Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Divulgação
Prestes a completar 53 anos de idade e 25 de carreira, Álvaro Assmar, representante do blues nacional e, mais ainda, do blues feito na terra de Jorge Amado, concedeu essa entrevista exclusiva para o Mannish Blog contando seu começo e como é a cena blues por lá.
A comemoração vai ser no domingo, dia 20, às 20h, no Groove Bar, na Praia da Barra, em Salvador. Será um show coletivo. Estarão lá os grupos do começo da carreira do guitarrista: Cabo de Guerra, de progressive rock, e Blues Anônimo, a primeira banda genuinamente de blues da Bahia. Ambos dos anos 80. Além deles, também participam Eric Assmar (guitarrista e filho de Álvaro) e Luiz Rocha (gaitista). Tudo devidamente gravado em CD e DVD para serem lançados ainda esse ano.
Formado em Engenharia Civil em 1984, nunca exerceu a profissão. É radialista e esse ano completa 30 anos de radiodifusão. Atualmente comanda um programa de blues pela Rádio Educadora chamado Educadora Blues que está no ar sob sua produção desde 2003. “Em abril o programa completa 8 anos no ar. Eu gosto de fazer porque mostro às pessoas o que acontece hoje, em termos de blues, no Brasil e no mundo. Me sinto com uma responsabilidade muito grande em levar o que é notícia com relação aos meus colegas no Brasil que estão aí tocando, gravando e precisam de evidência. E esse programa acaba dando essa oportunidade”.
Eugênio Martins Júnior – Quando foi que o Mississippi desabou na Bahia?
Álvaro Assmar – Essa pergunta você tirou do título da música Pra Sempre em Minha Vida, do álbum Blues A La Carte. Comecei, e sempre digo isso lembrando meu amigo Big Gilson lá do Rio de Janeiro, que entrei no blues pela porta dos fundos. Ele começou tocando rock and roll pra depois ter acesso ao blues e comigo foi a mesma coisa. Vim da época da Jovem Guarda, ouvindo também os Beatles nos anos 60, era uma criança. Esses foram os principais responsáveis por eu ter me dedicado à música. Aquilo teve um efeito muito forte em mim, mais por conta dos Beatles, queria ser John Lennon, aquelas coisas. Na mesma década tive acesso a informações de grupos como os Yardbirds do Eric Clapton. Ouvia muito falar dele e sabia que tinha saído desse grupo. Depois ele formou os Bluesbreakers, depois formou o Cream. Então, meu envolvimento com o blues, diria que começou a surgir daí. Depois veio o Hendrix, Allman Brothers. A medida que ia crescendo e a década de 60 terminando os grandes grupos de hard rock, como o Black Sabbath, Deep Purple e Led Zeppelin, que eram grupos que tinham o blues como matéria-prima, percebi que o blues estava muito presente. E também na música do Rolling Stones, mais até do que nas músicas dos Beatles. Então essa coisa de associação de blues com rock and roll se deu na minha infância. Comecei a acompanhar os rumos que a música estava tomando na década de 70. Tinha uma simpatia muito grande pelo Pink Floyd, Yes, Emerson Lake and Palmer, Triumvirat, Greenslade. Comecei estabelecer alguns parâmetros entre a música pesada e o blues. Comecei a educar mais os meus ouvidos. Ouvia as bandas onde o blues estava mais evidente, como o Allman Brothers, Derek and the Dominos, que era a banda do Clapton. Eles gravaram Little Wing do Hendrix. Dentro daquele contexto, com relação ao que temos hoje, aquilo eram revelações muito importantes na evolução como músico. Primeiro formar um conceito na cabeça para depois buscar informação como músico. O blues aconteceu na Bahia, em termos profissionais, depois que eu, meu irmão Adelmo Assmar, o tecladista José Luiz Lima, e o Alfredo Martins fundamos o Cabo de Guerra em 1985 e tocamos até 1992. Mas antes mesmo de sair do Cabo de Guerra, cheguei a ter uma necessidade particular de fazer parte de uma banda de blues. Era uma coisa que me incomodava um pouco dentro do Cabo de Guerra, não havia espaço para que isso fosse evidenciado. Daí nasceu a banda Blues Anônimo que, além de mim, era formada pelo Otávio Américo, o contrabaixista e o Raul Carlos Gomes na bateria. Ambos do grupo Mar Revolto, muito atuante que tocava rock and roll aqui em Salvador e eu me tornei rapidamente admirador. Gostava e me identificava com as coisas que eles tocavam. Essa simpatia musical me despertou um desejo de querer tocar com eles e isso aconteceu com a fundação do Blues Anônimo no final da de´cada de 80. Fazíamos releituras de artistas consagrados e num instante caímos na simpatia da imprensa, principalmente pela espontaneidade com relação ao que estava acontecendo na época. Acho que foi a partir daí que o blues começou a trilhar uma estrada em Salvador.
