domingo, 13 de outubro de 2019

Brasileiro Rodrigo Mantovani entre os melhores do blues de Chicago


Texto: Eugênio Martins Jr
Fotos: Alex Cruz

Alguns figurões da primeira fase do blues que é feito no Brasil ainda circulam por aí, uns mais ativos que outros é certo, cantando tocando e gravando. A banda Blues Etílicos lança um álbum sempre que pode. Nuno Mindelis também, gravando aqui e nos Estados Unidos. André Christovam está meio paradão no quesito gravações. Até onde sei, morando na Escócia?! Recentemente retornou ao Brasil para comemorar o aniversário de 30 anos do disco Mandinga. Celso Blues Boy já partiu dessa, deixando saudades. Como o norte americano JJ Jackson, artista do Arkansas que chegou no Brasil no começo dos anos 80, e o baiano Alvaro Assmar, que também estão fazendo jam com os grandes bluesman no lado de lá.
Mas o blues ainda vai bem por aqui. Alguns nomes surgiram recentemente dando um gás na cena. Da Baixada Santista, Filippe Dias, Pedro Bara e Dog Joe. Simi Brothers e Bidu Souls vêm do Vale do Paraíba. O guitarrista Tiago Guy e o gaitista Enéias Ribeiro de São Paulo e tantos outros espalhados pelo Brasil.
Entre esses dois extremos, a galera que podemos chamar de segunda geração, está fazendo história, investindo suas carreiras na cena internacional: Igor Prado (tocando em vários festivais nos EUA e Europa), Celso Salim (Los Angeles), Cristiano Crochemore (Houston), Artur Menezes (Los Angeles) e, mais recentemente, o baixista paulistano Rodrigo Mantovani (Chicago).
Por anos viajando com a Igor Prado Band, Mantovani rodou o mundo tocando e transformando-se em um dos maiores especialistas no Brasil de todas as linguagens que o blues apresenta. Dividiu o palco com grandes nomes da cena atual, Lynwood Slim e James Wheeler (também já se foram), Raphael Wressnig, Omar Coleman, Mitch Kashmar, Tia Carrol, Jr Watson e tantos outros. 
Além, claro, das gravações com a Igor Prado Band e as dezenas de participações em discos de artistas nacionais, Mantovani lançou dois discos de blues básico, baixo e guitarra, um com Celso Salim, Diggin’ the Blues e First Born, com o dinamarquês Big Creek Slim. Ambos com versões de temas clássicos e composições próprias.
Em 2018 Mantovani recebeu o convite irrecusável para integrar a banda de Nick Moss, guitarrista norte americano considerado um dos grandes nomes da atualidade e foi. A super banda conta com Dennis Gruenling (harmônica), Patrick Seals (bateria) e Taylor Streiff (piano e orgão).
Entre um show e outro, Mantovani respondeu algumas perguntas enviadas via email para os Estados Unidos.


Eugênio Martins Júnior  – Como você foi pra música e como o blues foi parar na tua vida? Já estava no teu radar desde o princípio?
Rodrigo Mantovani - Fui parar na música pelo acaso. Ganhei um violão que pertencia a uma tia que faleceu quando eu tinha uns 10 anos de idade e desde então comecei a aprender algumas músicas com amigos que moravam no meu prédio. O detalhe é que um desses amigos era baixista e me ensinou algumas linhas de baixo no violão, mesmo sem eu saber o que era um baixo, então quando eu mostrava para as pessoas o que havia aprendido elas falavam que essa era a parte do baixo. Como tinha sido difícil aprender aquelas músicas (que eram no máximo duas), decidi então que tocaria baixo a partir dali. Comecei tocando rock e conhecer e começar a tocar blues foi uma consequência natural após ingressar na minha primeira banda de blues aos 14 anos.  

EM – Você passou anos na banda do Igor Prado e por causa disso viajou para vários lugares fora do Brasil. O que essa esperiência acrescentou na tua forma de ver o blues?
RM - Com certeza um grande diferencial foi a convivência com tantos artistas internacionais que tivemos a felicidade de tocar, conviver e receber tanta informação diretamente.
A participação em shows e festivais internacionais foi igualmente importante, pois quando você participa de festivais cheio de artistas que você é fã, na minha opinião, absorve a linguagem de uma forma mais natural além de ser extremamente estimulante para o desenvolvimento. Estar ali fazendo parte do line up juntamente com seus ídolos faz você querer se superar cada vez mais.

EM – E talvez por causa disso você está hoje em uma banda de blues americana. Gostaria que falasse sobre isso.
RM - Como disse, as viagens possibilitaram o contato com muitos artistas e bandas que éramos fãs e sempre ouvíamos, além de termos acompanhado diversos artistas internacionais dentro e fora do Brasil. Acho também que além do convívio e contato, sempre fizemos um ótimo trabalho acompanhando esses artistas e fomos cada vez se especializando mais tanto no blues quanto em suas vertentes, o que sempre abriu portas aqui nos EUA.

