Essa semana, saindo um pouco do blues, escrevo a coluna Meus Discos abordando um CD brasileiríssimo de um artista praticamente desconhecido no país. Já havia me deparado com o nome Hamilton de Holanda em alguma leitura ou coversa de bar, mas nunca ouvido sua música. Foi em uma loja dessas redes em Sampa que ouvi o CD Brasilianos pela primeira vez, naqueles equipamentos com vários CDs disponíveis à audição. O ano era 2006, Brasilianos havia sido lançado recentemente.
Foi uma grande descoberta. Brasilianos é um ótimo disco, talvez um dos melhores de música brasileira instrumental da década. Sim, Brasilianos é todo instrumental, com temas executados por uma banda de feras, um quinteto de jovens músicos virtuoses: Daniel Santiago (violão), André Vasconcelos (baixo elétrico), Márcio Bahia (bateria) e Gabriel Grossi (harmônica). A produção é do prórpio Holanda e de Marcos Portinari. O CD saiu pela Biscoito Fino.
Sei que a palavra virtuose causa arrepios em alguns, mas em Brasilianos os caras usam o virtuosismo para o bem, em nome de lindas e complexas melodias. Tive a oportunidade de vê-los ao vivo no Rio das Ostras Jazz e Blues, festival que acontece no baléário carioca, foi na edição de 2007. No mesmo festival se apresentaram ainda Naná Vasconcelos, Romero Lubambo e Luciana Souza, grandes nomes do jazz mundial feito no Brasil.
A noite estava um pouco fria quando a banda de Hamilton de Holanda entrou, mas a competência dos músicos fez a platéia de cerca de 15 mil pessoas aplaudir de pé. Nunca havia visto tal feito por uma banda que toca música instrumental brasileira, uma mistura de samba, choro e jazz.
O baterista Márcio Bahia fez o que quis no intrumento, em determinado momento ele "tirou" Asa Branca com uma baqueta em sentido vertical no meio do tambor, enquanto tocava com a outra em volta explorando toda a pele do instrumento. Momento mágico. Eu estava do lado do cara e vi tudo com esses olhos que mãinha me deu.
Exetuando as faixas 7 e 10, todas as composições de Brasilianos são de Hamilton de Holanda. A faixa 7 é nada mais, nada menos do que O Trenzinho Caipira, de Villa Lobos. Começa irreconhecível para depois tomar forma e novamente ser "entortada". Se estivesse vivo, acho que Villa Lobos ia gostar. A décima faixa é Procissão, de Gilberto Gil, transformada por Hamilton em um "quase choro" até o improviso chegar.
A primeira, Pedra de Macumba, é um verdadeiro cascudo na cabeça. Pelo menos, na minha foi, entrei no mundo de Hamilton de Holanda com ela nunca mais esqueço.
Os Brasilianos em sentido horário: Santiago, Holnada, Vaconcelos, Bahia e Grossi.
Brasilianos, a segunda música do CD, começa lenta só pra enganar, mas é de uma melodia tão poderosa, daquelas que ficam no assobio durante dias. Brilha a gaita cromática de Gabriel Grossi.
Baião Brasil vem lenta e suave, mas também é pegajosa como piche em dia de calor. Santiago, Vasconcelos e mais uma vez Grossi mostram ao que vieram. Integração total dos músicos em um tema com execução maravilhosa. Assim também é Pra Você Ficar, a sexta faixa.
01 Byte 10 cordas é a quintessência. É a música central de um disco ao vivo de Holanda também lançado pela Biscoito Fino. A melodia é poderosa e o choro misturado com jazz come solto por mais de seis minutos. Além do nome bem sacado, esse tema mostra porque os músicos brasileiros são cada vez mais respeitados lá fora, tanto que a agenda de Hamilton é preenchida com datas na gringa, uma pena, músicos desse quilate deveriam ser mais respeitados em seu próprio país. Vendo pelo lado bom ele mostra a genialidade da nossa arte em vez de axé, sertanejo e essas porcarias que estão por aí.
O CD fecha com uma homenagem ao Pascoal: Hermeto Está Brincando tem quase cinco minutos e lembra mesmo o velho mestre. Pode entrar na loja mais próxima e dizer sem medo e bem alto: "Eu Quero!"
Músicas
1 - Pedra de Macumba
2 - Brasilianos
3 - Baião Brasil
4 - Caçuá
5 - 01 Byte 10 Cordas
6 - Pra Você Ficar
7 - Trenzinho Caipira
8 - Saudade do Futuro
9 - Valsa em Si
10 - Procissão
11 - Pra Sempre
12 - Dor Menor
13 - Hermeto Está Brincando
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