EM – Como vai a cena blues na Bahia? Ou a cena se resume ao Álvaro e Eric Assmar? Conheço um gaitista também, chamado Luiz Rocha.
AA – Eu diria que você está certo. Porque, além de mim, o primeiro a fazer blues aqui, o meu filho caçula, o Eric Assmar, está tocando uma barbaridade, está com um nível de conhecimento notável, transbordando criatividade e qualquer um pode perceber isso, mesmo quem não entende muito de música. E o gaitista Luiz Rocha que é um músico extraordinário, tem um domínio muito grande da gaita diatônica, um cara que venho acompanhando há muito tempo e vejo a evolução. Todos que eu vejo que tem talento gosto de apoiar porque acho que é minha obrigação. Surgi em uma época que estava sozinho e hoje não me sinto mais. Sinto que tenho uma companhia musical não só pelo meu filho, que além de tocar muito blues faz parte de uma banda que faz covers dos Beatles, a Cavern Beatles, e o Luiz Rocha que está voltado ao seu próprio trabalho, mas acompanha outros artistas eventualmente. Eu hoje diria que em Salvador e na Bahia de modo geral, quem tem um compromisso maior com uma carreira, além de mim, são só os dois. Não estou querendo dizer que não existem outros grandes músicos tocando, mas são músicos que são franco atiradores da noite. Vão chegando numas de, é até uma expressão que eu não gosto de utilizar, mas é a verdade, o “mata cachê”. Mas tudo é, na verdade, a contingência da sobrevivência de todos, então eu entendo perfeitamente. Mas como carreira, além de mim, quem tem foco são os dois.
EM – Você se sente isolado? Quero dizer, em relação à música, o circuito de blues se concentra no sudeste e sul do Brasil.
AA – Em termos de isolamento diria que não por causa do Eric e do Luiz. Dá um certo conforto saber que nós estamos fazendo alguma coisa dentro de um universo musical. No circuito do blues, apesar de se concentrar no sudeste e no sul do Brasil, por serem regiões mais desenvolvidas e até pelo fator histórico, aqui na Bahia não tenho do que me queixar porque sempre estou trabalhando, sempre estou desenvolvendo alguma ação por conta do blues. Sempre dou um jeito de me inserir dentro do contexto da minha cidade. Tenho muitos vínculos em Salvador, não poderia hoje viver em outro lugar, tenho vínculos familiares e profissionais que me prendem um pouco aqui. Posso, eventualmente, como fiz no ano passado, participar de eventos como a abertura dos shows do Johnny Winter no Canecão (Rio de Janeiro) e no Via Funchal (São Paulo) com o trio Christovam, Carlini e Assmar, com meus amigos André Christovam e Luiz Carlini, conhecer o Johnny Winter foi emocionante, tirar fotos, ganhar autógrafos. Tietando mesmo, porque eu devo muito ao Johnny Winter e meu filho Eric também. Nós crescemos ouvindo a música dele e de repente estávamos lá na frente dele, do cara que nós veneramos a vida inteira. Me lembro até que, no backstage, no Via funchal, meu filho olhou pra mim e disse: “É meu pai, o homem existe mesmo!”. Achei super engraçado porque a gente se referia ao Johnny Winter como um ser inalcançável e de repente estava ali. Ele foi muito simpático. Confesso que fui tomar a benção dele, fui lá beijar a mão do cara, um ato de reverência e gratidão por tudo que ele nos proporcionou. Ouvi muito o Live Johnny Winter, o Captured Live, Still Alive and Well, o primeiro Johnny Winter, a coletânea Austin Texas, Third Degree, Guitar Slinger, Winter at 88. Então, estar com ele foi uma emoção muito grande. Mas enfim, trabalhamos muito aqui em Salvador. Esse ano tive uma grata surpresa durante o Carnaval de 2011 porque, em via de regra, não há muito o que fazer para quem não toca o tipo de música de apelo popular que o mercado da Bahia exige, mas existe um festival chamado Palco do Rock que eu já havia participado em 1995 e esse ano me convidaram de novo. Foi uma coisa muito boa tocar para uma geração que não me viu tocar há 16 anos, tinha muito adolescente na platéia e eu me senti abraçado por eles. Foi um dos maiores shows da minha vida, sem sombra de dúvida. Então, sempre tenho uma forma de fomentar uma iniciativa que seja multiplicadora, do mesmo jeito que eu consigo sensibilizar alguns empresários que respaldam comercialmente minhas iniciativas. Acho que outros artistas vão acabar desenvolvendo essa habilidade de concretizar suas ideias através de produções. É muito fácil você abrir a boca e ficar só reclamando, quando o mais difícil é você arrumar suas ideias e torná-las realidade. Hoje tenho quatro discos e um DVD e mais adiante e, certamente, virão outros.
