Pick up the guitar and play the blues
When the fellas joined it's to break the rules
One bottle of bourbon, one bottle of gin
Plug the amps and bring the beer
Play slow in the jukejoint
Yeah harmonica you get my point
Listen Buddy Guy and Burnside
Call it Muddy Waters blues don't die
The sun is hot as a barbecue
The sound is crazy we call it blues
Call my baby and the neighborhood
And tell everyone don't forget the food
The night is coming and people don't stop
Drums like thunder the party is hot
The music is high so even my mind
Two drunk man start a fight
A knife shines, a bottle neck cuts
A workman lies in his own blood
The party is over when police arrive
It was the end of a real blues night
segunda-feira, 23 de dezembro de 2019
segunda-feira, 16 de dezembro de 2019
Discos, shows, aulas e todas as correntes de Edu Ribeiro
Edu Ribeiro
Texto: Eugênio Martins Jr
Foto: Site oficial Edu Ribeiro
Além do discos premiados do Trio Corrente, Edu vem deixando um verdadeiro acervo de música intrumental, gravando sistematicamente com outros artistas de jazz brasileiro.
Seu disco solo Já Tô Te Esperando com composições próprias e participações de Chico Pinheiro, Daniel D’Alcântara, Fábio Torres, Paulo Paulelli, Thiago do Espírito Santo e Toninho Ferragutti saiu em 2006.
Na Calada do Dia, disco de 2007, traz Guilherme Ribeiro (acordeom), Rubinho Antunes (trompete), Gian Correa (violão 7 cordas) e Bruno Migotto (contrabaixo) e composições de Chico Pinheiro e Léa Freire. E foi esse show que veio a Santos, dentro do festival Sesc Jazz.
E a maravilha Folia De Treis (2018), que veio com uma formação nada comum, o bandolin de Fábio Peron, o acordeon de Toninho Ferragutti e a bateria de Edu. São dez temas tocados em 45 minutos que também concorrem ao Grammy.
Com o Trio Corrente, lançou Corrente, Volume 2. Volume 3 e Song for Maura (com Paquito D’Rivera). Com Daniel D’Alcântara, Vitor Alcântara, Sizão Machado e Tiago Costa lançou Horizonte em 2003. Com Chico Saraiva e Zé Nigro lançou Água em 1999) e foi responsável pela trilha do documentário “Carroceiros”, do diretor Alexandre Rathsam 2005.
Edu participa ainda do quinteto Vento em Madeira, com dois álbuns gravados, Vento em Madeira (2010) e Brasiliana (2013). Liderado pela flautista e compositora Léa Freire, o grupo tem Teco Cardoso (sax e flautas), Tiago Costa (piano), Fernando de Marco (contrabaixo) e ainda a participação especial da cantora Mônica Salmaso nos dois álbuns.
Na estrada, tocou com Johny Alf, Paulo Moura, Dominguinhos, Rosa Passos, Ivan Lins, Dori Caymmi, Arismar do Espírito Santos, JoYamandú Costa, Chico Pinheiro, Léa Freire, Joyce, Bocato, Hamilton de Hollanda só para citar alguns.
Eugênio Martins Júnior - Você começou a tocar com seis anos. Quando se bandeou para o jazz?
Edu Ribeiro – Adorei a pergunta. Comecei tocando com meus irmãos. Era o filho mais novo de três. Depois que minha mãe faleceu meu pai teve mais dois. Cinco irmãos. Os dois mais velhos tocavam Beatles, Rolling Stones, guitarra e baixo. E meu pai tinha uma banda de baile e deixava tudo montado na edícula de casa. Primeiro a gente brincava de esconder atrás dos instrumentos, depois passamos a tocar. Quando chovia a gente ficava na edícula. Então um começou a tocar guitarra, o outro baixo e a bateria sobrou pra mim. Só que o meu pai tinha ciúme da bateria e não me deixava tocar, era uma Ludwig de acrílico linda, onde eu improvisava. Meu avô me deu um surdo de escola de samba e eu também tocava. Depois que minha mãe morreu mudamos e íamos à edícula com menos frequência. Comecei a ouvir muita música, os discos de vinil que meu pai tinha em casa. Fazia a seleção em um dia e ouvia no outro. Tinha de tudo, Johnny Alf, Djavan e muita coisa de jazz. Lembro de um disco em especial, o do Chet Baker, que hoje se chama Chet Baker Sings. Na época tinha outro nome, não lembro, ele canta My Funny Valentine e But Not For Me. No dia que ouvi achei um pouco melancólico, mas fiquei fascinado com aquilo. Meu pai me deu a dica: “escute como ele canta e como ele toca, improvisando em cima do tema”. Meu pai e a minha família inteira são músicos de baile. Não é nenhum demérito.
EM - Muito ao contrário. Você cria uma casca grossa e toca de tudo.
ER – Exato. Mas no baile não tem improvisação. Eles não são improvisadores. Porém, qualquer música que você toque eles também tocam até o final. Não se apertam. Então aquele disco era lindo. A sonoridade.
EM – Você lembra a idade que isso aconteceu?
ER – Acho que 11 anos. Tocava rock. No baile só entrava pra tocar a parte do rock nacional, mas queria tocar as outras coisas também. Então tinha baile de debutantes onde tocávamos standards de jazz antes de anunciar o nome da aniversariante, mas ninguém improvisava. Então eles falavam o nome e a gente lá tocando, piborundêeeee, e eu ficava encantado com a vassoura, que nesse disco do Chet também tinha. Ali tive contato com essa concepção jazzística. Tocar e improvisar em cima de um tema. O que o improvisador quer te dizer, com aquela ferramenta de linguagem que ele tem são notas musicais em cima de um acorde. Depois fui atrás de outras coisas que meu pai não tinha. Comprei um do Stanley Jordan com o baterista Jeff “Tain” Watts. Discos do Charlie Parker, que era o que chegava. E um disco do Jack DeJonette, que era totalmente vanguardista, free jazz, da ECM. Achei muito diferente de tudo o que tinha ouvido, mas legal também. Com Lester Bowie (trompete), Eddy Gomez (baixo) e John Abercrombie (guitarra). Fiquei fascinado com aquilo e vi que precisaria estudar mais o instrumento. Pra ter uma conversa com aquelas pessoas. Decidi que queria ser músico. Não me afastei do baile, mas queria alguma coisa diferente disso. Aos 17 anos já tinha meus grupos de música instrumental lá em Florianópolis. Aí decidi vir estudar na Unicamp. Estou vendo você com esse disco Songs For Maura (Trio Corrente), meu primeiro grupo foi com o Felipe Moritz, um saxofonista que morava em Frorianópolis e apaixonado pelo Paquito D’Rivera. Então tocávamos covers dele. E depois de 20 anos conheci o paquito e toquei várias músicas dessa época, foi muito emocionante. Ouvir aquele som de saxofone na tua frente. Você tem um ídolo e encontra com ele e, isso é uma das coisas mais emocionantes na profissão de músico, não é o som que você conhece dele, a voz do instrumento.
EM – O acrodeon confere um clima às vezes melancólico, porém classudo. O disco Folia de Treis (2018) conta com Toninho Ferraguti e é uma formação inusitada pra trio a gente não vê muito por aí. Gostaria que falasse sobre esse trabalho.
ER – Gosto muito de um álbum chamado Quinteto do Radamés, que tinha o Chiquinho do Acordeon, o Rafael Rabelo. Me remetia ao tempo do baile, quando tocávamos cinco horas sem parar. Acabava seis horas da manhã e o tio Nelson, que a gente chamava ele de tio, pegava o Acordeon, o seu Evarildo pegava o trompete e meu pai pegava o violão e tocavam. E muito engraçado, porque a primeira vez que pude fazer um trabalho autoral, meu primeiro disco em 2006, o Já Estou te Esperando, fiz com essa formação, só coloquei baixo e bateria. E chamei o Toninho (Ferragutti). Foi pela Maritaca, início do Trio Corrente. E o Trio Corrente deu super certo e logo veio o Vento em Madeira e fui deixando de lado a minha carreira de compositor. Só retomei agora com o na Calada do Dia, que toquei aqui hoje. Em 2018 recebi o convite do selo Black Streaming para gravar um disco. E eu tinha acabado de gravar um disco com as minhas músicas e não componho tanto assim. Pensei em fazer um projeto com alguém para dividir um pouco as coisas. Então convidei o Toninho Ferragutti e o Fábio Peron. É uma formação completamente inusitada, que tinha tudo pra não dar certo. Convidamos um baixista que não pode fazer. Então decidimos ensaiar assim mesmo. Até o primeiro ensaio estávamos apreensivos, mas quando acabou vimos que ia dar certo. O Peron tocou um bandolão, que é um bandolim com uma oitava a baixo, aquele que está na capa. Gravou duas faixas com o bandolim e oito com o bandolão. Gravamos com o Tiago Monteiro, que é um técnico de som maravilhoso e o som do disco é lindo.
