, uma mistura de sorte, ideias ousadas, coração forte e, acima de tudo, amor a profissão.
Nossa parceria dura até hoje. A Mannish Boy Produções e a Lucas Shows e Eventos, produtora de Herbert dirigida por suas irmãs Thelma e Thais e seu cunhado Roberto, são as responsáveis no Brasil pela artista Shirley King, filha do velho B.B. King.
Herbert Lucas conta com mais de 300 shows de jazz e blues no currículo. Lidou com artistas do calibre de B.B. King, Nina Simone, Ray Charles, Sonny Rollins e mais uma centena de gênios. Participou da criação dos festivais de Rio das Ostras, Búzios, Bourbon Street Fest, Guarujazz, Campos Jazz, Paraty Latino e mais alguns. Um currículo que tão cedo não será batido. Mas Herbert que se cuide, eu já passai da minha centena.


Eugênio Martins Júnior – Como começou na produção?
Herbert Lucas –
Minha família sempre foi ligada em música. Meu pai era cantor amador e meus tios Miguel e José eram cantores de cantinas italianas em São Paulo. A gente vivia em cantinas. Eles tinham um repertório com músicas italianas engraçadas. Meu pai foi para a Segunda Guerra Mundial, mas quando chegou lá a guerra já havia acabado e ele ficou um tempo limpando os estragos na Itália. Lá ele aprendeu não só falar, mas cantar um vasto repertório. Eu sempre gostei de arranhar um violão e um piano. Conheci o Guarabyra que veio morar na rua da minha família na Vila Mariana. Quando passei a tocar em festas e eventos pequenos acabamos ficando amigos. Comecei a trabalhar com o Sá e Guarabira porque, apesar de novos, eu e meus irmãos tínhamos uma agência de publicidade. Fazíamos um anúncio aqui, um cartaz ali, até que um dia assumimos a carreira da dupla na cidade de São Paulo e do Guilherme Arantes no Brasil inteiro. Nessa época tinha um sócio que se chamava Mauro Madaleno.

EM - Quantos anos você tinha?
HL –
Quando conheci o Guarabyra tinha 13 anos e com 15, 16 anos fui trabalhar com eles. Fui para estrada com o Sá e Guarabyra. Logo depois fui morar nos Estados Unidos e Inglaterra, mas sempre quando voltava ia trabalhar com o Sá e Guarabyra, parecia uma sina (risos). Eu chegava passava dois dias e lá estava eu trabalhando com os caras. Entre idas e vindas trabalhei dezesseis anos. Eles faziam o maior sucesso, lembro da primeira grande temporada que nós produzimos. Era a comemoração de dez anos juntos e tinha projeção de imagens, roteiro muito bem escrito, coisas que para a época eram inovadoras. O show fez tanto sucesso que continuamos fazendo quase nos dez anos seguintes. (risos) Comecei uma parceria com o 14 Bis. Ajudei na produção do Secos e Molhados, os Mutantes ensaiavam aqui na Vila Mariana e eu fiquei amigo do Sérgio Dias. Trabalhei com o Zé Geraldo, o Beto Guedes, Renato Teixeira, Walter Franco.