EM – Na minha opinião a cena blueseria brasileira vai bem, vários artistas, bandas e um intercâmbio legal com os gringos. Como você vê isso aí do nordeste?
AA – Me vejo como um artista que vem trabalhando para evidenciar isso. Já ouvi falar de outros músicos. Tem um guitarrista que eu conheci em Aracaju que se chama Marcos Vinhas, menino talentoso, conheci esse cara em 1995 durante uma apresentação que fiz lá para lançar meu primeiro álbum, o Standard, e depois ouvi uma banda que estava tocando algumas coisas do Rush e lá estava ele. Conheci ouvindo de longe. Hoje a gente se comunica e gosto muito da forma dele tocar, além de ser muito educado, uma figura muito simpática. Ele é de Aracaju, um lugar que não tem muita coisa de blues, pelo menos não tenho notícia de que existe uma banda atuante. Mas acho que o nordeste tem muitos músicos talentosos, talvez não com o compromisso que eu tenho com relação ao blues, porque só o blues me interessa. Acredito que quando chega nessa ponta da Bahia é a fronteira mesmo.
EM – No final dos anos 90 você iniciou um projeto que levava os músicos brasileiros de blues para a Bahia. Como foi, tinha público ou você teve de formar o público? O projeto ainda existe?
AA – O Wednesday Blues, como o nome diz, era sempre na quarta-feira, uma espécie de balão de ensaio que eu combinei fazer com a direção do Teatro ACBEU, de uma escola de inglês aqui em Salvador. O embrião começou em 1998 eram três apresentações de Álavaro Assmar com alguém de fora. O primeiro foi o gaúcho Solon Fishbone que acabou se tornando um amigo porque uma ano antes havíamos nos apresentado aqui na Bahia em um festival patrocinado por uma marca de cerveja. Pela primeira vez houve o interesse de uma emissora de TV em registrar o show para um especial, foi a TV Educativa da Bahia, uma emissora do governo. O programa que faço também é em uma rádio do governo, é todo um conglomerado. Esse show acabou virando o meu segundo disco, o Live, com a participação do Solon Fishbone. Tomei o cuidado de gravar em 16 canais, pude dar uma forma ao que viria ser o meu segundo álbum e fornecendo para emissora. Já que eu tinha essa possibilidade em multipista e ter uma melhor qualidade. Fizemos o segundo concerto com o André Christovam e o terceiro com o Luiz Carlini. O resultado foi surpreendente, então eu e minha amiga Maria Prado, que na época estava à frente do Teatro ACBEU, resolvemos criar um projeto de blues para as quartas-feiras. Arrumamos um patrocinador mais ousado e conseguimos colocar em prática trazendo o Big Allambik, Big Gilson, Blues Etílicos, Flávio Guimarães, Danny Vincent, Lancaster. Uma experiência Fantástica. Eu não posso dizer que sou produtor, de estúdio sim, porque produzo meus discos há muito tempo, mas eu e minha esposa, Adalgisa Oliveira, entramos numa de sermos produtores de eventos de blues e de preferência em teatro. Naqueles dias, no nosso entendimento, fazer blues na Bahia e no Brasil era fazer música incidental, de bar e restaurante. Então a gente achava que o diferencial era levar para dentro de um teatro. Isso deu credibilidade junto à imprensa. Em 2000 transmitimos ao vivo através de uma rádio FM. começou a tomar forma e dar visibilidade não só a mim, mas também aos nossos convidados. Criamos uma estrutura de hospedagem, alimentação, transporte, movimentar mão de obra direta ou indireta, proporcionou muito a muita gente. Me sindo muito orgulhoso de ter feito o Wednesday Blues, mas infelizmente não foi possível dar continuidade e em 2003 foi sua última edição quando trouxemos o super gaitista Jefferson Gonçalves. Estava com planos de trazer o Big Joe Manfra, porque ele é um cara que luta muito pelo blues no Brasil, admiro muito, não só como músico, mas também como empresário nessa área. Mas de vez em quando a TV reapresenta os shows.