EM – Esse disco foi gravado em Ribeirão Preto?
ER – Sim. Sempre gravei meus discos pela Maritaca, selo da queridíssima Léa Freyre. E olha que sorte, esse disco está concorrendo ao Grammy Latino. Quando recebi o convite foi pra gravar logo, recebi o convite em março e a gravação era em junho.
EM - Falando em trio, teve uma época que os grupos de jazz reuniam uma parafernália eletrônica, principalmente nos anos 70 e 80. Agora o que existe é um monte de trios com baixo, bateria e piano. Voltando ao mais puro jazz acústico. Nesse festival inclusive, com Avishai Cohen, Amaro Freitas, o Marc Perrenoud e até o Trio Corrente. Gostaria que falasse sobre isso.
ER – Tem o resgate do som acústico. Pega os anos 50, quando os caras começaram a gravar o som acústico, bateria, baixo e piano juntos, os discos do Coltrane, Bill Evans, aquilo é gravado com um microfone que pega uma tomada de som. E tem uma coisa ali muito importante que é a mixagem que tem de ser feita pelos músicos. Por exemplo, se o cara da técnica falar que a bateria da alta, não tem onde abaixar o som, só na mão do músico. O piano tá alto, só na mão do músico. Os músicos tinham o som na mão. A partir dos anos 70, quando começa a estrar a tecnologia, a música pop, muda o som da bateria, entra contrabaixo elétrico, entra o rock, começam a experimentar mais coisas, o som sintetizado, Miles Davis fez isso. Esses grupos que você citou, Mahavshnu, Weather Report tocavam alto. Adoro o Peter Erskine, o baterista do Wheater, e ele me falou que na época que tocou com o grupo ficou com problema de audição.
EM – A Weather era uma usina com o Peter e o Alex Acuña nas baterias e percussões?
ER – Isso, e o Jaco tocando daquele jeito e o Zawinul com aquela parafernália eletrônica. Então, tem sim o resgate do som acústico. No início dos anos 90 ouvi um disco, não sei se era da Marisa Monte, com o Carlos Bala e achei o som lindo. Antigamente a bateria tinha o som opaco, os caras botavam fita crepe, abafavam com qualquer coisa. Mas o Bala melhorou o som da bateria no Brasil. Talvez influenciado por Dave Weckl, Steve Gadd, uma geração do jazz/rock, mas já com um som mais aberto. E se você for ver, há discos de MPB dos anos 90 maravilhosos com o piano digital. Não que não tivesse piano nos estúdios, mas porque era moda. O acústico nunca vai ser moda, nunca vai ser datado. É eterno.
EM – Sim, teve a moda do Fender Rhodes, do Oberheim e agora é o Nord.
ER – Sei que tem uma galera fazendo música eletrônica muito bem feita, mas eu não acompanho. E tem um resgate do som acústico, agora tratado, com possibilidade de mixagem melhor, com a tecnologia a favor dele.
EM – Esses dias de festival estava escutando em casa o CD 2 do Trio Corrente e o do Marc Perrenoud que tocou aqui há dois dias. Ambos no mesmo formato, ambos trio, mas a diferença é gritante. Esse sotaque do baterista brasileiro é famoso no mundo inteiro e único. Edu, você que viaja pelo mundo poderia falar sobre isso.
ER – A música brasileira é muito bem vista. Temos pessoas que são muito importantes nessa divulgação. O Edson Machado foi o cara que começou a dar essa visibilidade numa época que não tinha internet. Hoje o cara grava alguma coisa, posta na internet e amanhã um monte de gente já fica conhecendo. Teve um cara que foi morar lá, o Airto Moreira. O Tom Jobim ia lá gravar e levava o João Palma. Os bateristas começaram a chegar. O Airto é um cara importante porque ele compõe dentro do grupo. Coloca as coisas dele.
EM – A gente pode dizer que o jazz brasileiro também carrega o batuque da escola de samba?
ER – O jazz brasileiro é conhecido não só pelo ritmo, mas também pela harmonia e pela melodia que é muito rica. E ainda temos grandes improvisadores e grandes compositores, como Vila Lobos, Pixinghinha, Tom Jobim, Edu Lobo. Então, é pensar em tudo isso com a concepção jazzística. A música que a gente tenta fazer é isso.
EM – Já que estamos falando nisso, como é transportar um clássico da música brasileira que tem letra de Tom Jobim, Djavan, Dorival Caymmi pra o instrumental. Qual cuidado você tem?
ER – No começo do jazz eles pegavam os standards, as músicas da Broadway e tocavam da maneira jazzística. O Trio Corrente faz muito isso e o público reconhece. Claro que precisa fazer uma arranjo, você precisa tratar bem aquilo. Não vai conseguir melhorar porque já é lindo, mas não pode distorcer aquilo a um ponto que não exista mais. É diferente do que eu fiz hoje, que é muito difícil, um som com músicas autorais. Tem de pegar um pouco pela performance, de um jeito que não fique chato e repetitivo. Misturar os ritmos, as dinâmicas. Mas quando você toca uma música conhecida é como se encontrasse um camarada em uma festa que você não conhece ninguém.
EM - Como foram as gravações do Song For Maura com o Paquito D’Rivera. Foram ao vivo no estúdio?
ER – O Paquito não queria tocar com o Trio Corrente. Havia tido uma experiência ruim com outros músicos que não era a sua banda. E o Paquito falou para o nosso produtor que se quisessem a presença dele em um festival teria de ser com a sua banda. E não dava porque era um projeto do Trio Corrente. Ele já conhecia o Paulo (Paulelli) e o Fábio (Torres). Ele sugeriu que o trabalho fosse feito com o Celso (de Almeida), baterista da Rosa Passos. O engraçado era que a conversa era ao telefone enquanto a banda dele ensaiava e o pianista Alex Brown, que conhecia o Trio Corrente e estava presente no ensaio, disse que o Paquito poderia vir tranquilo que ele nos conhecia. Daí ele veio tocar com a gente na fé. Ele mandou um repertório dele que a gente já conhecia e pediu um repertório nosso pra se adaptar. Fizemos um ensaio aberto das 11 às 13h e deu tudo certo. Fomos almoçar e ele disse que tínhamos de gravar aquilo. Fizemos alguns shows e ele nos convidou para ir à Europa e nós o convidamos novamente ao Brasil e nunca conseguíamos gravar. Aí um dia ele disse que precisávamos parar e gravar. Gravamos em um dia no estúdio Cachoeira, na rua da minha casa. Ele levou a gravação lançou pelo selo dele e fez um certo sucesso.
EM – Um certo sucesso não, ganhou dois Grammys.
ER – Sim, ganhamos os prêmios. Mas a música ficou boa. O Paquito é um cara muito legal. Ele disse que queria entrar na nossa música. Então a gente vai aprendendo com as pessoas. Essa semana fizemos um show com o Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo e eles pegaram nossas músicas pra fazer os arranjos e tocar. E como fui eu quem tratou o show pedi o repertório deles pra gente entrar também naquilo.
EM – Você toca no Trio Corrente, dá aula, tem teus trabalhos solos, acompanha inúmeros artistas, e arranja tempo para novos projetos como esse quinteto. Você é só músico ou trabalha também?
ER – Músico trabalha muito. Eu brigo com isso sempre. Acordo todos os dias às 6h da manhã. Dou aula em duas escolas, Faculdade Santa Marcelina, sou coordenador pedagógico da ENESP e é claro que às vezes me sinto sobrecarregado. Mas gosto disso. E é engraçado. Às vezes eu penso que poderia estudar mais. Mas se tenho mais tempo pra estudar eu estudo menos. A pressão do dia a dia me faz estudar. O que mais me tira do foco são as redes sociais. Preciso tomar muito cuidado.
EM – Um pouco sobre esse momento cultural que a gente está vivendo, gostaria que falasse sobre a importância de um festival grande como esse, com mais de 80 shows, e com tamanha diversidade musical.
ER – O Sesc tem um papel muito importante na cultura nacional. Há muito tempo ouço que o Sesc faz o papel do Ministério da Cultura, que não está funcionando muito bem. Falo da música que é o meu campo. Mas na dança, teatro, esporte, recreação, terceira idade, jovens, é incrível o que acontece. Dança clássica, dança afro brasileira, muitas vezes de graça. Veja, sou de Florianópolis e cheguei em Campinas em 1992 e em 96 ou 97 foi a primeira vez que toquei no Insturmental Sesc Brasil que não tinha esse nome, não era televisionado e era na Avenida Paulista. Toquei com o Edson Gomes e o Trio Água. Depois daquilo eu me senti profissional. É uma papel importante pra nova geração que está começando a tocar. Toda a classe artística deve muito ao Sesc e esse é o maior festival de de jazz do Brasil sem dúvida. Já tivemos festivais grandes, mas esse festival leva três semanas em várias cidades ao mesmo tempo. Toquei em São Paulo, Araraquara, Bauru e Santos. Em Araraquara e Bauru fizeram clubes de jazz dentro do ginásio de esportes. Parecia o Blue Note de Tóquio. Outra coisa importante que o Sesc fez pro jazz há uns dois meses foi trazer a Lincoln Center Orquestra pra ficar duas semanas no Brasil. O Wynton (Marsalis) me falou que eles nunca fazem uma residência tão longa. É uma coisa que chama a atenção do mundo inteiro para o Brasil.
segunda-feira, 25 de novembro de 2019
Yellow Moon, uma aula de música, de história e de New Orleans.