EM – Quando você conheceu o Nick Moss e quando e como se deu o convite pra integrar sua banda?
RM - Conheci o Nick pessoalmente na Espanha quando fomos tocar com a Igor Prado Band no festival Rock'n'River.
O Nick estava participando do mesmo festival com sua banda além de ter o Kirk Fletcher de convidado especial.
Depois disso fui algumas vezes para Chicago e fiquei em sua casa, além de fazer alguns shows com a sua banda. Em 2018 ele fez o convite pela internet para eu entrar na banda e desde então nos falamos diversas vezes para acertar a parte burocrática. Acabei vindo no final de 2018 para gravar o seu novo disco, Lucky Guy, e em 2019 me mudei de vez para Chicago.


EM – Tenho uma curiosidade. Como os norte-americanos veêm o blues tocado no Brasil? Como uma coisa exótica, apenas uma forma de arrumar trabalho e uns dólares a mais ou de forma séria?
RM - Acho que tudo é relativo e é difícil generalizar dessa forma tanto da parte dos artistas americanos quanto da parte das bandas brasileiras. Existem todas as situações possíveis, acredito. Tanto os que veêm como uma forma de ganhar uns dólares quanto os que enxergam de forma séria. Na minha opinião, independente de como eles enxergam, todo trabalho sério se basta e se sobressai de maneira natural, o resto é consequência.

EM – Sobre a tua carreira solo. Você gravou um CD acústico com o Celso Salim e depois gravou com o Big Creek Slim. Gostaria que comentasse esses dois trabalhos.
RM - Sim, são dois trabalhos que apesar de parecerem semelhantes por serem álbuns em duos, são totalmente diferentes na essência. O trabalho com o Celso têm uma sonoridade mais moderna além de ter arranjos mais particulares tanto para versões de blues quanto para as músicas próprias. O álbum com o Big Creek é praticamente tocado ao vivo com a sonoridade baseada nos álbuns antigos de Blues.

EM – Como você conheceu o Big Creek Slim e como surgiu a ideia de gravar esse excelente CD? Parece que o trabalho foi premiado.
RM - Já tinha ouvido falar muito bem do Big Creek e o conheci em um festival em Caxias do Sul, o Mississippi Delta Blues Festival. Desde então conversamos mais algumas vezes e ele veio para São Paulo para fazermos uma turnê e em nossa 2ª turnê decidimos gravar o álbum. Nessa época ele ainda estava morando aqui no Brasil. Tivemos a honra de ter esse trabalho eleito como o melhor álbum de blues acústico de 2018 pela Blues Junction Productions, uma plataforma formada por diversos críticos especializados em blues aqui dos EUA, além de ter recebido o prêmio de melhor disco de blues do ano na premiação da Dinamarca DMA (Danish Music Awards).

EM – Trata-se de um disco de blues tradicional, com composições dele e de figurões como Charlie Patton, Barbcue Bob, Blind Willie Johnson, Roosevelt Sykes. Como foi a escolha desse repertório?
RM - O repertório foi escolhido por nós dois. Mesclamos algumas composições próprias dele e que achou que caberiam no álbum. Escolhemos as outras baseadas no que mais eram similares ao formato do disco e com a voz dele.


EM - Como está sendo essa adaptação, tanto em termos musicais quanto a parte de viver o dia a dia nos EUA?
RM - Morar nos Estados Unidos é uma experiência completamente diferente de vir para cá em turnês. Eu já tinha vindo para turnês grandes aqui, com cerca de dois meses, mesmo assim a diferença é enorme. Você tem que se adaptar em tudo, desde as menores coisas como seus hábitos alimentares até a maneira de lidar com temperaturas e climas que não está acostumado. Falar outro idioma 24 horas por dia, etc. Além de, paralelamente, ter que se adaptar a dinâmica da banda que é muito puxada e tenho certeza que hoje em dia Nick Moss Band é uma das bandas que mais trabalha aqui nos Estados Unidos. Nós viajamos de van pelos Estados Unidos. Levamos todo nosso equipamento para todo lado, baixo acústico, teclados, bateria, amplis etc. A parte musical é a menos complicada de se adaptar uma vez que temos diversas influências similares.

EM – Você chegou aí em abril de 2019. Gostaria que falasse sobre a cena dos festivais, bares, etc. Quantas gigs você faz por semana? O blues paga bem por aí? (risos)
RM – A média é de 20 shows por mês, contando festivais e shows menores. Aqui a dinâmica é outra e geralmente viajamos para uma sequência de shows em torno de duas a três semanas direto, daí voltamos por uns dias e já saímos novamente. Viajo bem mais aqui nos EUA do que viajava no Brasil. E têm casos de saírmos direto de um show para outro, coisa que raramente acontecia por aí também. Aqui têm muito mais espaço e festivais para se apresentar, além de ainda ter muitas bandas de blues ao redor, e é super legal ter essa possibilidade de trocar idéia e encontrar direto os músicos que fazem parte da cena blues por aqui. Quanto ao pagamento, blues é blues em qualquer lugar.

3 comentários:

  1. Parabéns Rodrigo por representar Blues Brasil e músicos. Boa entrevista que nos sirva de inspiração e motivação ...Sucesso!

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  2. Um dos melhores baixistas que ja vi ao vivo. Um grande músico.

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  3. Um dos melhores baixistas que ja vi ao vivo. Um grande músico.

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