EM – Quando começaram os shows internacionais?
HL -
Tinha afinidade pelo jazz e blues e por ter morado fora falava bem o inglês.Trabalhei numa produtora chamada Status, da família Curan. Eles tinham uma boate muito famosa chamada Viva Maria. Tinha shows internacionais direto. Era o Zé, o Alberto e o Fauzi, que era empresário do Sargentelli. Eles tinham dois conjuntos, o Coisa Nossa e o Super Status Som.
Fiquei responsável pelos shows internacionais e como o mercado eram os clubes trabalhei com Lucho Gatica, Perry Como e outros. Eram turnês de 30 shows em dois meses.
Em 1980 eles trouxeram ao Brasil o Freddy Cole, irmão do Nat King Cole. Era a segunda vez que ele vinha ao Brasil. Quando fiz intercâmbio nos Estados Unidos fiquei amigo de um cara de lá que era trompetista, o Mike Miller. Inclusive foi ele que me mostrou muito do blues e do jazz.
Por isso que eu entendia muito bem o que eles falavam e por coincidência ambos eram de Atlanta. Acabou que fui contratado para aquela turnê do Freddy Cole e no ano seguinte já estava produzindo o Freddy em todo o Brasil.
Naquela época os clubes de interior é que eram fortes. Todas as coisas boas relacionadas à música aconteciam nos clubes. Hoje tem os Sescs, mas naquela época não tinha. Santos era uma cidade gloriosa, lembro do Atlético, do Caiçara, Ilha Porchat Clube e todos eles faziam shows internacionais nos anos 70 e 80. Teatro de prefeitura também era um bom mercado a ser trabalhado. Isso tudo aconteceu antes do André Chritovam.

Delfeayo Marsalis - Bourbon Fest 2011

EM – Nosso próximo assunto. O rock estava no auge por aqui, como foi a aparição do blues no Brasil?
HL –
Fui parar na gravadora Eldorado como produtor independente. Meados de 80. Levava uns projetos e se interessasse a gente produzia os discos. Então eu estava lá direto, a direção era do António Duncan. A gravadora era bem alternativa e estava entrando pra bater no mercado.
Conheci o André Christovam nessa época porque ele tocava com um amigo em comum, o baterista Alaor Neves. E o André conhecia o João Lara, diretor da Rádio Eldorado e do selo Eldorado. Acabamos levando ele pro selo e chamamos o Flávio Guimarães do Blues Etílicos pra fazer uma participação. O Flávio tinha um disco independente já lançado. Primeiro lançamos o André e depois o Blues Etílicos. Olha só, lançamos os dois discos e coincidentemente acontece o primeiro festival de blues de Ribeirão Preto. E em 1989 só tinham eles pra tocar. Também foi a primeira noite de blues no Free Jazz Festival, com John Lee Hooker. Olha que coisa louca, ninguém combinou nada.
Após três anos, o disco do blues Etílicos já era o disco de blues mais vendido no Brasil, batendo até no B.B. King. Eram LPs, mas quando viraram CDs rolou essa revoluçãozinha do mercado. Fizemos o disco do André no estúdio da Eldorado que era um antigo estúdio de rádio onde eram feitas as gravações com orquestra ao vivo. Tinha piano, um órgão Hammond, umas raridades, na rua Major Quedinho, no Centro de São Paulo. O André queria usar uma sala antiga, equipamentos antigos, microfones antigos. Teve a participação do Roberto de Carvalho, o André havia acabado de participar da turnê da Rita Lee. A produção foi do Alexandre Fontanetti que é meu parceiro até hoje. Era um menino. A gente estava na hora certa e no lugar certo.

EM – Fala sobre o festival de blues de Ribeirão Preto. Lembro que foram dois ônibus cheios de músicos brasileiros e gringos misturados.
HL -
O Cezar (Castanho, organizador do festival) convidou... eu era empresário do André Christovam, o Blues Etílicos fica isolado no Rio porque o grande mercado para o blues era e sempre foi São Paulo e o interior do estado. São Paulo caiu um pouco a partir de 2010, mas o interior continua.
Juntamos todas as bandas em dois ônibus e os gringos ficaram bravos com isso. E o Cezar colocou uma produtora que se chamava Tereza e que não deixava ninguém sair dos ônibus e ela acabou ganhando o apelido de Madre Tereza. (risos)
Imagina você falar isso para os negões americanos. Mas foi uma coisa maravilhosa. Um garoto que tocava violão foi nos camarins e se tornou um blueseiro da pesada. Anos depois, quando fiz a turnê do Buddy Guy, ele foi escolhido pelo próprio para abrir os shows deles no Brasil. Era o Fred Sun Walk.