Na era pré-histórica os LPs chegavam aqui, fossem eles de artistas famosos ou não. O trabalho de garimpo valia muito nas prateleiras das lojas.
Assim conheci Yellow Moon (1989), de uma banda esquisita lá de New Orleans, os Neville Brothers. Naquela época eu só queria saber de AC/DC, Iron Maiden, Ramones e os irmãos Neville não estavam no radar.
Já tinha escutado o Gumbo, do Dr John, que até achei legal, mas confesso que na época não entendi a profundidade da música e da cultura de New Orleans.
Antes de sentir o som do Neville Brothers o que me chamou a atenção foi a capa, com umas pinturas vodús, humanos com cabeça de animais e um índio – como disse, ainda não conhecia a tradição dos índios de New Orleans – e na contra capa os quatro irmãos com aquele visual só deles.
Então, a gente entrava na loja e pedia pra escutar os discos e nesse quesito eu era o cara mais pentelho do bairro. Ouvia até coisas desconhecidas, como Neville Brothers.
E foi nessa que senti as primeiras batidas daquela percussão hipnótica em My Blood, não menos do que a voz do Cyril Neville lamentando as merdas que aconteciam na África e na América negra. E ainda acontecem. O sangue deles fervendo e, naquela hora, o meu também.
Em seguida, o saxofone de Charles Neville anunciou Yellow Moon, a música de um quase corno que dá nome ao disco cantada pelo irmão Aaron e que faz dançar a lot. Seja qual for o assunto, eles vão te fazer dançar. É New Orleans.
Fire and Brimstone bota fogo na sala com sua potente parede de metais, cortesia de um dos grupos mais legais daquela cidade, os Dirty Dozen Brass Bands.
A mudança de direção acontece com A Chage is Gonna Come. O tema clássico de Sam Cooke quebra o clima predominantemente dançante e mostra o lado religioso de New Orleans. Mais adiante, a parede de teclados de Will the Circle Be Unbroken vai nos levar pelo mesmo caminho da espiritualidade.
Rosa Parks ficou famosa ao se recusar sentar em um banco destinado aos negros no fundo de um ônibus em Montgomery, no estado segregacionaista do Alabama. Foi presa e tornou-se símbolo da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Em Yellow Moon ela ganha o funk/rap Sister Rosa, reverenciando toda essa história de resistência.
With God on Our Side e The Ballad of Hollis Brown foram modificadas daquele jeito que só quem tem coragem e sabe realmente o que está fazendo pra mexer com o velho Bob Dylan.
Com um baixo marcante, Wake Up assume toda a dramaticidade de um tema anti bélico, assim com em With God on Our Side. Após trinta anos, nada mudou na cena política.
Hipnótica, Healing Chant não podia ser mais vodu. Se você assistiu o filme Coração Satânico, lançado na mesma época de Yellow Moon, vai saber do que estou falando. As imagens vão vazar do teu cortex na hora. Coisa que Voodoo não é. Fala sobre o assunto, mas é um mezzo funk bem menos impressionante que a outra.
O disco fecha com Wild Injuns apontando, já naquela época, para o que acontece hoje nos palcos e ruas da cidade mais diversa e musical dos EUA. Funk até umazora.
Enfim, Yellow Moon é pop e genial ao mesmo tempo. Poucos artistas sabem fazer a mistura como os irmãos Neville. Uma aula de música, de história, de New Orleans.
O time inclui Aaron Neville (voz, teclados, pecussão), Art Neville (voz e teclados), Charles Neville (sax, percussão, backing vocais), Cyril Neville (voz, bateria, percussão), Brian Stoltz (guitarra), Tony Hall (presença continua nos festivais do Bourbon Street em São Paulo, no baixo, percussão, backing vocais), Willie Green (bateria), Brian Eno (teclados, efeitos sonoros, e voz em A Change is Gonna Come), Daniel lanois (guitarra, teclados e backing vocais), Malcolm Burn (teclados, guitarra), The Dirty Dozen Brass Band (sopros), Eric Kolb (programação de teclados), Kenyatta Simon a Kufaru Mouton (percussão em My Blood), Aashid Himmons and Terry Manual (teclados em Sista Rosa).
Músicas:
My Blood
Yellow Moon
Fire and Brimstone
A Change is Gonna Come
Sister Rosa
With God on Our Side
Wake Up
Voodoo
The Ballad of Hollis Brown
Will the Circle Be Unbroken
Healing Chant
Wild Injuns
sexta-feira, 8 de novembro de 2019
Luta de Classes
(Pra lembrar que o samba é e sempre será resistência)
Cresceu
O sentimento de ódio no peito do homem
Esquerda, direita e o povo morrendoo de
fome
Dois lados da mesma moeda jogando com a
sorte
A luta de classes já é uma realidade
A autoridade tem a obrigação de
intervir
Mas também participa da promiscuidade
Corrompendo, pagando, roubando e
morrendo de rir
O europeu que chegou nessa terra
trazendo a tristeza
Roubou, estuprou e matou de maneira
tão vil
Enganou o povo nativo de rara beleza
Disse que a terra era dele e chamou de
Brasil
500 anos passaram e os loucos voltaram
Continua o extermínio do pobre e a
escravidão
E a classe média que é gado e capacho
do rico
Carrega uma arma no coldre e a bíblia
na mão
E o samba que nasceu no morro e na
opressão
Vai chorar e vai sofrer, mermão
Mas não vai se calar nesse
momento, não
segunda-feira, 4 de novembro de 2019
A avalanche que veio do Canadá, Shawn Kellerman
Texto: Eugênio Martins Júnior
Fotos: Cezar Fernandes
O apresentador anuncia Lucky Peterson Band, mas quem sobe ao palco é Shawn Kellerman (guitarra), Bruno Falcão (baixo), Flávio Naves (órgão) e Fred Barley (bateria). Os três últimos são figurinhas carimbadas no álbum do blues nacional, integrantes da requisitada banda Blues Beatles, já acompanharam vários figurões do blues por aqui.
Os caras sobem ao palco com um lutador sobe no ringue e atacam Love of Mine, energia pura em forma de shuffle, e Kellerman mostra que não viajou ao Brasil só para visitar as belas praias fluminenses. Faz jus à sua fama de performer enérgico. A cena aconteceu no Rio das Ostras Jazz e Blues Festival (RJ), em junho desse ano, na primeira apresentação da banda, no palco Costazul.
O canadense Shawn Kellerman ainda é um desconhecido no Brasil, mas é o principal integrante da banda de Peterson desde 2012, depois de ter um trecho percorrido com a banda de Bobby Rush, participou do excelente Raw, disco acústico do cantor.
Guitarrista da geração pós Stevie Ray Vaughan, Kellerman entrou cedo em contato com o blues. Seu pai, um entusiasta e integrante de uma banda amadora, foi o principal incentivador. Aliado ao fato de também ter tido contato com Mel Brown o guitarrista da banda de Bobby “Blue” Bland, que por sua vez foi um dos grandes cantores de blues de todos os tempos.
Kellerman lançou três discos em carreira solo: Land of 1000 Dreams (2007), Blues Without a Home (2009) e Down in Mississippi (2015). Recentemente participou como músico e produtor do novo álbum de Lucky Peterson, o petardo 50 Just Warming Up!, celebração aos cinquenta anos de carreira de Peterson, de um dos grandes do blues atual.
Antes de sua entrada em cena no palco Costazul no Festival de Rio das Ostras, um dos maiores do Brasil, conversei com Shawn e com Peterson (entrevista já publicada aqui).
As foto publicadas no blog são do fotógrafo oficial do festival e meu grande amigo Cezinha Fernandes. A produção foi de Stênio Mattos.
Eugênio Martins Júnior - Li que teu pai foi o grande incentivador para você entrar na música.
Shawn Kellerman – Definitivamente ele começou isso. Comecei tocando em sua banda de blues de finais de semana. E levava vantagem porque ele também era um promotor de blues. Então tive a oportunidade de ter contato com alguns blueseiros americanos quando iam ao Canadá, nos arredores de Toronto, onde eu vivia. E ele também me levava em viagens aos Estados Unidos onde pude ver BB King, James Cotton e Buddy Guy. Tinha apenas cinco anos de idade. Veja, ele teve uma banda e depois um clube e esses eram os motivos de viajar para os Estados Unidos frequentemente.