EM – O que você prefere, cantar em inglês ou em português? É um dilema para o blueseiro brasileiro? Notei que quando você canta em português cai um pouco para o lado do pop rock.
AA – Talvez tenha um pouco essa conotação. O blues padrão é cantado em inglês até pela própria origem, mas quando você vai compor em inglês ou em português a abordagem, a métrica, a estrutura básica do blues do tipo I1 4, 5 de doze compassos tem uma forma básica de linguística. Para não cair na banalidade em termos de texto, já que o brasileiro é muito ligado a texto, é importante você ter uma abordagem e uma métrica talvez diferente para que a rima seja um agregado que valorize o texto da letra em questão. Então, é mais difícil compor blues em português do que em inglês. No caso do português, pelo fato de haver uma tendência de identificação com o idioma, já que você pretende abrir para um público maior do que entende e curte o blues em inglês, é inevitável que você caia pro lado pop, de balada e tal. No Meu caso que tenho quatro discos, dois autorais, o Special Moment tem coisas em português e inglês. Então sempre coloquei de forma deliberada um pouco de coisa radiofônica no meio dos standards, porque se você quiser ser um blueseiro que toque na mesma abordagem que toca um americano você vi acabar, como diz o André Christovam, fazendo cover de blues. Porque até e você quiser viajar para os Estados Unidos fazendo blues igual aos americanos, provavelmente será rechaçado. Você está entrando no quintal dos caras fazendo uma coisa que já nasce no sangue deles. Se você leva um ingrediente seu, não importa, uma técnica, uma forma de cantar, uma forma de composição, uma estética diferente terá mais chances. No Brasil é possível misturar blues com balada e o lado pop rock como se fosse uma vitamina musical. Procuro fazer da minha música um laboratório. Música é movimento e você não pode ficar só no território dos velhos standards, porque acaba se repetindo.
EM – Como músico às vezes você se vê obrigado a acompanhar outras bandas de outros gêneros para continuar tocando?
AA – Já toquei há muito tempo com artistas ligados ao Carnaval. Pouca gente sabe disso porque sempre ficou meio que em “off”. Na Bahia você pode ser quem você quiser, mas tem um monte de impostores se passando por isso ou por aquilo, basta que tenha uma campanha de marketing por trás. Isso é uma verdade indiscutível e é aceita como. Mas isso é assunto para uma outra entrevista. No meu caso, gravei com alguns artistas baianos, mas quando resolvi trilhar uma carreira solo não fiz concessões. Me vejo obrigado a seguir um caminho e é o que tenho feito ao longo desses 25 anos e sei que consegui muito para quem é sozinho. Que não tem nenhuma gravadora como suporte, nenhum padrinho aqui ou ali. Tudo aconteceu pela minha vontade deliberada. Já consegui gravar quatros discos e um DVD, um projeto de produção um programa de rádio voltado para o blues. Enfim, é você construir um biografia com credibilidade, uma carreira respeitada, sem fazer concessões. Acho que tenho um creto de respeito das pessoas por conta disso, por ser fiel ao que tracei pra mim desde o início. Experimentando uma forma musical aqui e outra ali, mas sem sair do que me propus que é fazer blues. Me sentiria mal se fosse para apenas “matar cachê”, seria uma prostituição profissional. Vejo dessa maneira, no meu caso. Salvador é um lugar que conspira contra o que eu faço, mas eu sigo em frente, sempre afastando algumas pedras no caminho e passando por cima de outras, quando é necessário atropelar e crio uma blindagem para não me contaminar. Porque se eu deixar me abater por conta de um grande lobby de marqueteiros e por cervejarias eu não vou realizar nada.
