Texto: Eugênio Martins Júnior
Foto: Divulgação
A birita está para o blues assim como um bom power trio e, assim como as boas cervejas artesanais que vem lá do interior do estado de São Paulo, da cidade de Ribeirão Preto, vem uma das bandas mais legais do Brasil, a Fred Sun Walk and the Dog Brothers, com Fred (guitarra), Alexandre (baixo) e Leonardo (bateria). Um trio da pesada.
Devemos lembrar também do lendário Festival de Blues de Ribeirão Preto, de 1989, que foi um divisor de águas na história do gênero no país. Buddy Guy, Albert Collins, Magic Slim, John Primer, Etta James, Andrè Christovam e Blues Etílicos deixaram uma semente na cidade que germinou.
Eu estava lá, mas não conheci Fred Sunwalk. Conheci-o em 2006, quando produzi em Santos um show com Eric Gales, guitarrista de Memphis cultuado como um dos grandes representantes do blues contemporâneo e que, pela milésima vez, foi comparado a Jimi Hendrix.
Bobeiras a parte, foi um showzaço de Gales, com Fred (guitarra), Ugo Perrota (baixo) e Alexandre Papel (bateria). A abertura foi do santista Mauro Hector, guitarrista, também canhoto.
Desde então, acompanho a carreira dessa banda de nome estranho, o Sunwalk proveniente de um sonho de Fred e os Dog Brothers por causa da paixão dos irmãos pelos perros da família.
O primeiro CD dos caras que poderiam ter sido cervejeiros em Ribeirão já mostra o fanatismo pela música do Mississippi, Blues Everyday (1999) diz logo ao que veio: baixar o braço sem muitas sutilezas. Outra característica é a vocação para o funk que lembra muito as peripécias de Albert Collins. E isso é demais. Poucas bandas de blues no Brasil tem essa pegada barulhenta e suingada. Ouçam To Change the Things (2002), Blues To Feel Good (2005) e o excelente Everything Around (2009) e comprovem.
Nessa entrevista, quinze minutos antes de tocar em um tribute ao BB King com Nuno Mindelis e Victor Biglione no Bourbon Street, Fred conta como começou sua carreira, a dos irmãos e se gaba sobre as cervejas da sua cidade natal. No próximo encontro vou levar a minha breja para os malandros tomar.
Ficou curioso pra curtir o som da banda? No dia 29 de novembro os irmão tocam no Bourbon Street Music Club com a indicada ao Blues Music Awards, Vanessa Collier. A saxofonista norte americana que está sendo considerada umas das grandes revelações do blues lançou em 2017 o excelente CD Meeting My Shadow. O show Blues on Double é uma mistura dos temas de vanessa, Sun Walk e clássicos do blues.
Eugênio Martins Júnior – Como foi teu começo na música?
Fred Sun Walk – Comecei tocar guitarra em 1994. As influências iniciais eram os discos de rock inglês do meu pai, Deep Purple, Led Zeppelin, Rolling Stones. Em 1997 a coisa ficou profissional, comecei a viver da música e nesse período já estava mergulhado no mundo do blues.
EM – Em três anos você passou do rock para o blues? Foi rápido.
FSW – E já passei a viver da música, tocava praticamente três vezes por semana. O repertório com 70% de blues.
EM – Daí arrastou os irmãos?
FS – O meu irmão mais velho que é o baixista começou junto comigo e em 98 o caçula entrou. Formamos a Sunwalk e the Dog Brothers, gravamos o primeiro CD e estamos juntos até hoje.
EM – Tem uma história meio maluca que aconteceu na Bahia, né?
FS – Considero o início de tudo. Entramos no mundo dos bares, vivendo da noite. Um pouco depois começou o lance profissional, de poder pagar as contas. Começou como uma brincadeira, umas férias, mas gostamos muito do lugar e mudamos pra lá. Ficamos quase dois anos.
EM – Você e seu irmão? Moravam juntos?
FS – Sim, era coisa de temporada e o resto do ano a gente se virava.
EM – Eu estava na primeira turnê de Eric Gales no Brasil. Produzi um dos shows em Santos e aquela gig foi bem louca. Como é acompanhar o Eric no palco e fora dele?
FS – Eu fiz as três turnês dele no Brasil. A primeira foi em 2003 e a que você está falando foi a segunda. Da primeira vez eu conhecia o trabalho do Eric, mas não como vim conhecer e me tornar muito fã. Ele é um músico excepcional e muito exigente. É incrível trabalhar com ele. Foi muito bom pra mim como músico. Dentro e fora do palco é um cara fácil de lidar.
EM – E além do Eric? Você acompanhou algum outro músico gringo?
FS – Toquei com o Carey Bell no Natu Blues Festival.
EM – Lembra da banda?