EM – Você falou sobre a coleção de discos dele, você lembra de alguns desses álbuns?
SK – Luther Allison, Albert Collins, Johnny Winter, Otis Clay. No Jazz, Oscar Peterson, Errol Garner. Muitos discos de rock. Mas ele amava Chicago blues, soul music, tinha muita coisa boa.
EM – Qual instrumento que ele tocava?
SK – Piano, mas não era profissional, era mesmo uma banda de final de semana. Mas foi o suficiente para me mostrar o caminho e me apoiar.
EM – Quando vocês saiam de férias iam para as cidades lendárias como New Orleans, Memphis, Austin. Como era isso? Vocês iam nos lugares famosos?
SK – Sim, tinha uns doze anos quando fui ao Chicago Blues Festival e Stevie Ray Vaughan era um dos headliners. E também fui aos clubes clássicos, Kingston Mines, me colocaram a pulseira preta porque não podia beber, mas me deixaram entrar e pude assistir Otis Clay.
EM – Chegou a tocar guitarra?
SK – Não, só tinha 12 anos. Mais tarde, aos 16 anos fui para Austin, Memphis, New Orleans em férias de verão.
EM – Quando então você começou na guitarra? Foi direto ao blues?
SK – Sim, tinha 15 anos e fui direto ao blues. Alguns anos depois o lendário guitarrista que tocou com Bobby Bland, gravou mais de 200 discos e todos os clássicos da ABC, Mel Brown, mudou para a minha cidade e passei a tomar aulas com ele. Impressionante isso ter acontecido. Ele passou a ser meu protetor, mas quando cheguei aos 22 anos ele disse que era hora de eu partir. Que deveria viajar pelo mundo e ganhar experiência. Ele e Otis Clay foram as pessoas que me disseram que eu estava em outro nível.
EM – E o que você fez?
SK – Comecei dando telefonemas. E foi engraçado, liguei para três pessoas que eu conhecia e em dois dias já tinha trabalho e em duas semanas já estava na estrada profissionalmente. Podemos dizer que minha carreira profissional começou quando tinha 22 anos. Desde então viajei por mais de 40 países atuando em diferentes bandas.
EM – Recentemente entrevistei a Dawn Tyler Watson uma cantora canadense. Há uma cena forte, com grandes destaques vindo do Canadá. Gostaria que falasse sobre isso.
SK – Conheço a Dawn. Há alguns festivais espalhados pelo Canadá. Mudei pra lá recentemente e tenho tocado com alguns artistas, mas meu amor é o blues americano e procuro tocar com os artistas de lá.
EM - Onde você vive atualmente?
SK – Vivo em Ontário. Já morei em Washington DC, e quando toquei com Bobby Rush morei no Mississippi. Tenho tocado nos Estados Unidos, Europa e Canadá.
EM - Shawn, assisti teu show ontem e percebi que você entra no palco como um lutador entre no ring. É essa energia que você quer entregar ao público nas tuas apresentações?
SK – Quando era jovem vi Freddie King e mais tarde Luther Allison e via que essa atitude com a audiência era importante Tinha a ver com entregar um show. Você sabe, a música é paixão. Assisti os blueseiros antigos e vi a energia que eles empregavam.
EM – Se trata de entregar ao público uma boa experiência?
SK – Exato. Tem a ver com dar bons momentos às pessoas.
EM - Quando e como começou a parceria com o Lucky Peterson?
SK – Conheci Lucky em 2005. Mas me tornei membro da banda em 2012. Tem sido ótimo, acabamos de produzir o disco 50 – Just Warming Up! Comemorando seus 50 anos no negócio. Bem, ele é como um mentor pra mim. Foi um prazer colocar minhas habilidades de guitarrista e de produtor nesse momento de sua carreira. Ele é um dos grandes músicos de blues vivo e é mais novo entre muitos. Buddy Guy, por exemplo, é quase trinta anos mais velho do que o Lucky. E Lucky continua produzindo blues tradicional.
EM - Como é tocar com Lucky Peterson? Como é essa troca? Ele com uma linguagem mais tradicional e você fazendo um som mais pesado.
SK – Bem, não sei... às vezes você não pode trazer essa energia ao tradicional. Mas quanto maior o contato com o lugar de onde vem as raízes, você passa a senti-las Carrego o blues, o jazz e também um pouco dessa agressividade e um pouco de rock and roll. Temos isso em mente. O núcleo sempre será Muddy Waters, Freddie King, Mississippi Fredie McDowell. Temos de ter sempre o mesmo pensamento que é o de fazer diferente em 2019, e ir progredindo. E tudo bem, tudo progride. Mas sem esquecer de onde as coisas vieram.
EM - Ontem foi o quinto show de uma turnê que inclui sete. Como tem sido essas apresentações no Brasil?
SK – Tem sido maravilhoso. Estou impressionado com as distâncias entre os shows. A hospitalidade das pessoas tem sido ótima. Você sabe, aqui se respeita a tradição musical dos Estados Unidos, que é o blues. As pessoas entendem a linguagem.
EM – Temos uma cena blueseira que sobrevive há anos. Já ouviu falar?
SK – Não sabia. É minha segunda vez no Brasil. Estive nesse mesmo festival há alguns anos. Não posso dizer que sou um conhecedor.
terça-feira, 29 de outubro de 2019
O novo jazz da capitania de Pernambuco, Amaro Freitas Trio
Hugo Medeiros, Amaro Freitas e Jean Elton (foto: divulgação)
Textos e fotos: Eugênio Martins Júnior
Foi mesmo quando Racif ganhou as páginas das revistas da gringa que o Brasil começou a se ligar nessa galera nova que vem lá da capitania de Pernambuco: Amaro Freitas (piano), Jean Elton (baixo acústico) e Hugo Medeiros (bateria).
Racif, Arracif, Arrecife, Recife - cidade estuário, como a descreveu Fred Zero Quarto, do Mundo Livre S/A - com porto, canais, chapada de periferias e com todas os problemas de uma capital.
E Amaro, Elton e Hugo fizeram a trilha sonora para esse filme. Uma música forte, cheia de polirritmias, atitude e genialidade.
Amaro fugiu da sanfona bucólica e do samba jazz saltitante pra contar, batucando nas teclas do piano, a sua própria história.
O primeiro álbum, Sangue Negro, é um chute na cara da preguiça. Todas as músicas são autorais, mas ainda fincadas nas raízes culturais de sua Recife. Encruzilhada abre o disco e a gente logo saca que tem veneno ali naquele frevo.
Sangue Negro colocou Amaro Freitas Trio no mapa. Subindo o Morro começa quebrada como uma viela, mas logo chega o tema e ali o trio mostra que também sabe ser introspectivo quando quer. Sangue Negro fecha o álbum e é impossível não ver ali a cizânia racial em que estamos metidos. Ouça você mesmo e depois me fale.
Como a cidade estuário, Racif, como já foi dito, já veio aberto para o mundo. O jazz livre come solto ao longo das nove faixas lançadas pelo selo inglês Far Out: Dona Eni, Trupé, Paço, Rasif, Mantra, Aurora, Vitrais, Plenilúnio e Afrocatu.
Fiz essa entrevista com o Amaro em setembro de 2019, por ocasião de um show do trio aqui em Santos. Cidade estuário, cheia de canais, com porto, chapada de periferias escondidas atrás dos morros e com muitos problemas ignorados há décadas.
Eugênio Martins Junior – Me conte, como é que foi que você fugiu da sanfona?
Amaro Freitas – (risos) A sanfona é o instrumento que representa Pernambuco e o nordeste. E eu toco piano. E esse tocar piano não é no formato que as pessoas estão acostumadas, erudito ou popular. Toco como se fosse uma percussão. Que também é uma característica muito forte do nordeste. Tem algumas coisas que eu poderia dizer que são fundamentais na minha música. O lirismo, por conta da minha formação dentro da igreja. Igreja de periferia, canela de fogo, aquelas pentecostais. Meus pais são evangélicos. Tive contato muito forte com o ritmo e quando percebi que poderia fazer isso no piano foi uma coisa que me seduziu. Estudo muito isso, clave, ritmo negativo, polifonia. Harmonia também é uma das coisas que me apaixona. Me formei em harmonia tradicional, em produção fonográfica na Universidade AESO e criei uma ligação com piano de um trabalho inteligente, dez a doze horas de estudo. Tentando chegar nesse caminho. Claro, sendo influenciado por várias coisas locais de de fora. Mas tentando encontrar uma originalidade que é minha.
EM – Fala um pouco sobre a tua infância.