EM – Tocaram no Free Jazz?
HL –
Tocamos nas primeiras noites de blues. Não existiam outros nomes no Brasil. O Celso Blues Boy era mais rock. Ela não se assumia como blues absoluto. Ele era blueseiro na essência, mas fazia rock. Talvez ele tenha sido o primeiro blueseiro. Olha que coincidência, ele havia tocado com o Sá e Guarabyra na adolescência e foi o Sá que deu o apelido a ele. Surgiu o Celso Blues Boy que veio a ser a lenda do blues nacional. Veja bem, o Celso já vinha tocando há muitos anos antes do André, mas ele não se assumiu como blues nem fez esse marketing. Acho que oficialmente o André terá sempre o título de pioneiro.

EM – E após essa avalanche, porque o blues praticamente sumiu? Na sua opinião, o que aconteceu?
HL –
Vou te contar uma história engraçada. Após alguns anos, em 1991, eu estava em uma turnê enorme com o Blues Etílicos, a coisa estava tão badalada que encontrei uns malucos fazendo uma temporada de blues, meio que seguindo os nossos passos, estudando as casas, querendo construir um bar de blues. Eram os donos do Bourbon Street Music Club, Luiz Fernando Mascaro e o Edgar Radesca, que acabaram inaugurando o bar em 1993 com o B.B. King. Fui trabalhar lá em 1995. Acompanhei toda a saga da obra que não terminava nunca. Era o sonho do Luiz Fernando que foi para New Orleans e se apaixonou por blues, jazz, soul, música em todos os lugares, na rua, no barco, no supermercado, nos botecos, toda a cena musical negra, depois passou a ser do Edgar. Estou lá há 18 anos.

EM – Faz ideia de quantos shows de blues e jazz você já produziu?
HL –
Contei até o número 300. Incluindo grandes lendas: Buddy Guy, Koko Taylor, B.B. King que é o nosso grande padrinho, Lonnie Brooks. O primeiro show que me chamaram pra fazer foi do Kinsey Report, do Donald Kinsey. Ele era muito famoso porque introduziu a guitarra de Chicago no reggae e criou aquele riff da música Johnny B. Good do Peter Tosh. Depois fizemos uma turnê com o gaitista Sugar Blue. Fiz shows com as praticamente iniciantes Diana Krall, Jane Monheit e Norah Jones e com as clássicas Betty Carter, Shirley Horn, Dianne Reeves, Diane Schuur e Dee Dee Briedgewater. Recebemos artistas fantásticos, Pharoah Sanders, Roy Hargroove, Terence Blanchard, Kenny Garret, Wynton Marsalis, Nicolas Payton, Delfayo Marsalis, Irving Mayfield, Leroy Jones. Gaitistas do blues quase todos, Charlie Musselwhite, Sugar Blues, Rod Piazza, Willian Clarke. Todo o time de veteranos de Chicago e as revelações de um novo selo do o Top Cate o Antoine’s, ambos do Texas. Trabalhei no Tim Festival durante anos, produzi o grande Sonny Rollins.
Em 1995 passei a fazer as produções das turnês grandes do Bourbon Street. Produzi o Ray Charles no Parque do Ibirapuera que foi um recorde absoluto de público, foi no dia 11 de junho, se não me engano dia dos namorados. Foi um dia maravilhoso e o Ray foi a primeira grande produção que eu fiz com o Bourbon Street.