FS – Era a Natu Nobilis Blues Band, que recebia os músicos de fora. Eu, Luciano Leães, Andy Boy (o gaitista André Serrano que constroi os amplificadores). Toquei recentemente com a Vanessa Collier que foi indicada agora ao Grammy Awards como uma das melhores saxofonistas de blues. Fiz uma turnê com ela nos Estados Unidos em março e abril e toquei também em Ilhabela. Ela volta agora no fim de novembro para tocar com a minha banda.
EM - Fale um pouco sobre esse Tributo ao BB King? Qual é a tua participação no meio desses dois caras?
FS – Fiquei muito feliz pelo convite. O Herbert (diretor artístico do Bourbon Street) me colocou no projeto e eu nunca toquei com o Victor e vai ser uma experiência muito legal, porque cada um tem um estilo. E esses caras têm alguns anos de experiência à minha frente. Faremos também o Sesc Jundiaí.
EM - Como você vê a cena brasileira desde o primeiro trabalho de vocês, o Blues Everyday, em 1999?
FS – Quando comecei tocar a gente contava os festivais de blues e jazz nos dedos. Tinha três a cinco festivais de blues. Hoje você tem uma grande variedade de festivais e os trabalhos com os Sescs e pubs. Vi um crescimento muito grande e estou otimista, acho que a coisa está se tornando cada vez mais global. Admiro muito o trabalho que o Igor faz de intercâmbio. É bacana porque alimenta a cena.
EM – Você acompanha o que os outros músicos fazem?
FS – Sim, sou amigo de todos. Somos bem conectados com os novos e com os mais antigos.
EM – Sun Walk e Dog Brothers enveredaram para o funkão, mas como é um power trio a guitarra sempre está em evidência, dando aquele peso. Esse som é um formato diferente do que as bandas de blues brasileiras costumam fazer. Everythyng Around é um bom exemplo disso. Gostaria que falasse sobre isso.
FS – Sempre tive muita influência do Jimi Hendrix, Alvin Lee, Johnny Winter e Stevie Ray Vaughan. E a gente trabalha a muito tempo no formato power trio, preenchendo todas as lacunas na música. Recentemente gravei um disco, não vou dizer que é old school, mas um tributo ao blues, com Elmore James, John Lee Hooker, Albert King, todos esses caras. Uma música mais de raiz, saindo um pouco da minha zona de conforto. Por outro lado, como eles são as maiores influências, tentei colocar a minha linguagem, porque não dá pra fazer um cover do Elmore James. É impossível. Procurei tocar a música deles, mas da forma que estou acostumado a fazer.
EM – Você chegou a ir ao festival de 1989? Quanto anos você tinha?
FS – Tinha treze anos. Não fui porque ainda era muito novo, mas lembro da atmosfera na cidade. Os carros com adesivos de blues, matérias na TV. Talvez tenha escutado meu primeiro blues nessa época, o Água Mineral do Blues Etílicos. Estive com eles agora no Rio e falei isso pra eles.
EM – Como é a cena na cidade hoje?
FS – Tem muita banda cover, mas tem o Vila Dionísio que todas as terças têm blues. Eu e minha esposa, que é produtora, realizamos o Arena Blues Festival, um festival anual e esse ano está programado para 25 de novembro. E o Sesc Jazz & Blues passa por lá também.
EM – Como começou a parceria com a Vanessa Collier, saxofonista indicada ao Blues Music Awards?
FS - Começou no Bourbon Folk Blues de Ilhabela em 2016, quando o Herbert me pediu pra trazer algum convidado para tocar com a banda. Ele perguntou se eu já tinha alguém em mente e eu disse que sim. Mas era mentira, não tinha. Mas sabia que ia arrumar alguém legal. Comecei pesquisar na internet, mas não queria trazer mais do mesmo, um gaitista ou guitarrista que é o que geralmente rola. Então vi uma foto da vanessa nos sites de vários festivais, uma moça jovem, com sax na mão, nos melhores festivais de blues. Vi uns vídeos e gostei do material, então entrei em contato com a empresária que é a mãe dela e consegui trazê-la ao Brasil.
Depois disso ela foi indicado ao Blues Music Awards como melhor saxofonista de blues. Esse ano ela me convidou para fazer parte de sua banda. Fizemos uma pequena turnê com seis shows em três estados diferentes, na Pensilvânia, Maryland e Alabama. Participamos de dois ótimos festivais, o Boskov’s Berks Jazz Fest e o Ozark Crawdad and Music Festival.
EM – Fale um pouco sobre as cervejas de Ribeirão Preto. Qual a dica que você dá pra quem é de fora?
FS – Maravilha, estamos bem servidos. A Invicta cresceu demais, as cervejarias SP 330, Walfanger e Weird Barrel foram pra lá. Sou muito fã da Invicta, onde você pode tomar cerveja na própria fábrica. Tem o Cervejare que é o bar da Colorado que e tornou um monstro. E um pub que eu gosto muito é o Weird Barrel que produz a sua própria cerveja e é de qualidade.
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