AF – Minha vida toda foi uma ralação. Vim de uma periferia chamada Nova Descoberta, que é na zona norte do Recife, e lá na minha escadaria, que ligava o Córrego do Eucalipto ao Alto do Progresso, só eu e um outro cara tínhamos pai. A maioria dos moleques e das meninas não tinham pai nesse lugar. E isso influencia na probabilidade do que será o futuro daquela criança. As mães saiam para trabalhar e não sabiam como ficariam os filhos. Tive pais que fizeram tudo por mim. Da escola particular até a quarta série e só me deixaram trabalhar depois dos 19 anos. Muita coisa fiz por minha conta. Meu pai não conseguia fazer tudo. Mas entendi isso aos 15 anos, quando entrei no conservatório e ele não podia pagar. Então me sinto como uma pessoa que quer fazer algo pelas periferias. Onde as informações não chegam. As vezes as pessoas não sabem o que é um piano. Talvez não saibam o que é uma sanfona. Talvez não saibam o que é música popular e música erudita. E isso é um problema muito sério. Não quero ser uma exceção. “Ahh você teve mérito e conseguiu”. Porra nenhuma. Não existe isso. Tive oportunidade, uma base familiar, como todos deveriam ter. E isso está totalmente ligado ao tipo de construção social que a gente tem no Brasil.
EM – Desde o império que Pernambuco é um dos estados mais importantes do Brasil. Em todos os sentidos, político inclusive. E também é um lugar onde músico bom cai de árvore. Como você sente isso? Quero dizer: “cara eu faço parte disso”. Ou: “pô, é pesadão representar essa tradição”. Ou é: “não, eu tô aqui justamente por causa disso”.
AF – Sim. Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro são três lugares fundamentais para a nossa formação cultural. E de uma forma natural, eu diria, sempre surge alguma coisa. Não há uma galera em Pernambuco que está tomando conta da cultura e que está procurando novos caminhos e etc. Isso não existe. É uma coisa que aflora e vem dos lugares que você menos imagina. Da minha formação no piano na Nova Descoberta ao Moacir Santos, Alceu Valença, Lenine, Cordel de Fogo Encantado, Spok Frevo, Maestro Forró e Orquestra da Bomba do Hemetério. A coisa nasce. A gente tem lá a dificuldade de viver da música. Moro em Pernambuco, mas circulo muito mais fora. A maioria das pessoas têm de descer para São Paulo. Mas eu consigo morar lá, estou nessa linha do tempo, o que surgiu foi o Zé Manoel, o Vitor Araújo, a Sofia Freire, uma nova geração de pianistas. Fora a cena brega de Pernambuco que está bombando. O rap também, o slam das minas é uma coisa que também é muito forte. E de repente nasce uma geração de quatro pianistas. Cada um com um jeito de tocar. Coisa que nunca aconteceu. Ninguém planejou. Somos consequência dessa vastidão cultural que é Pernambuco.
EM – Fazendo uma analogia Recife pode ser comparada a New Orleans, onde um vizinho toca um instrumento e o outro toca outro. E os dois ouvem o ensaio um do outro, e o cara que passa na rua está procurando dois músicos e ouve aquilo. É uma cidade cultural ao extremo.
AF – (risos) Isso que você está falando é muito doido porque o Wynton Marsalis esteve lá e fizemos um comparativo temporal entre o frevo e o jazz. As agremiações, as manifestações nas ruas. Cara, estava acontecendo no mesmo momento em New Orleans e em Recife. Como acontece hoje. A conexão é muito forte. Poderíamos dizer que o centro da minha música é o ritmo, a polirritmia. O mesmo está acontecendo com uma galera em Israel, Europa, Estados Unidos, África, Oriente. Temos o Bad Plus, Avishai Cohen, usando a matriz do país deles. Fizemos umas turnês pela Europa e Estados Unidos e percebi que estamos na mesma sintonia, estamos nos comunicando.
EM – Estava vendo a passagem de som e lembrei que você começou a tocar na igreja evangélica. Entrevisto muitos blueseiros e alguns deles também começaram a carreira na igreja, ou têm a influência dela. Pra você o palco é uma igreja? Tu ali tocando com os outros músicos é uma celebração? Como John Coltrane, Santana, John McLaughlin. Ou, cara não viaja. Não tem nada a ver?
AF – Acho que a música é um portal pra se conectar através da espiritualidade, como muitas coisas. Depende da tua sensibilidade. Eu entendi que o palco era meu lugar sagrado. Sabe aquela pessoa que trabalhou o mês inteiro e não tem dinheiro para pagar as contas e está aperreada? Aí ela chega na igreja e naquelas duas horas se joga, chora, canta, grita e sai renovada. Pronto, pra mim esse é o palco. Pra mim a música é totalmente diferente do que é o padrão do mercado. Gosto do laboratório, mas de tentar levar alegria às pessoas. E receber a boa energia delas. E o palco também é o espelho do público. É incrível, quando comecei a pensar assim as coisas começaram a acontecer. Observo isso de uma forma muito séria.
EM – Como se deu a parceria com o selo inglês que lançou Racif?
AF – Eles trabalham com música brasileira, já tem uma galera, Marcos Valle, Joyce Moreno, Hermeto Pascoal, Azymuth. E meu empresário é um cara altamente antenado. Conseguiu entrar em contato com a Far Out e começamos a negociar um disco. Essa parceria tem um objetivo e com isso tenho conseguido mais espaço, com uma agenda de shows, turnês internacionais. A parceria surgiu por causa da sonoridade do trio, mas com o profissionalismo que ganhamos com a chegada da 78 Rotações, que é a empresa que nos representa.
EM – Estou reunindo entrevistas para um livro que pretendo lançar um dia, sei lá quando, e que vai se chamar Do Samba ao Jazz. Se esse livro tiver 300 páginas e levando em conta que o samba está na página 01 e o jazz na página 300, onde fica a música de Amaro Freitas. Pesa mais pra que lado?
AF – Acho que o Amaro fica pós samba jazz. O jazz do Brasil é muito conhecido lá fora pelo samba jazz. O nosso trabalho está cada vez mais virando uma música livre. A gente traz outras questões, como também a cara do Brasil. Está inclusive virando uma bússola para as pessoas da nova geração que percebe que é possível tocar assim. Sem ser só o samba jazz. Fazer uma outra música, um repertório alternativo. “E se eu quiser fazer um afrocatu jazz? Ou um frevo jazz?”. Com esse formato de piano, baixo e bateria. É curioso isso que você está perguntando , porque saiu uma matéria numa revista da Itália chamada Música Jazz, e na revista Down Beat com os 50 melhores discos de 2018 e o Racif, meu segundo disco entrou. Todas as revistas falavam sobre isso. Que Amaro Freitas não é a música que estamos acostumados a ouvir, o samba jazz e a bossa nova. Que está preocupado com outras matrizes, o Racif que é uma palavra árabe. O Trupé, que é uma modalidade de coco que nasce na cidade de Arcoverde e é tocado com uma sandália de madeira em cima de um tablado de madeira. Então acho que Amaro Freitas poderia ser a última página do livro. (risos).
EM – Quando escuto Sangue Negro tenho a impressão que vocês começam ali conversando através dos instrumentos e depois passam a discutir e a brigar. É muito louco. Nessa música você está falando sobre a tua herança genética e cultural. Ou do sangue negro derramado todos os dias no Brasil? Ou os dois?
AF – A música é uma representatividade muito forte. Primeiro a gente troca um afro jazz, depois um be bop, um subgênero do jazz desenvolvido pelos negros. O John Coltrane é uma das principais figuras. A gente tem um momento de agonia mesmo. Começa com tam tam tam e eu entro com a clave afro. Caramba. É negro mesmo. Depois vem a confusão, porque de repente o mundo resolveu esculachar com os negros. É a parte da confusão que vocês falou. Cada um vai para um lado. A vida bagunçou, velho. O negro é escravizado e perde a sua identidade. E pensar que em alguns países da África tem a Sankofa, um pássaro, um símbolo da ancestralidade, mas que tem dois olhos. Ele olha para o futuro. E quando você tira as pessoas do lugar, elas já não tem mais a ligação com a sua cultura. A música traz essa agonia e sofrimento mesmo. Quando a gente termina está literalmente com o sangue quente, pulsante. Mostrando na pele o quanto é difícil ser negro nesse mundo. O quanto, por ser negro, você já está dez a menos do que um branco. Ou que você tem de ser dez vezes mais. Perfeito, preparado, elegante...
EM – Mantra, do Racif, me chamou a atenção por causa do jeito freefrevojazz. É realmente muito diferente. Aí você pensou, “nesse disco vou mesmo é tocar o terror no free jazz.