EM – Você é um dos blueseiros brasileiros adepto à técnica da slide. Sei que você tem uma guitarra modelo Álvaro Assmar. Quais as particularidades desse instrumento? Ele é preparado para a slide, é uma signature?
AA – Eu gostei muito da técnica da slide, primeiro com os Beatles, achava que o George Harrison tinha uma linguagem única, gostava da forma que a guitarra soava, meio chorosa e tal. Quando ouvi Duane Allman foi para entortar a cabeça de vez. Eu queria fazer aquelas coisas e continuava buscando guitarristas que tinham linguagem similar, até para criar uma maneira de “pensar slide”. Não da forma convencional, porque é um outro alfabeto de guitarra, tem várias afinações, eu uso afinação standard. Muita gente não entende porque eu não uso afinação aberta ou alguma afinação alternativa, não sei, acho que é legal no meio do show ter condições de fazer uma frase convencional como qualquer guitarrista faria e no meio jogar um “lick” de slide que dê uma estética mais bonita ao que você está fazendo. Com relação à guitarra Álvaro Assmar, sempre gostei muito das Fender Stratocaster e o luthier carioca Jorge Marinho, que está radicado na Bahia a mais de 15 anos, na época que eu estava completando 20 anos de carreira, preparando o Blues a La Carte, me perguntou o que eu achava da ideia de ter um instrumento assinado por mim dentro das especificações que eu gostaria. Confesso que nunca havia pensado naquilo porque desde o início da minha carreira usei guitarras Giannini por falta de grana para ter uma Gibson ou uma Fender. No meu caso até dei sorte, acabou caindo no meu colo a oportunidade de ter uma Fender Stratocaster 1969. Aí fiquei encantado com aquilo porque era algo que estava longe da minha compreensão, um cara de 17 para 18 anos com uma Fender Stratocaster quando ainda nem trabalhava, só juntava grana. Ela foi minha companheira por muitos anos, até o início dos anos 90. Depois adquiri uma Gibson Les Paul Custon 1973. Sempre me vi entre essas duas guitarras. A Rickenbacker também, no que diz respeito a 12 cordas. Mas as duas tinha mais a ver com que eu estava fazendo na época. Bom, aí o Marinho me perguntou aquilo e eu achei legal, mas disse que desde que tivesse uma característica Strato. Na época usava uma Fender Strat Plus que foi de um grande amigo meu, o guitarrista Rudnei Monteiro, que veio parar na minha mão, estava começando as gravações do Blues a La Carte. Então, a sonoridade desse disco tem a cara da Strato, salvo algumas exceções como Fio da Navalha, Prisioneiro que são músicas mais hard blues, mas usei Strato, quer dizer, já usei a guitarra Álvaro Assmar. Às vezes ela soa como uma Gibson, a textura de overdrive que utilizei naquelas músicas. Essa guitarra é um conceito de Stratocaster com hardware da própria Fender, tarraxas, captadores Noiseless e uma ponte diferente, que vem as oitavas já fixas, não tem de ficar regulando. Ela garante uma boa afinação. Diria que a guitarra Marinho, modelo Álvaro Assmar é a minha ferramenta favorita. É uma Strato que tem mais madeira, porque o cuteway superior não é tão curvo quanto o da Strato. É mais reto, digamos, flertando com a Telecaster. Proporciona uma capacidade de “sustain” em determinadas notas que eu gosto muito. Não consigo me ver com outra guitarra, ela foi feita para a medida da minha mão, de maneira que eu possa tocar da forma convencional, já que eu uso palheta e os dedos também por conta até do slide. Tive de reaprender a tocar por conta disso. Tocava slide antigamente com palheta, ao vivo, é incomodo esse negócio. Mais aí comecei a pensar diferente a partir de uma observação do André Christovam que diz que cada dedo é uma palheta. Nunca consegui esquecer isso, foi tão contundente, tão forte, foi como um soco na boca do estômago. Do tipo, volte pra casa e aprenda tudo de novo e foi exatamente o que eu fiz.