EM – Você e o Edgar vão todos os anos ao festival de New Orleans para escolher as atrações para o Bourbon Fest fale como é feita essa seleção?
HL –
Exatamente há 18 anos. Esse vai ser meu 19° ano. Mesmo antes de trabalhar fixo no Bourbon já havia ido dois anos. É o maior festival realizado no mundo, mas as pessoas não falam tanto, chama-se New Orleans Jazz and Heritage Festival. São doze palcos, sete dias de festival e mais de 500 atrações. Tem o palco do jazz moderno, jazz tradicional, dos sons regionais como o zydeco, cajun, country da Louisiana, do blues, do funk, do reggae e o palco do pop e rock que chama mais de 50 mil pessoas. Tem o palco gospel que quando você quer zerar o que ouviu no festival vai pra chorar um pouco. Quem toca lá são os corais das igrejas locais e é um show feito para as comunidades. Então as comunidades fazem a segunda e terceira vozes na platéia. Me arrepio só em falar.
Além de a cidade ter sido a inspiração pra fazer o bar Bourbon Street, o festival foi a nossa inspiração pra fazer o nosso festival em comemoração aos dez anos da casa. Fui o incentivador disso. A gente traz um gostinho do que foi o festival naquele ano. Mesmo não tendo muito acesso a alguns artistas, apesar de sermos sempre bem recebidos, vemos os shows que funcionam. Tem muita gente que é famosa, mas não faz um bom show e o que a gente quer é música boa com diversão boa. Às vezes a trazemos um show de jazz cabeça, mas que o show é ótimo.

Produzindo um festival - 2011 
(abra a foto clicando em cima)

EM – Além do blues e do jazz você participa de megaturnês como Iron Maiden, Amy Winehouse, Joss Stone, foi convidado pra trabalhar no Rock In Rio. Fale um pouco sobre esse lado.
HL –
Começou justamente por trabalhar com produção e falar muito bem o inglês e ser tradutor bilíngüe. Falo a linguagem dos músicos. No 150 Night Club conheci muitos artistas e gente que trazia shows internacionais. Passado algum tempo, já trabalhando no Bourbon fiz o Spyro Gyra, o Yellow Jackets, a turnê do Take 6 e cai na estrada pra fazer mais trabalhos como free lancer. Nos anos 80 trabalhei com o Muniz, um dos maiores produtores de São Paulo, que depois foi diretor da Time for Fun e depois foi trabalhar para a XYZ. Com ele fiz o Billie Paul, o Rick Wakeman. Trabalhei na turnê do Queen com o Manoel Poladian. Sempre assim, como contratado pelo dono da turnê.
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EM – Qual foi o show mais estranho em todos esses anos?
HL –
Entre os brasileiros, o show mais inusitado foi em Porto de Galinhas. Em uma época em que o blues não estava tão badalado, acho que em 1994. Não tinha estrutura nenhuma, em uma praia quase deserta no litoral de Pernambuco. O primeiro festival que participei foi em Goiânia, já com a banda local The Not Yet Famous Blues Band. Estavam o Blues Etílicos e o Fred Sun Walk. Também foi bem inusitado porque foi no quartel general do sertanejo.
Entre os internacionais fiz a Nina Simone, um dos maiores clássicos da história da música, ela estava exilada e isolada na França, ficou vinte anos sem ir aos Estados Unidos. Então, por causa das complicações dessa turnê da Nina, que por si só já daria um livro, vários produtores passaram a me convidar a produzir artistas complicados. Fiz o Guns N’ Roses com o loki do Axl Rose, a Lauryn Hill e a Amy Winehouse. Fiz a Shakira, ela é muito profissional, mas tinham uns gringos que se achavam o máximo e só atrapalhavam. Outro complicadíssimo foi o Freddy Mercury no primeiro Rock in Rio. Mais uma vez por conta do meu inglês fui para participar de uma entrevista e o Freddy naquela época vivia cada minuto da vida dele. Não parava nunca. Uma que eu vi de perto, mas não participei foi a dos Rolling Stones. Meus amigos viviam perdendo o Keith Richards no Rio de Janeiro. (risos)
Na Inglaterra participei da turnê do álbum Graceland do Paul Simon e por implicações políticas, o Mandela estava preso naquela época, os africanos não podiam sair do hotel. Só eles fugiam por todos os lugares possíveis para conhecer Londres. Fiquei dez dias em Londres e dez dias viajando com o Graceland.    

EM – E como surgiu a Lucas Shows?
HL –
Uma hora resolvi fechar a H2 Produções cujo foco era empresariar artistas e reabrir a Lucas Shows, que estava fechada por causa do meu volume de trabalho no Bourbon Street. Reabri com outros irmãos envolvidos. Ano que vem faz dez anos.