AF – É um outro tipo de mantra. A gente tem o mantra como uma música calma. Que você fica ali ouvindo pra entrar em algum transe. Só que esse é um mantra urbano. É o cara que mora ali perto do viaduto, o cara que mora do lado da pista. A nossa vida urbana é aquela realidade. Mantra é uma música livre, ela não tem um rótulo. Como assim? Ela nem é samba e nem é frevo. Linhas de baixo, de piano e eu vou improvisando em cima de estruturas matemáticas e ritmicas, o que é um outro conceito de improvisação, não dentro do campo harmônico, melodias cantáveis e tal. É um outro conceito o mantra. Paço é um frevo que entra no disco que é cheio de isorritmia e polirritmia. A gente leva o frevo pra outro lugar. Na hora do improviso ele vira um jazz classudo. Dá uma virada de chave que ninguém espera. Acho que essas músicas estão totalmente relacionadas ao tempo que a gente vive. Na minha cabeça a música é atemporal quando ela tem dois episódios. Quando é muito original e quando demarca seu tempo. Quando você escuta Beethoven, Villa Lobos, Moacir Santos, Naná Vasconcelos, Johnny Alf a música te leva pra um tempo e um espaço. E você consegue ser transportado. Mas ao mesmo tempo não tem como pensar em Beethoven nos dias de hoje. O que acontece na nossa música é que existe um trabalho de pesquisa muito grande, uma dedicação ao trabalho autoral. E a gente consegue perceber essa diferença gigante entre Sangue Negro e Racif. Vivemos em dois anos realidades distintas. Essa música representa um novo ar, um novo Brasil, pra uma coisa que já tá sendo feito. No samba, no maracatu, no frevo. Só que com outro olhar.
EM – Resolveu peitar com jazz autoral essas gravadoras e TVs que despejam os “produtos” delas todos os dias nos meios de comunicação?
AF – Aos 15 anos ganhei o CD do Chick Corea. Até então só tinha tido contato com a música da igreja. Quando escutei aquilo disse: “Minha Nossa Senhora, como alguém pode tocar assim?”. Só ouvia: “Ó óóóó, glória. Glória a Deus nas alturas!”. Aquilo foi uma facada no meu coração. Chick Corea foi o autor que me impulsionou a querer viver de música.
EM – Um dia tu vai contar isso pra ele.
AF – Já falei no Montreux Jazz Festival. Retomando, tive um professor que disse que talvez eu não conseguisse fazer logo o estava querendo. Disse que o importante é que eu entrasse no mercado. Para depois selecionar o que queria. Foi o que fiz. Toquei em banda autoral, banda de brega, em restaurante, mas aí você fica experiente. Até com relação a grana, com o próprio negócio. Quando encontrei esses caras foi um casamento, porque eles estavam para a música autoral. O que é legal que não tem nada de surfar na onda do outro. De pegar um grande nome. É uma coisa honesta. Nos encontramos todas as semanas para ensaiar e aí passa os trechos e aí fala da mãe, da esposa, do cachorro. Volta ao ensaio. E a gente conseguiu colocar a unidade de grupo no trabalho. As pessoas comentam isso com a gente. Há grupos excelentes, mas que não soam como se fosse uma unidade. Po que todo mundo toca com todo mundo. A gente precisa de tempo para fazer a música que queremos fazer. É possível viajar e voltar pra Recife. Na mesma semana eu toquei no Montreux, o Sesc Instrumental, no Consolação, e o This is Club, no Lincoln Center. Sabe a importância de voltar pra Recife? Quantas pessoas perdem essa referência. “Pô, o cara tá tocando em Nova Iorque. Nunca mais vou ver”. Estamos fazendo uma música que o mundo está ouvindo. É possível. A ideia do “é possível”, se perdeu. Às vezes o músico toca com o grande artista e esse é o trabalho sério. E aí grava um álbum instrumental por diversão. Não, velho. Posso ser o protagonista e só fazer meu trabalho e torná-lo sustentável. Então vou estudar muito. Vou fazer o novo. Não que seja ruim gravar os standards, Tom Jobim, etc. Mas a vida é só ida. Não podemos passar tanto tempo tocando a mesma coisa. Por que às vezes nem é mais desse tempo. O tempo já está necessitando de “outra” coisa que seja coerente com ele.
sexta-feira, 25 de outubro de 2019
Novembro chega com música em Ilhabela
Muito soul, jazz, blues e MPB em dois finais de semana na ilha mais legal do litoral norte
Cesar Camargo Mariano
Na primeira semana de novemnbro, Ilhabela recebe em 10 dias várias atrações no Bourbon Festival Ilhabela.
O Palco Vila e os demais, espalhados pelas praias da cidade, vão receber artistas do jazz, blues, soul, R&B, folk e música brasileira, em dois finais de semana, com shows gratuitos e ao ar livre.
Serão mais de 20 shows de 10 artistas. Um dos grandes destaques desta 1ª. edição é o pianista, radicado nos Estados Unidos, Cesar Camargo Mariano, que traz seu talento, acompanhado de septeto, e assina a parte jazzística do festival. Outros grandes nomes completam o line up: Zeca Baleiro, em companhia de Roberta Campos, representam dois estilos: o folk e a música brasileira, com repertório criado para o evento. Ed Motta se junta a Serial Funkers e dão um banho de balanço, apresentando o melhor do soul e a black music. O blues e o r&b entram no repertório do Blues Beatles, banda de carreira internacional, que acompanha o mais recente vencedor do The Voice Brasil da Tv Globo: Tony Gordon.
O festival ainda conta com Buskers, performances e shows das bandas Orleans Street Jazz Band e Folk it All, que levam música também para outros pontos da Ilha, e encerram o festival no último domingo, no Palco da Vila.
O Bourbon Festival Ilhabela é uma realização da Prefeitura de Ilhabela através de sua Secretaria Municipal de Turismo.
Programação:
01/11 - Sexta-feira
Diversos Locais
14h - Orleans Street Jazz Band
Palco Vila
19h30 - Banda Local
21h - Cesar Camargo Mariano
02/11 - Sábado
Diversos Locais
11h - Orleans Street Jazz Band
Palco Vila
19h30 - Banda Local
21h – Zeca Baleiro com Roberta Campos em Baile do Baleiro
03/11 - Domingo
Diversos Locais
11h - Orleans Street Jazz Band
Palco Vila
19h - Banda Local
20h30 – Serial Funkers com Ed Motta
08/11 - Sexta-feira
Diversos Locais
14h – Folk it All
Palco Vila
19h30 - Banda Local
21h – Blues Beatles & Tony Gordon
09/11 - Sábado
Diversos Locais
11h – Folk it All
Palco Vila
19h30 - Banda Local
21h – Atração a ser confirmada
10/11 - Domingo
Diversos Locais
11h – Folk it All
Palco Vila
19h - Banda Local
20h30 – Folk it All
quinta-feira, 24 de outubro de 2019
Orquestra Tom Jobim fecha 2019 com Guinga e Clube da Esquina
Sob as batutas de Nelson Ayres e Tiago Costa, a Orquestra Jovem Tom Jobim encerra a temporada 2019 com programas dedicados ao compositor e violonista brasileiro Guinga e ao Clube da Esquina (com participação de Leila Pinheiro)
Foto: Adriana Elias
No começo de novembro, o grupo apresenta Tom Jobim visita Guinga no Theatro São Pedro, no dia 8 de novembro, e no Sesc Guarulhos, dia 10. Participam das apresentações o compositor e violonista Guinga e o clarinetista Nailor Proveta (Banda Mantiqueira).
Os maestros Nelson Ayres e Tiago Costa se revezam nas batutas e nos arranjos criados por eles e também por Paulo Aragão, Nailor Proveta e Luca Raele.
Fechando a programação, nos dias 22 e 23, a orquestra apresenta o programa Tom Jobim visita Clube da Esquina, com a participação da cantora Leila Pinheiro.
Trata-se de uma releitura do antológico disco duplo lançado em 1972 e que é considerado até hoje um dos melhores da MPB, com arranjos elaborados por grandes compositores, especialmente para essa apresentação, como Fernando Corrêa, Felipe Senna, Luca Raele, Nelson Ayres, Ruriá Duprat e Tiago Costa.
A Orquestra Jovem Tom Jobim é formada por bolsistas, alunos e alunas da Escola de Música do Estado de São Paulo – Tom Jobim (EMESP Tom Jobim), e é um dos grupos artísticos de difusão e formação musical da escola, gerida pela Santa Marcelina Cultura. O grupo é ligado à EMESP Tom Jobim – instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo.