EM – Além dela, quais os equipamentos que usa no palco e no estúdio?
AA – Atualmente uso um Resonator FR-50 da Fender. Utilizo isso nos amplificadores Classic V8 da Meteoro que também sou endorse. Só que os meus amplificadores são modificados por Otávio Miranda da T Miranda, uma empresa que produz amplificadores e pedais aqui na Bahia. Sou muito fã de um pedal da T Miranda que também não consigo me ver sem ele que é o Scream X3, um pedal desenvolvido pelo Otávio em 2002. Ele me apresentou esse protótipo, eu sugeri algumas alterações nos médios que eu sou fã. Acho que evidencia as frequências mais importantes da guitarra. Tenho dois desses pedais. Um na pedalboard da Landscape que por sua vez tem um Wah Wah Cry Baby da Dunlop, um pedal normal que todos conhecem. O Scream entra em quatro pedais da série 10 da Ibañez. Tenho um carinho por esses pedais porque são todos japoneses, ou seja, a qualidade é muito superior ao que viria a ser produzido em Taiwan. E também por ter sido adquirido na época que meus filhos nasceram e eu associo isso de alguma maneira. Os quatro pedais que me referi são o Bimold Phazer, o PH 10 que tem uma textura muito variada de Phazer, O Twin Cam Chorus que na verdade é um chorus duplo estéreo no mesmo pedal. Tem uma onda em um sentido e outra em sentido contrário, o que sugere um pseudo Leslie em algumas situações de palco. Em seguida vem um Swell Flanger e um Delay. Todos eles são digitais e de origem japonesa. Esse é o meu pedalboard e isso tudo ligado aos amplificadores da Meteoro customizados que viram outra coisa, completamente diferente do que sai da linha de montagem. Reúne portabilidade, qualidade de timbre e potência que pode ser usado em qualquer situação. Levo até para estúdio de ensaio. Não costumo tocar em amplificadores de outras pessoas, levo sempre o meu. Por fim, uso um violão eletro-acústico da Crafter GA-6 que é um instrumento voltado para as características do que eu faço.
EM – Você tem um selo próprio, quando foi que sentiu essa necessidade e porque? Existe um monte de selos de blues no Brasil: o Delira Blues, a Bluestime Records, o Chico Blues. Isso se deve ao fato de não haver gravadoras interessadas nesse som?
AA – Nunca fui procurado por uma grande gravadora. Eu tinha uma idéia e resolvi seguir em frente. Tinha que criar meus próprios mecanismos para isso e regulamentar minha obra de algum modo. O primeiro produto que saiu pelo meu selo, o Starblues, foi o meu DVD o Blues a La Carte Ao Vivo e me sinto orgulhoso. Tenho certeza que isso vai ser útil para outras gerações de músicos que sintam a necessidade que eu tive em torno do meu trabalho, dos meus mecanismos e não ser refém de quem quer que seja. Já fiz parte da Top Cat do Big Gilson. Tive a oportunidade de lançar dois álbuns pela Top Cat, o segundo e o terceiro. Sou muito amigo do Big Gilson e ele me fez esse convite mais ou menos em 2001 e eu achei ótima a idéia.
EM – Está vindo trabalho novo por aí?
AA – Não diria que é um trabalho novo. Como eu disse antes, o meu aniversário é dia 20 de março e vou comemorar com um show que será gravado em DVD e CD. Tenho prazo para entregar essas dois trabalhos para os patrocinadores até o dia 30 de novembro. Vou incluir algumas músicas inéditas.
EM – Como um blueseiro agüenta um mês de carnaval?
AA – Só posso responder por mim. Com disse antes, crio uma blindagem, não tomo conhecimento porque realmente não estou interessado, nada me diz respeito. Se algum dia receber algum convite de trabalho que evidencie o meu trabalho dentro da esfera do Carnaval, me interessa sim. Porque sou um artistas e um artista é um pavão, tem de mostrar a plumagem. Agora, se você me perguntar o que aconteceu no Carnaval de Salvador eu não saberia lhe responder.