EM – Você é o road manager do B.B. King desde as primeiras vezes que ele veio ao Brasil. Como ele é e como é esse trabalho?
HL –
Desde a primeira turnê até essa última, mudou o empresário, agente e o produtor, só nós é que não mudamos. Isso é muito legal, prova que ele é leal às pessoas que gosta. Óbvio que o B.B. King quando tocava em pé tinha menos problemas. Quando começamos com ele há vinte anos, ele tinha 68 anos, já era um senhor. Outra coisa é que ele sempre tocou muito, mas o cachê dele ficava entre os médios. Nos últimos anos o cachê cresceu porque ele passou a fazer menos shows e hoje ele está no médio pra grande.
Depois de tantos shows ele virou um amigo, encontrei-o em New York, no Mississippi, New Orleans. Na última vez que nos encontramos em New Orleans aconteceu uma coisa engraçada. Ele chegou com aquele ônibus de turnê maravilhoso, com DVD, ar condicionado, onde ele adora receber as pessoas. Fui lá e ficamos conversando e por incrível que pareça, o apresentei a vários músicos famosos. O Trombone Shorty, o Leroy Jones queriam muito conhecer o B.B. King e sabiam que eu o conhecia. Então eu e o Edgar passamos horas conversando com ele. Mas ele iria tocar no festival e fizeram a introdução e tal e ele disse em inglês que era muito bom estar lá de novo e por isso eu falo pra vocês o meu sincero “obrigado”. Ele confundiu pensando que estava no Brasil. (risos).

EM – Como vê a cena hoje do blues brasileiro que você ajudou a criar em relação à cena atual?
HL –
Digamos que estamos na terceira geração. Quando você produz e participa de um trabalho que você leva pra uma gravadora e consegue convencer as pessoas investirem, posso dizer que ajudei a propagar e não criar. O blues já foi melhor economicamente. Tinha menos artistas e conseguíamos fazer mais shows. Na capital, o blues caiu, mas também acho que não cai mais do que isso. Eu fazia temporada com o Blues Etílicos de quatro e cinco dias, com Sugar Blue, Blues Jeans, Big Allanbik a mesma coisa. Hoje conseguimos fazer no máximo dois shows. Mas há vários botecos e pubs que continuam fazendo blues e festivais. Nos primeiros cinco anos as pessoas ficaram bem curiosas, mas o blues voltou a ser como é em todos os lugares do mundo. Um som alternativo, do segundo pro terceiro time. Mesmo nos Estados Unidos a renovação do gênero é lenta. Eles têm grandes guitarristas, mas os maiores continuam sendo os tradicionais. Você vê o Joe Louis Walker e o novato Robert Randolph que fazem shows bem bacanas, mas nenhum deles atingiu a popularidade de Buddy Guy e B.B. King.

EM – Todos falam que o Rock In Rio é um marco na produção de shows no Brasil. Como está o profissionalismo da produção brasileira hoje em relação à época que você começou?
HL –
O que mudou muito é que os artistas só vinham em final de carreira. Hoje os caras estouram nos Estados Unidos e no ano seguinte estão vindo pra cá. Realmente o Brasil virou um mercado para nomes de todos os tamanhos. Venho da época que havia o contra regra e o empresário que fazia de tudo. Cuidava do som, detalhes de camarim, locais para o show, eram todos os profissionais em um. Isso melhorou demais. Hoje tem o stage manager (cuida do palco), o personal manager (cuida só do artista), band manager (cuida da banda), road manager (gerente de turnês). Mas ainda falta muito material humano porque o mercado cresceu muito, principalmente Brasil adentro. Você percebe que os sertanejos se organizaram de uma maneira muito boa, têm suas próprias estruturas de som, luz palcos maravilhosos, projeção de imagens 3D. Acho que é o grupo mais organizado do país.