Programa 1
Orquestra Tom Jobim visita Guinga
Nelson Ayres e Tiago Costa, regência
Guinga, voz e violão
Nailor Proveta participação
Choro Pro Zé - Guinga e Aldir Blanc (Arr. Nelson Ayres)
Jogo De Compadre - Guinga (arr. Paulo Aragão)
Baião De Lacan - Guinga e Aldir Blanc (Arr. Nailor Proveta)
Di Menor- Guinga e Celso Viáfora (Arr. Tiago Costa)
Geraldo No Leme - Guinga (Arr. Nailor Proveta)
Meu Pai - Guinga (Arr. Tiago Costa)
Pucciniana - Guinga (Arr. Luca Raele)
Chapliniana - Guinga (Arr. Tiago Costa)
Contenda - Guinga e Thiago Amud (arr. Luca Raele)
Bolero De Satã - Guinga e Paulo C. Pinheiro (arr. Nelson Ayres)
Par Constante- Guinga (arr. Nelson Ayres)
Chá De Panela - Guinga e Aldir Blnac (arr. Nelson Ayres)
Serviços:
Data: 8 de novembro
Horário: sexta, 20h
Local: Theatro São Pedro
Endereço: Rua Barra Funda, 161 – Barra Funda, São Paulo/SP
Ingressos: R$20 (inteira) e R$10 (meia)
Vendas: bilheteria e internet theatrosaopedro.byinti.com
Formas de pagamento: Dinheiro e Cartões de Débito e Crédito
Classificação indicativa: livre
Data: 10 de novembro
Horário: domingo, 18h
Local: Sesc Guarulhos
Endereço: Rua Guilherme Lino dos Santos, 1200 – Jardim Flor do Campo, Guarulhos/SP
Ingressos: R$30 (inteira), R$15 (meia) e R$9 (Credencial plena)
Classificação indicativa: livre
Programa 2
Orquestra Tom Jobim visita Clube da Esquina
Nelson Ayres e Tiago Costa, regência
Leila Pinheiro, voz
Suíte Milagre dos Peixes - Milton Nascimento (Arr. Nelson Ayres)
Vera Cruz - Milton Nascimento e Márcio Borges (Arr. Nelson Ayres)
Cravo e Canela - Milton Nascimento e Ronaldo Bastos (Arr. Nelson Ayres)
Lilia - Milton Nascimento (Arr. Fernando Corrêa)
Mistérios - Joyce e Maurício Maestro (Arr. Felipe Senna)
Saídas e Bandeiras nº 1 - Milton Nascimento e fernando Brant (Arr. Tiago Costa)
Tudo Que Você Podia Ser - Lô Borges e Márcio Borges (Arr. Ruriá Duprat)
Nuvem Cigana - Lô Borges e Ronaldo Bastos (Arr. Ruriá Duprat)
Um Girassol da Cor do seu Cabelo - Lô Borges e Márcio Borges (Arr. Tiago Costa)
Clube da Esquina nº 2 - Milton Nascimento, Lô Borges e Márcio Borges (Arr. Fernando Corrêa)
Canção Amiga - Milton Nascimento e Carlos Drummond de Andrade (Arr. Luca Raele)
Credo - Milton Nascimento e Fernando Brant (Arr. Luca Raele)
Cais - Milton Nascimento e Ronaldo Bastos
Arr. Nelson Ayres
Nada Será Como Antes - Milton Nascimento e Ronaldo Bastos (Arr. Nelson Ayres)
Fé Cega - Milton Nascimento e Ronaldo Bastos (Arr. Nelson Ayres)
Serviços:
São Paulo
Dia: 22 de novembro, sexta-feira
Horário: 20h
Local: Theatro São Pedro
Endereço: Rua Barra Funda, 161 – São Paulo
Ingressos: R$20 (inteira) e R$10 (meia)
Vendas: bilheteria e internet theatrosaopedro.byinti.com
Formas de pagamento: Dinheiro e Cartões de Débito e Crédito
Capacidade: 636 lugares
Jundiaí
Dia: 23 de novembro, sábado
Horário: 20h30
Local: Teatro Polytheama
Ingressos: R$10 (inteira) e R$5 (meia)
Endereço: R. Barão de Jundiaí, 176 – Centro, Jundiaí
Capacidade: 1.124lugares
domingo, 20 de outubro de 2019
Jazz brasileiro fecha outubro no Bourbon Street
Banda Mantiqueira
Cesar Camargo Mariano - Na última semana de outubro o Bourbon Street Music Clube, a tradicional casa de jazz e blues situada na rua dos Chanés, em Moema, recebe dois grandes nomes do jazz feito no Brasil.
Cesar Camargo Mariano e Banda Matiqueira se apresentam no projeto Jazz.br.
Sempre inventando, Cesar Camargo Mariano, que já atuou solo, em duo, trio e quarteto, formações maiores como big bands e orquestras sinfônicas, dessa vez om um septeto com Josué dos Santos (sax e flautas), Daniel D’Alcantara (trumpete), Marcelo Mariano (baixo), Cuca Teixeira (bateria), Peter Farrel (violão e guitarra) e Danilo Santana (teclados).
No repertório, composições próprias e de compositores como Marcus Miller, Djavan, Clifford Brown, João Bosco, entre outros. Seus arranjos originais exploram as variedades de timbres desta formação, mesclando instrumentos eletrônicos e acústicos, ritmos universais e harmonias brasileiras.
Banda Mantiqueira - Convidada do projeto Jazz.Br- o jazz no domínio brasileiro, criado pelo Bourbon Street há seis anos, a Banda Mantiqueira entra “na roda” mostrando temas dos seus 18 anos de estrada.
A banda formada por músicos de renome e qualidade indiscutíveis, tenedo à frente Nailor Azevedo, o Proveta, conta com Ubaldo Versolato (sax barítono, flauta e píccolo), Josué dos Santos (sax tenor e flauta), Cássio Ferreira (sax tenor, soprano e flauta), François de Lima (trombone de válvulas), Valdir Ferreira (trombone de vara), Nahor Gomes, Walmir Gil e Odésio Jericó (trompete e flugelhorn), Jarbas Barbosa (guitarra elétrica), Edson José Alves (contrabaixo elétrico), Celso de Almeida (bateria), Fred Prince e Cléber Almeida (percussão).
Com ênfase no naipe de sopros e na percussão, com forte sotaque brasileiro, a Mantiqueira também conquistou seu lugar na cena da música instrumental dançante, notadamente em São Paulo, com repertório que inclui principalmente gafieiras, sambas, choros e bossa nova.
No repertório do Bourbon Street, Cartola, Luiz Gonzaga, Pixinguinha, Dorival Caymmi, João Bosco e composições próprias.
O projeto Jazz.Br – o jazz no domínio brasileiro foi criado pelo Bourbon Street pensado em atender o público que curte o jazz e seus derivados, feito por músicos do brasa. Também passeia pela boa música brasileira, trazendo não só grandes nomes, mas também os novos destaques da cena instrumental sempre no formato “na roda”, já consagrado.
Já participaram do projeto Hermeto Pascoal, Naná Vasconcelos, Raul de Souza, André Mehmari, Pau Brasil, Michel Freidensen, Bocato, Filó Machado, Nuno Mindelis, Hamilton de Holanda, Carlos Malta Trio, Mestrinho e Nicolas Krassik, César Camargo Mariano, a própria Banda Mantiqueira, entre outros.
Serviço
Show: Cesar Camargo Mariano
Data : 27/10/2019 – domingo
Horário: 20h
Abertura da casa: 18h
Duração: 80 min. aproximadamente
Couvert Artístico: **1º Lote: R$ 135,00 (Mesa Premium)/R$ 95,00 (Mesa Classic) /R$ 75,00 (bar em pé)** 2º lote: R$ 150,00 (Mesa Premium)/R$ 115,00 (Mesa Classic) /R$ 85,00 (bar em pé)
Show: Banda Mantiqueira
Data : 29/10/2019 – 3ª.feira
Horário: 21h30
Abertura da casa: 20h
Duração: 80 min. aproximadamente
Couvert Artístico : R$ 40,00
Local: Bourbon Street | Rua Dos Chanés, 127 – Moema – SP
Bilheteria Bourbon Street: Rua dos Chanés 194 – de 2ªf.a 6ª.f das 9h às 20h, sábado e feriado das 14h às 20h
Fone para reserva: (11) 5095-6100 (Seg. a sexta) das 10h às 18h - sem taxa de conveniência
domingo, 13 de outubro de 2019
Brasileiro Rodrigo Mantovani entre os melhores do blues de Chicago
Texto: Eugênio Martins Jr
Fotos: Alex Cruz
Alguns figurões da primeira fase do blues que é feito no Brasil ainda circulam por aí, uns mais ativos que outros é certo, cantando tocando e gravando. A banda Blues Etílicos lança um álbum sempre que pode. Nuno Mindelis também, gravando aqui e nos Estados Unidos. André Christovam está meio paradão no quesito gravações. Até onde sei, morando na Escócia?! Recentemente retornou ao Brasil para comemorar o aniversário de 30 anos do disco Mandinga. Celso Blues Boy já partiu dessa, deixando saudades. Como o norte americano JJ Jackson, artista do Arkansas que chegou no Brasil no começo dos anos 80, e o baiano Alvaro Assmar, que também estão fazendo jam com os grandes bluesman no lado de lá.
Mas o blues ainda vai bem por aqui. Alguns nomes surgiram recentemente dando um gás na cena. Da Baixada Santista, Filippe Dias, Pedro Bara e Dog Joe. Simi Brothers e Bidu Souls vêm do Vale do Paraíba. O guitarrista Tiago Guy e o gaitista Enéias Ribeiro de São Paulo e tantos outros espalhados pelo Brasil.
Entre esses dois extremos, a galera que podemos chamar de segunda geração, está fazendo história, investindo suas carreiras na cena internacional: Igor Prado (tocando em vários festivais nos EUA e Europa), Celso Salim (Los Angeles), Cristiano Crochemore (Houston), Artur Menezes (Los Angeles) e, mais recentemente, o baixista paulistano Rodrigo Mantovani (Chicago).
Por anos viajando com a Igor Prado Band, Mantovani rodou o mundo tocando e transformando-se em um dos maiores especialistas no Brasil de todas as linguagens que o blues apresenta. Dividiu o palco com grandes nomes da cena atual, Lynwood Slim e James Wheeler (também já se foram), Raphael Wressnig, Omar Coleman, Mitch Kashmar, Tia Carrol, Jr Watson e tantos outros.
Além, claro, das gravações com a Igor Prado Band e as dezenas de participações em discos de artistas nacionais, Mantovani lançou dois discos de blues básico, baixo e guitarra, um com Celso Salim, Diggin’ the Blues e First Born, com o dinamarquês Big Creek Slim. Ambos com versões de temas clássicos e composições próprias.
Em 2018 Mantovani recebeu o convite irrecusável para integrar a banda de Nick Moss, guitarrista norte americano considerado um dos grandes nomes da atualidade e foi. A super banda conta com Dennis Gruenling (harmônica), Patrick Seals (bateria) e Taylor Streiff (piano e orgão).
Entre um show e outro, Mantovani respondeu algumas perguntas enviadas via email para os Estados Unidos.
Eugênio Martins Júnior – Como você foi pra música e como o blues foi parar na tua vida? Já estava no teu radar desde o princípio?
Rodrigo Mantovani - Fui parar na música pelo acaso. Ganhei um violão que pertencia a uma tia que faleceu quando eu tinha uns 10 anos de idade e desde então comecei a aprender algumas músicas com amigos que moravam no meu prédio. O detalhe é que um desses amigos era baixista e me ensinou algumas linhas de baixo no violão, mesmo sem eu saber o que era um baixo, então quando eu mostrava para as pessoas o que havia aprendido elas falavam que essa era a parte do baixo. Como tinha sido difícil aprender aquelas músicas (que eram no máximo duas), decidi então que tocaria baixo a partir dali. Comecei tocando rock e conhecer e começar a tocar blues foi uma consequência natural após ingressar na minha primeira banda de blues aos 14 anos.
EM – Você passou anos na banda do Igor Prado e por causa disso viajou para vários lugares fora do Brasil. O que essa esperiência acrescentou na tua forma de ver o blues?
RM - Com certeza um grande diferencial foi a convivência com tantos artistas internacionais que tivemos a felicidade de tocar, conviver e receber tanta informação diretamente.
A participação em shows e festivais internacionais foi igualmente importante, pois quando você participa de festivais cheio de artistas que você é fã, na minha opinião, absorve a linguagem de uma forma mais natural além de ser extremamente estimulante para o desenvolvimento. Estar ali fazendo parte do line up juntamente com seus ídolos faz você querer se superar cada vez mais.
EM – E talvez por causa disso você está hoje em uma banda de blues americana. Gostaria que falasse sobre isso.
RM - Como disse, as viagens possibilitaram o contato com muitos artistas e bandas que éramos fãs e sempre ouvíamos, além de termos acompanhado diversos artistas internacionais dentro e fora do Brasil. Acho também que além do convívio e contato, sempre fizemos um ótimo trabalho acompanhando esses artistas e fomos cada vez se especializando mais tanto no blues quanto em suas vertentes, o que sempre abriu portas aqui nos EUA.
EM – Quando você conheceu o Nick Moss e quando e como se deu o convite pra integrar sua banda?
RM - Conheci o Nick pessoalmente na Espanha quando fomos tocar com a Igor Prado Band no festival Rock'n'River.
O Nick estava participando do mesmo festival com sua banda além de ter o Kirk Fletcher de convidado especial.
Depois disso fui algumas vezes para Chicago e fiquei em sua casa, além de fazer alguns shows com a sua banda. Em 2018 ele fez o convite pela internet para eu entrar na banda e desde então nos falamos diversas vezes para acertar a parte burocrática. Acabei vindo no final de 2018 para gravar o seu novo disco, Lucky Guy, e em 2019 me mudei de vez para Chicago.
EM – Tenho uma curiosidade. Como os norte-americanos veêm o blues tocado no Brasil? Como uma coisa exótica, apenas uma forma de arrumar trabalho e uns dólares a mais ou de forma séria?
RM - Acho que tudo é relativo e é difícil generalizar dessa forma tanto da parte dos artistas americanos quanto da parte das bandas brasileiras. Existem todas as situações possíveis, acredito. Tanto os que veêm como uma forma de ganhar uns dólares quanto os que enxergam de forma séria. Na minha opinião, independente de como eles enxergam, todo trabalho sério se basta e se sobressai de maneira natural, o resto é consequência.
EM – Sobre a tua carreira solo. Você gravou um CD acústico com o Celso Salim e depois gravou com o Big Creek Slim. Gostaria que comentasse esses dois trabalhos.
RM - Sim, são dois trabalhos que apesar de parecerem semelhantes por serem álbuns em duos, são totalmente diferentes na essência. O trabalho com o Celso têm uma sonoridade mais moderna além de ter arranjos mais particulares tanto para versões de blues quanto para as músicas próprias. O álbum com o Big Creek é praticamente tocado ao vivo com a sonoridade baseada nos álbuns antigos de Blues.
EM – Como você conheceu o Big Creek Slim e como surgiu a ideia de gravar esse excelente CD? Parece que o trabalho foi premiado.
RM - Já tinha ouvido falar muito bem do Big Creek e o conheci em um festival em Caxias do Sul, o Mississippi Delta Blues Festival. Desde então conversamos mais algumas vezes e ele veio para São Paulo para fazermos uma turnê e em nossa 2ª turnê decidimos gravar o álbum. Nessa época ele ainda estava morando aqui no Brasil. Tivemos a honra de ter esse trabalho eleito como o melhor álbum de blues acústico de 2018 pela Blues Junction Productions, uma plataforma formada por diversos críticos especializados em blues aqui dos EUA, além de ter recebido o prêmio de melhor disco de blues do ano na premiação da Dinamarca DMA (Danish Music Awards).
EM – Trata-se de um disco de blues tradicional, com composições dele e de figurões como Charlie Patton, Barbcue Bob, Blind Willie Johnson, Roosevelt Sykes. Como foi a escolha desse repertório?
RM - O repertório foi escolhido por nós dois. Mesclamos algumas composições próprias dele e que achou que caberiam no álbum. Escolhemos as outras baseadas no que mais eram similares ao formato do disco e com a voz dele.
EM - Como está sendo essa adaptação, tanto em termos musicais quanto a parte de viver o dia a dia nos EUA?
RM - Morar nos Estados Unidos é uma experiência completamente diferente de vir para cá em turnês. Eu já tinha vindo para turnês grandes aqui, com cerca de dois meses, mesmo assim a diferença é enorme. Você tem que se adaptar em tudo, desde as menores coisas como seus hábitos alimentares até a maneira de lidar com temperaturas e climas que não está acostumado. Falar outro idioma 24 horas por dia, etc. Além de, paralelamente, ter que se adaptar a dinâmica da banda que é muito puxada e tenho certeza que hoje em dia Nick Moss Band é uma das bandas que mais trabalha aqui nos Estados Unidos. Nós viajamos de van pelos Estados Unidos. Levamos todo nosso equipamento para todo lado, baixo acústico, teclados, bateria, amplis etc. A parte musical é a menos complicada de se adaptar uma vez que temos diversas influências similares.
EM – Você chegou aí em abril de 2019. Gostaria que falasse sobre a cena dos festivais, bares, etc. Quantas gigs você faz por semana? O blues paga bem por aí? (risos)
RM – A média é de 20 shows por mês, contando festivais e shows menores. Aqui a dinâmica é outra e geralmente viajamos para uma sequência de shows em torno de duas a três semanas direto, daí voltamos por uns dias e já saímos novamente. Viajo bem mais aqui nos EUA do que viajava no Brasil. E têm casos de saírmos direto de um show para outro, coisa que raramente acontecia por aí também. Aqui têm muito mais espaço e festivais para se apresentar, além de ainda ter muitas bandas de blues ao redor, e é super legal ter essa possibilidade de trocar idéia e encontrar direto os músicos que fazem parte da cena blues por aqui. Quanto ao pagamento, blues é blues em qualquer lugar.